Morreu Helmut Kohl

por RTP
Reuters

Foi dirigente democrata-cristão, apadrinhou a ascensão meteórica de Angela Merkel e, principalmente, ligou o seu nome à unificação alemã. Morreu hoje, aos 87 anos de idade.

Desde uma queda que dera em 2008, e na qual sofrera um traumatismo craniano, Helmut Kohl ficara afectado na sua capacidade de falar e apenas se movia em cadeira de rodas - tendo, mesmo assim, mantido durante algum tempo uma presença relativamente frequente em homenagens públicas que lhe eram prestadas.

Kohl foi chanceler da Alemanha de 1982 a 1998. O Muro de Berlim "caiu" em 9 de Novembro de 1989 e a unificação monetária das duas Alemanhas deu-se em 3 de Outubro de 1990. O longo período de Helmut Kohl à frente do Governo federal divide-se, quase a meio, com uma autoridade sobre a Alemanha ocidental e Berlim ocidental, e, depois, com uma autoridade sobre a Alemanha unificada.

Em 2 de dezembro de 1990 ganhou por confortável maioria as primeiras eleições para um Governo da Alemanha unificada. O rival derrotado foi Oskar Lafontaine, ao tempo líder do partido social-democrata, SPD, e mais tarde migrado para o Partido da Esquerda.

Ao contrário de um preconceito corrente, Helmut Kohl não foi um paciente arquitecto da unificação alemã e sim um político de reacções ágeis, que mudou rapidamente a agulha da sua orientação política assim que uma crise inesperada o confrontou com o desafio de absorver a outra Alemanha.

Investigações posteriores sobre Alexander Schalk-Golodkowski, um alto funcionário do Ministério do Comércio Externo da República Democrática Alemã (RDA), mostraram que Helmut Kohl planeava a sua política com base numa perspectiva de coexistência a longo prazo entre as duas Alemanhas e que procurava influir sobre a evolução política da RDA criando mecanismos de ajuda e dependência económica. A sua principal aposta era a de substituir paulatinamente a influência da URSS sobre a RDA.

A crise foi desencadeada e levada a um desfecho fulminante por uma sucessão de factos ininterrupta: o afluxo de refugiados alemães às embaixadas em Budapeste, a bola de neve das "manifestações das segundas feiras" posta a rolar em Leipzig, e contagiando rapidamente toda a RDA, e enfim a gaffe de um dirigente leste-alemão, Günther Schablowski, que se atrapalhou perante a pergunta feita por um jornalista em conferência de imprensa e admitiu que já se poderia atravessar o Muro.

Com o Muro inesperadamente aberto, Helmut Kohl teve a presença de espírito de entender que todos os planos gizados anteriormente tinham deixado de ter qualquer préstimo.

Dispôs-se a financiar pelos cofres do Estado o câmbio 1:1, quando na verdade o marco oriental era cambiado por 4:1 no mercado negro - o único que reflectia o verdadeiro valor das duas moedas. Criou com isso uma imediata euforia unificadora na antiga RDA e ganhou sem apelo nem agravo as eleições a que o SPD se apresentava como um partido pouco convicto, ou mesmo relutante, sobre a unificação.

Helmut Kohl foi, durante a sua longa sucessão de mandatos, várias vezes criticado por derrapagens verbais ou outras, de que no entanto costumava recompor-se com certo à-vontade. Foi, por exemplo, tristemente notória a sua visita com o presidente Ronald Reagan ao cemitério de guerra de Bittburg, em que, veio a saber-se depois, se encontravam sepultados militares das SS.

Foi também alvo de indignação a sua recusa a participar numa cerimónia evocativa do desembarque aliado na Normandia, com a justificação de que não queria comemorar uma derrota alemã.

Enfim, Helmut Kohl caiu noutra ocasião em desvalorizar cumplicidades de tantos outros alemães com o nazismo, dizendo que não pretendia condená-los, porque ele próprio tinha tido "a sorte de nascer tarde" ("die Gnade der späten Geburt").

No plano da política social, Helmut Kohl emitiu também algumas declarações que passaram a ser citadas em tom sarcástico. Num tempo em que se combatia o desemprego lutando pela redução do horário de trabalho semanal (para 35 horas, em geral, e para 32 horas, como chegou a fazer-se na Volkswagen), o chanceler não hesitou em dizer que a Alemanha estava a tornar-se uma espécie de parque de diversões e de lazer ("Freizeitpark Deutschland").

No entanto, depois de afastado da política activa, Kohl tornou-se um crítico severo da política de desmantelamento do Estado social por parte do Governo social-democrata de Gerhard Schröder e da política de desmantelamento da unidade europeia por parte do Governo de Angela Merkel.

A reverência da actual chanceler por aquele que fora o patrono dos primeiros passos da sua carreira política nunca o inibiu de manifestar em público a sua reprovação pelo que considerava uma atitude prepotente face a países como a Grécia, a Irlanda e Portugal.
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