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Macau com duplos critérios na vigília de Tiananmen e manifestação pró-Pequim

por Lusa
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A advogada e presidente da Casa de Portugal em Macau defendeu hoje que as autoridades revelaram "dualidade de critérios" na proibição de uma vigília sobre o massacre de Tiananmen e na apreciação de uma manifestação pró-Pequim.

As forças de segurança de Macau proibiram pela primeira em 30 anos uma vigília sobre o massacre de Tiannmen, que devia realizar-se no dia 04 de junho, uma decisão validada pelo Tribunal de Última Instância, que acolheu a justificação dos esforços para conter a covid-19. A Polícia acabou mesmo por deter nessa noite duas jovens com velas, no Largo do Senado, por suspeita de reunião ilegal.

Contudo, um dia depois, em 05 de junho, um autocarro vermelho com 40 pessoas circulou e parou em vários pontos de Macau, em apoio à lei da segurança nacional que a China quer impor a Hong Kong, sem a intervenção da Polícia, apesar de as reuniões públicas estarem proibidas no território, para lutar contra a pandemia.

"Há aqui uma dualidade de critérios muito grande", defendeu a advogada Amélia António, à margem das comemorações do 10 de Junho - Dia de Portugal, de Camões e das Comunidades Portuguesas.

"Acho errado que isso aconteça nesta altura: se o problema é um problema do vírus, se o problema é um problema de saúde, então aí também se punha esse problema", enfatizou a responsável da Casa de Macau em Portugal.

A advogada criticou também as explicações da PSP de Macau, que na segunda-feira defendeu que, no caso do autocarro que circulou com apoiantes à lei da segurança, "não se tratou de uma manifestação", e que a polícia não tinha recebido o aviso prévio previsto na lei.

"O que é certo é que foi uma manifestação [de apoio à lei de segurança nacional] no espaço público, com bastante relevo e com muita cor e, portanto, com uma afirmação muito forte", salientou Amélia António.

"Se a questão é fazer-se sem pedir a autorização para não ser proibido, então, se calhar, é preciso repensar o que está mal: se é a lei, se é a forma de a interpretar. Mas qualquer coisa está errada", concluiu.

Na segunda-feira, o responsável de comunicação do Corpo de Polícia de Segurança Pública (CPSP) de Macau, Lei Tak Fai, disse que "houve uma diferença entre as duas atividades", mas prometeu "uma investigação mais profunda", em declarações durante a conferência de imprensa de acompanhamento da situação da covid-19.

"Temos de fazer uma análise objetiva, porque na noite do dia 04 a infração foi óbvia, e por isso detivemos as duas pessoas", afirmou, acrescentando que a atividade realizada um dia depois, de autocarro, "foi para manifestar o apoio à posição tomada pelo Governo central". "Não considerámos esta atividade como uma manifestação", frisou, questionado por jornalistas.

As declarações foram feitas dois dias depois de ter sido lançada uma peticão na qual se pede que a Polícia de Macau investigue a manifestação de apoio à lei de segurança de Pequim, questionando a disparidade de critérios, e que já reuniu mais de 2.900 assinaturas.

As explicações das autoridades não agradaram a Amélia António: "Parece que é para cidadão tontinhos, de que aquilo não é uma manifestacão (...), com um tipo de desculpa e conversa que parecia para ignorantes ou analfabetos".

"Obviamente que é uma manifestação de uma posição, e coletiva, com muita força. Não tenho nada contra isso ser feito, as pessoas têm todo o direito de expressar o seu apoio. O que eu não acho bem é que exista uma dualidade de critérios", sublinhou.

O cônsul-geral de Portugal em Macau e Hong Kong reiterou aos jornalistas a posição expressa quando foi conhecida a proibição da vigília em homenagem a Tiananmen: "Este ano vivemos uma situação atípica e as decisões tomadas também foram atípicas".

"Em relação ao futuro, o desejo que deixo aqui é que as coisas possam voltar à normalidade e que uma celebração que acontecia há 30 anos possa voltar a ocorrer", concluiu.

Hong Kong e Macau são os únicos locais na China onde têm sido autorizadas manifestações sobre o massacre de Tiananmen, um acontecimento que continua a não ser reconhecido por Pequim.

Pequim quer impor a lei da segurança nacional a Hong Kong, uma proposta aprovada durante o encerramento da sessão anual da Assembleia Popular Nacional, em 28 de maio.

O documento agora apresentado surgiu após repetidas advertências do poder comunista chinês contra a dissidência em Hong Kong, abalado em 2019 por sete meses de manifestações em defesa de reformas democráticas e quase sempre marcadas por confrontos com a polícia, que levaram à detenção de mais de nove mil pessoas.

A lei da segurança nacional foi aprovada em Macau logo em 2009, mas as autoridades de Hong Kong nunca conseguiram fazer passar a legislação, apesar de tal estar prevista na Lei Básica (míni-constituição) do território.

A transferência da administração de Macau ocorreu no final de 1999, pouco mais de dois anos depois de a China ter recuperado a soberania sobre a antiga colónia britânica de Hong Kong.

Em ambos os casos, Pequim aplicou o princípio "Um País, Dois Sistemas", que permitiu a Hong Kong e Macau manterem o sistema capitalista e o seu modo de vida, incluindo direitos e liberdades de que gozavam as respetivas populações. As duas regiões têm autonomia em todas as áreas, exceto na diplomacia e na defesa.

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