Moçambique destaca que desafios africanos podem ser resolvidos pelos líderes locais

por Lusa

Moçambique partilhou hoje na Organização das Nações Unidas (ONU) as práticas e lições aprendidas na implementação do Acordo de Maputo de Paz e defendeu que os "desafios africanos podem ser resolvidos pelos líderes locais".

Destacando a importância do diálogo com a oposição e do respeito mútuo, o Presidente de Moçambique, Filipe Nyusi, indicou que uma das lições mais importantes que tirou do processo foi que os desafios africanos podem ser resolvidos pelos líderes africanos, salientando que o "processo moçambicano está a ser resolvido por moçambicanos".

"Temos liderado diretamente o processo de paz, colocando os interesses do povo moçambicano em primeiro lugar. Este tem que ser o processo", disse Nyusi.

O chefe de Estado participou numa reunião da Comissão de Consolidação da Paz da ONU com foco em Moçambique, onde foram partilhadas as melhores práticas e lições aprendidas no país na implementação do Acordo de Maputo para a Paz e Reconciliação Nacional -- assinado em 2019 -, de forma a facilitar o intercâmbio de experiências com outros países.

Refletindo sobre alguns pressupostos que "têm permitido o sucesso do processo de consolidação da paz em Moçambique", embora admitindo que "possa não ser perfeito", Nyusi afirmou que um dos principais constrangimentos observados foi a falta de apropriação nacional, com negociações feitas através de intermediários.

"Trazíamos gente de fora para resolver problemas que eles não entendiam bem. Embora tenhamos tido o apoio da comunidade internacional (...), concordamos que o processo deve ser conduzido e liderado pelos próprios moçambicanos, e que as soluções devem ser baseadas na nossa própria realidade", sustentou.

"Os atores nacionais conhecem melhor as nuances do conflito, pelo que o papel dos parceiros internacionais deve ser de apoio", acrescentou.

O líder moçambicano partilhou ainda que a construção da confiança foi um fator decisivo para o sucesso das primeiras etapas das negociações.

"A construção da confiança mútua foi a estratégia de implementação progressiva que facilitou a criação das condições, formal ou informalmente, para a assinatura de acordos. Muitos elementos do acordo foram implementados antes da assinatura dos acordos", sublinhou Nyusi.

Já nas práticas de combate ao terrorismo, Filipe Nyusi destacou a importância da parceria e cooperação com Ruanda e com as populações locais, advogando que graças a esses esforços conjuntos, Moçambique está "gradualmente a restaurar a paz e as pessoas voltam gradualmente para as suas casas".

"Quando os países africanos trabalham juntos e bilateralmente, eles podem encontrar e implementar soluções para lidar com qualquer tipo de ameaça à paz e segurança. (...) Mas devo dizer que o terrorismo não acabou em Moçambique. Apesar de ter enfraquecido, os terroristas continuam ativos e procuram inventar novas formas de atuação, tentando conquistar corações e mentes das populações locais", alertou.

A província moçambicana de Cabo Delgado enfrenta há cinco anos uma insurgência armada com alguns ataques reclamados pelo grupo extremista Estado Islâmico.

A insurgência levou a uma resposta militar desde julho de 2021 com apoio do Ruanda e da Comunidade de Desenvolvimento da África Austral (SADC), libertando distritos junto aos projetos de gás, mas surgiram novas vagas de ataques a sul da região e na vizinha província de Nampula.

O conflito já fez um milhão de deslocados, de acordo com o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR), e cerca de 4.000 mortes, segundo o projeto de registo de conflitos ACLED.

Dessa forma, Nyusi aproveitou a reunião para pediu apoio técnico e financeiro para fortalecer a capacidade dos parceiros bilaterais e multilaterais que se desdobraram no terreno.

"Da mesma forma, é importante apoiar as iniciativas que visam capacitar os jovens para lidar com o desemprego e outros fatores que podem atraí-los para as fileiras do terrorismo", advogou.

Questionado sobre as lições aprendidas em Moçambique que podem ser úteis para outros países, o professor de Direito Internacional Chaloka Beyani, um dos convidados da reunião, destacou o envolvimento da oposição.

"A primeira lição é visão e liderança, que envolveu a oposição. E ser capaz de chegar um entendimento com eles sobre as causas do conflito e o que precisa ser feito", enunciou.

"A segunda lição é entender como é que aspetos da Constituição e leis precisam de ser mudados quando o processo de paz estiver completo, e, por fim, a constitucionalização do acordo de paz em si. Para ser totalmente implementado deve ser parte da lei suprema do país", defendeu.

A reunião na ONU foi liderada pelo presidente da Comissão de Consolidação da Paz, o croata Ivan Simonovic, que apresentou aos restantes diplomatas um balanço da situação em Moçambique, destacando que as perspetivas económicas de médio prazo do país "parecem promissoras", ao mesmo tempo em que a redução da pobreza, as alterações climáticas, o terrorismo ou a criação de empregos ainda representam um desafio.

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