Moçambique precisa de "dados concretos" sobre queixa-crime contra TotalEnergies - Governo
O Governo moçambicano afirmou hoje necessitar de "dados muito concretos" para tomar posição sobre a queixa-crime contra a TotalEnergies, acusada de "cumplicidade em crimes de guerra" no megaprojeto de gás em Cabo Delgado, prometendo seguir o caso.
"Entendemos que é preciso termos dados muito concretos para tomarmos uma decisão crítica em relação a qualquer entidade que coopera com o nosso Estado", disse o porta-voz do Conselho de Ministros, Inocêncio Impissa, questionado pelos jornalistas no final da reunião de hoje, sublinhando ser uma "questão da soberania".
"Não deixaremos de estar atentos de facto para acompanhar, ver o que acontece efetivamente", disse.
A organização jurídica europeia ECCHR apresentou segunda-feira, em França, uma queixa-crime acusando a TotalEnergies de "cumplicidade em crimes de guerra, tortura e desaparecimento forçado" de populares no megaprojeto de gás em Cabo Delgado, norte de Moçambique.
Em comunicado, o Centro Europeu para os Direitos Constitucionais e Humanos (ECCHR) acusa a multinacional de "ter financiado diretamente e apoiado materialmente a Força-Tarefa Conjunta, composta pelas forças armadas moçambicanas, que, entre julho e setembro de 2021, terá detido, torturado e assassinado dezenas de civis nas instalações de gás da TotalEnergies".
Impissa disse que esta informação "é nova" e que o executivo quer dados oficiais sobre o caso, para não tomar decisões baseadas em especulações.
"Vamos continuar a acompanhar, vamos perseguir a informação para saber efetivamente o que isso é e, ao mesmo tempo, perceber até que ponto isto influencia a nossa relação com esta e com outras entidades", disse ainda, concluindo: "Em função da gravidade, se este for o caso, o país, o Governo, vai naturalmente posicionar-se".
A ECCHR refere que submeteu esta queixa na Procuradoria Nacional Antiterrorismo (PNAT) francesa, que também tem mandato para investigar crimes internacionais, acrescentando que a "denúncia centra-se no chamado `massacre dos contentores` nas instalações da empresa", em Cabo Delgado, alegações que foram inicialmente divulgadas pelo jornal Politico, em setembro de 2024.
"Na sequência de um ataque insurgente à cidade de Palma [Cabo Delgado], perpetrado pelo grupo armado Al-Shebab, em março e abril de 2021, o exército moçambicano -- incluindo membros da Força-Tarefa Conjunta apoiada pela TotalEnergies -- terá detido arbitrariamente dezenas de civis em contentores metálicos situados à entrada das instalações, entre julho e setembro de 2021. Os civis fugiam das suas aldeias natais na sequência dos ataques do Al-Shebab quando foram intercetados pelo exército", refere, sobre a queixa apresentada.
Segundo "as alegações apresentadas, os detidos foram torturados, sujeitos a desaparecimentos forçados e alguns deles executados", sendo que "em setembro de 2021, os últimos 26 detidos foram libertados".
"A Força-Tarefa Conjunta foi criada através de um memorando de 2020 entre a subsidiária moçambicana da TotalEnergies e o Governo de Moçambique, como uma unidade de segurança dedicada à proteção das operações do projeto de GNL de Moçambique. A TotalEnergies tinha conhecimento das violações dos direitos humanos cometidas pelas forças armadas antes do massacre", acusa.
A queixa surge depois de a TotalEnergies ter comunicado ao Governo moçambicano, em 24 de outubro, o levantamento da `força maior` declarada em abril de 2021, que suspendeu o seu megaprojeto de 20 mil milhões de dólares (17,2 mil milhões de euros) de Gás Natural Liquefeito (GNL), Moçambique LNG, devido aos ataques terroristas em Cabo Delgado, agora em fase de retoma.
A Comissão Nacional Direitos Humanos (CNDH) moçambicana iniciou em junho passado o processo de investigação de alegados abusos dos direitos humanos cometidos por militares em Cabo Delgado durante os ataques terroristas de 2021, anunciou na altura o presidente da instituição.
Já a TotalEnergies disse, em 27 de março, que a Mozambique LNG, consórcio de produção de GNL em Cabo Delgado, vai cooperar plenamente na investigação da PGR moçambicana à alegada violação de direitos humanos naquela província.