Marte, um planeta a muitos milhões de dólares de distância

A NASA quer colocar um pé em Marte, mas são vários os obstáculos que a agência norte-americana tem pela frente. O primeiro e mais importante é arranjar oxigénio financeiro para continuar a fazer respirar uma missão astronómica.

Nuno Patrício - RTP /
NASA

Estávamos em plena guerra aberta na conquista espacial entre soviéticos e norte-americanos quando a NASA recebeu o aval governamental por parte do Presidente Kennedy para transportar astronautas até à Lua.

Nos dias que correm, o espaço já não é prioridade. O sonho de colocar o homem em Marte existe. Todavia, não vai ser tão fácil como nos finais da década de 1960.

Uma missão marciana é um empreendimento caro e, caso fosse feita uma aposta a curto prazo, iria certamente fazer explodir o orçamento da agência espacial dos Estados Unidos.

É neste contexto que a NASA procura toda a ajuda possível para poder construir o programa de Marte. O mais provável é que vá precisar de ajuda de diferentes parceiros, desde logo outras agências homólogas.

Recentemente a NASA publicou uma pequena brochura em que explica todo o processo para uma "viagem a Marte", por comparação com as missões lunares.



"Como o programa Apollo, vamos embarcar nesta viagem por toda a humanidade", refere o artigo publicado no Journeys to Mars da NASA.

Mas será que é toda a humanidade que vai pagar a conta?

Se houvesse aqui uma questão de sobrevivência planetária, talvez, mas, na realidade, este sonho de colocar uma pegada em Marte parece servir para satisfazer um capricho de um punhado de astrónomos, físicos e cientistas a nível mundial.

Feitas as contas, são poucos aqueles que podem fornecer os recursos necessários para tal expedição. Entre os candidatos está a Agência Espacial Europeia (ESA), os japoneses, os coreanos e, nos últimos lugares da lista de financiadores, os chineses e os russos.

Outra via financeira pode ainda surgir de algumas empresas privadas, que também estão de olho no planeta vermelho.
Modulo tripulado
No início desta semana a NASA juntou-se aos colegas da ESA e da Airbus, na estação de pesquisa norte-americana de Plumb Brook, no Estado do Ohio, para um importante marco no programa espacial Orion.

São estes os veículos espaciais que estão a ser preparados para transportar os astronautas além da Lua e para futuras regiões exteriores ao Sistema Solar.

Nesta cerimónia os vários parceiros testemunharam a entrega do primeiro módulo de serviço que irá fornecer a propulsão, energia, ar e água para os astronautas a caminho de Marte.



O módulo de serviço Orion, que visa substituir o antigo Módulo de Serviço de Comando (CSM), utilizado no programa Saturno, resulta de um modelo de cooperação internacional e espelha bem como é que está a ser programada a partilha de custos, que será fundamental para alcançar Marte.

O módulo Orion é financiado pela ESA, mas é construído pelo grupo da Airbus na Europa e depois é entregue à NASA.

Durante o próximo ano, este novo módulo vai ser duramente testado antes de um primeiro voo, que irá até à órbita lunar em meados de 2018.

Esse voo espacial, em princípio não tripulado, servirá também como primeiro teste do maior foguete impulsionador da história da NASA, o Space Launch System (SLS).

Um foguetão ligeiramente inferior ao Saturno V, utilizado no programa Apollo, mas com uma capacidade de transporte de 70 toneladas e com uma capacidade de impulso oito por cento superior.



Se tudo correr como planeado, o primeiro voo tripulado da Orion-SLS será efectuado em 2023 e haverá uma missão tripulada a Marte em 2040. Mas só depois da aplicação de uma atronómica quantia de dinheiro.
Verbas marcianas
O prazo para cumprir todos os objetivos a que a NASA se propõe está cada vez mais curto e sempre muito dependente de financiamento do Congresso norte-americano, que todos os anos tende a diminuir gastos com a política de exploração espacial.

No final da década de 60, a missão Apollo recebeu mais de quatro por cento do Orçamento Ffederal, num total de 19,4 mil milhões de dólares (120 mil milhões atuais) até 1973, mas chegou à Lua em menos de uma década.

Passados 46 anos, o orçamento anual da NASA ronda os 18 mil milhões de dólares.

Se pensarmos que pouco mais de 13 por cento (2,4 mil milhões de dólares) vão para os programas Orion e SLS, os restantes programas da NASA sofrem um forte revés, caso se invista um pouco mais nesta viagem a Marte.

A agência diz que os atuais orçamentos estão programados e orçamentados para financiar um voo anual da Orion até 2020, em missões de pesquisa, no sentido de ajudar a construir e a programar a viagem para Marte.

Mas nesta aventura espacial nunca a NASA avançou com uma estimativa dos custos totais, que poderia assustar muitos dos congressistas e acaber de vez com o sonho da arrojada missão.



Marco Cáceres, um analista da Teal Group, empresa de consultoria aeroespacial, estima que a missão a Marte possa custar, em valores de 2015, pelo menos 1 trilião de dólares, o que significa mais do triplo do valor avaliado.
Parcerias estatais e privadas
A NASA precisará, muito provavelmente, de um “seguro financeiro” adicional para manter o seu cronograma. É neste ponto que entram os outros mecenas e a Europa pode ser a melhor esperança para ajudar com os custos mas não sem uma contrapartida.

“A ESA espera que a sua colaboração com a NASA possa resultar numa parceria internacional em que um astronauta europeu faça parte da futura missão exploratória ao planeta vermelho", afirmou Nico Dettmann, chefe do departamento de desenvolvimento da ESA, durante a conferência de imprensa que se seguiu à apresentação do módulo Orion.

"Nós adoraríamos ver astronautas dos vários países envolvidos quando fossem dados os primeiros passos no planeta vermelho," respondeu, por sua vez, Greg Williams, vice-secretário da NASA para a exploração humana e operações.

"A parceria é um elemento essencial para a realização desta longa empreitada", acrescentou.

Há ainda outros potenciais parceiros espaciais fora da Europa, embora algumas dessas relações possam revelar-se verdadeiras diplomacias-fantasmas.

"Acho que é provavelmente irrealista contar com a Rússia ou com a China, porque eles têm seus próprios problemas", disse Marco Cáceres.

"E politicamente a Rússia não vai ser um parceiro de confiança. O Japão e Coreia poderiam ajudar mas também estas potências dependem das suas prioridades na exploração espacial, nos próximos anos".

Depois destas restam as opções privadas, refere Cáceres. São cada vez mais as empresas que demonstram interesse em investir no negócio espacial e muitas com capacidade comprovada para proteger os investidores e financiamento. Uma aposta que poderá ser a solução para viabilizar uma missão a Marte.

Elon Musk e Jeff Bezos, dois multimilionários, já manifestaram a disponibilidade para diminuir a dependência financeira da NASA, face as contribuições financeiras de outras nações.
 
Mesmo sem o enorme orçamento de JFK para que o Homem fosse à Lua, o analista da Teal Group acredita que o programa espacial norte-americano continua atraente: "A NASA ainda tem um cachet incrível".


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