Memorial do Holocausto no centro de Berlim recorda genocídio de judeus

Berlim tem no seu centro histórico um Memorial do Holocausto para homenagear os seis milhões de judeus assassinados pelo regime nazi durante a II Guerra Mundial, que terminou há 60 anos.

Agência LUSA /
Memorial ao Holocausto EPA

O monumento da autoria do arquitecto norte-americano Peter Eisenmann é formado por 2.711 lápidas cinza, de diferentes dimensões, distribuídas por uma superfície de 19 mil metros quadrados, a lembrar um cemitério anónimo.

Cada uma das lápidas tem 95 centímetros de largura por 2,38 metros de comprimento, e em altura variam entre 20 centímetros e 4,7 metros.

No meio dos blocos de betão, colocados num terreno com várias inclinações, para dar a ideia de um movimento ondulatório, e uma sensação de vertigem, há também um Centro de Informação subterrâneo, em que se recorda a tragédia que atingiu o povo judeu, com base em exemplos de algumas vítimas do III Reich.

Perante mais de mil convidados, entre os quais alguns sobreviventes do Holocausto, representantes de organizações judaicas e a cúpula do Estado Alemão, o presidente do Parlamento Federal, Wolfgang Thierse, considerou o Memorial "uma forma de recordar o mais horroroso dos crimes da Alemanha nazi".

Thierse acrescentou que com a decisão de construir o memorial, tomada em 1999, o Parlamento Alemão "resolveu de forma consciente que a Alemanha reunificada deveria confrontar-se com a sua própria história".

Já o presidente do Conselho Central dos Judeus na Alemanha, Paul Spiegel, manifestou algumas reservas em relação ao Memorial, que, disse, "foge à questão do porquê, e não tem qualquer indicação sobre os culpados, nem sobre as origens da catástrofe da guerra".

Em vez disso, "com a melhor das intenções", prosseguiu Spiegel, foi gravada em 2.711 lápidas de betão a imagem dos judeus como o povo das vítimas".

O dirigente judaico disse ainda que "seria preferível tematizar os motivos dos criminosos no Memorial, possibilitando um confronto directo entre o crime e os criminosos", até porque, acrescentou, "a maioria das pessoas não visitará o centro de informação", onde se relata a tragédia de algumas das vítimas. "Assim, o Memorial ficará incompleto", concluiu.

Por sua vez, Lea Rosh - a quem se fica a dever a construção do monumento, que remonta à iniciativa que a jornalista judia lançou junto da opinião pública alemã, há 17 anos, em prol da respectiva construção - mostrou-se "aliviada" por ver a obra do arquitecto norte-americano Peter Eisenmann concluída.

"É um grande dia para nós", exclamou Lea Rosh, que sobretudo no início do seu apelo teve de convencer várias instâncias, incluindo a municipalidade de Berlim, da importância de haver um Memorial do Holocausto na cidade onde foram dadas as ordens para exterminar os judeus.

"O extermínio sistemático de judeus europeus pelo regime nacional-socialista permanece um acto que escapa à nossa compreensão, e não se pode traduzir de forma artística, por isso, decidimo-nos por este Memorial abstracto", disse Wolfgang Thierse.

O gigantesco campo de lápidas com a dimensão de dois campos de futebol, no centro da capital alemã, "mostra de forma impressionante que o incomparável crime do Holocausto ficará gravado de forma indelével na memória histórica dos alemães", afirmou na cerimónia inaugural o Cardeal Karl Lehmann, presidente da Conferência Episcopal Alemã.

A inauguração do Memorial ao lado da Porta de Brandeburgo, ex-libris de Berlim, e a uma centena de metros do local onde estava o «bunker» em que o ditador nazi Adolf Hitler se suicidou, a 30 de Abril de 1945, oito dias antes da capitulação alemã na II Guerra Mundial, pôs termo a 17 anos de luta pela sua construção, por vezes com grande controvérsia.

Hoje mesmo, o historiador Wolfgang Wippermann, da Universidade Livre de Berlim, criticou o facto de o Memorial ser dedicado apenas aos judeus vítimas do nazismo, sustentando que assim "cria-se uma hierarquia das vítimas do Holocausto".

Na opinião de Wippermann, outras vítimas de extermínio sistemático durante o III Reich, como os homossexuais, ou os ciganos, "foram menosprezadas", exigindo que também haja um monumento em sua memória.

Para o historiador berlinense, "mais importante do que obras de arte sobre o Holocausto são os locais onde as pessoas foram assassinadas pelos nazis, como os campos de concentração".

Pouco antes da inauguração do Memorial do Holocausto, foi encontrada numa das lápidas uma cruz suástica, símbolo do nazismo, desenhada a esferográfica, que, segundo o ex- ministro alemão da Cultura Michale Naumann, só pode ter sido posta por alguém que ali trabalhou, "porque o recinto foi rigorosamente vigiado até hoje".

Para obviar este tipo de actos de vandalismo, as lápidas foram cobertas com um protector contra «grafiiti» da firma alemão Degussa, o que gerou um escândalo, quando alguém lembrou que foi esta empresa que produziu o gás letal «Zyklon B», utilizado pelos nazis para matar os judeus em Auschwitz, o símbolo máximo dos campos de concentração.

A Fundação do Memorial resolveu, no entanto, manter as lápidas e o contrato com a Degussa, passando até a considerar este incidente um símbolo do que foi a Alemanha no passado e daquilo que é hoje.

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