Em direto
Guerra no Médio Oriente. A escalada do conflito entre Irão e Israel ao minuto

Netanyahu anuncia "pausa" na polémica reforma judicial após protestos massivos. O que se está a passar em Israel?

por Andreia Martins - RTP
Abir Sultan - EPA

O primeiro-ministro israelita anunciou esta segunda-feira que vai adiar o projeto de reforma judicial até a próxima sessão do Parlamento. "Estou a fazer uma pausa para o diálogo" de forma a evitar "uma guerra civil", afirmou Benjamin Netanyahu após a intensificação dos protestos nos últimos dias.

Num discurso ao país, o chefe de Governo israelita anunciou que a adoção definitiva das várias alíneas da reforma judicial será adiada para a próxima sessão parlamentar em Israel, que se inicia após as celebrações da Páscoa, entre os dias 5 e 13 de abril.

A interrupção é anunciada após reuniões com membros da coligação no Governo, abalada pelos acontecimentos dos últimos dias em Israel.

"Quando existe a possibilidade de evitar uma guerra civil através do diálogo, como primeiro-ministro faço uma pausa para o diálogo", afirmou Netanyahu numa declaração transmitida pela televisão israelita.

O primeiro-ministro acrescentou ainda que está a dar uma "hipótese real" ao diálogo como "sinal da vontade de evitar a divisão" na sociedade. 

Entretanto, a maior central sindical de Israel cancelou a greve nacional que tinha sido anunciada esta manhã.
Arnon Bar-David, dirigente do Histadrut, elogiou a decisão de Benjamin Netanyahu e mostrou-se disponível para trabalhar numa reforma judicial que reúna maior consenso.

A greve desta segunda-feira paralisou parte do país, obrigando mesmo o Aeroporto Internacional Ben Gurion a suspender os voos de partida.

"Mais vale tarde do que nunca", reagiu Benny Gantz, uma das principais figuras da oposição ao Governo, saudando a interrupção anunciada pelo primeiro-ministro.

Gantz garantiu ainda que está "imediatamente" pronto para o diálogo, mediado pelo presidente israelita, Isaac Herzog, que tem procurado um consenso entre aqueles que apoiam e criticam a reforma.

Nas últimas horas, a pressão adensou-se para que Benjamin Netanyahu recuasse na aprovação da reforma judicial em curso em Israel.

Esta segunda-feira, o próprio presidente israelita pedia o fim "imediato" do processo legislativo da polémica reforma judicial.

"Pelo bem da unidade do povo de Israel, pelo bem da responsabilidade necessária, peço que ponham fim ao processo legislativo de imediato", apelava o presidente Isaac Herzog num comunicado esta segunda-feira.

Para além das críticas e das manifestações nas ruas ao longo dos últimos três meses, a contestação surgiu dentro do próprio executivo israelita.

De tal forma que o primeiro-ministro demitiu no domingo o seu ministro da Defesa depois de, no dia anterior, Yoav Gallant ter recomendado uma suspensão temporária da polémica reforma do sistema judicial, argumentando que os protestos e contestação popular em curso no país colocavam em risco a segurança do Estado.
Críticas ferozes nas Forças Armadas

Gallant é uma figura com grande influência dentro do Likud, o partido de Netanyahu, e era até aqui um dos pilares do Governo. Os receios do ministro agora demitido estão também relacionados com o papel determinante de reservistas do exército israelita, bem como de várias figuras proeminentes ligadas à defesa do país, no movimento de protesto.

Nas últimas semanas, vários elementos das Forças Armadas e reservistas de unidades de elite ameaçaram paralisar os respetivos serviços caso a reforma judicial fosse aprovada.

"Temos medo das consequências deste processo e do perigo sério e tangível que representa para a segurança nacional do Estado de Israel", lia-se numa carta aberta assinada por mais de uma centena de reservistas.

Outros 650 oficiais das forças especiais afirmaram, noutra missiva, que se recusariam "servir a uma ditadura". Vários antigos oficiais, incluindo o antigo chefe da Mossad, Tamir Pardo, e o ex-chefe da Shin Bet, Nadav Argan, também foram bastante críticos.

Numa entrevista televisiva, o antigo líder da Mossad afirmou que Israel "não precisa de uma bomba nuclear para ser destruído", uma vez que o Estado "decidiu experimentar um método de autodestruição".

"Tenho 70 anos. Nunca imaginei que chegaríamos a este ponto. Este é o maior perigo existencial desde a independência", vincou.

Por sua vez, Nadav Argaman considerou recentemente que a reforma judicial é como "um carro está a ir em direção ao abismo". O ex-dirigente da Agência de Segurança de israel diz mesmo que o país está "virado do avesso" com o "anarquista" no Governo. 
Em que consiste a polémica reforma judicial?
O caráter polémico desta reforma judicial prende-se com a transferência de poderes dos tribunais para o Governo, limitando em particular a atuação do Supremo Tribunal.

Em termos práticos, a aprovação desta reforma retiraria ao Supremo Tribunal o poder de verificar a legislação aprovada pelo Parlamento. Por outro lado, permitiria ao Parlamento rejeitar as decisões do Supremo Tribunal, bastando para isso reunir uma maioria simples (61 votos em 120 deputados).

A polémica reforma judicial prevê ainda mudanças no comité responsável pela nomeação de juízes, incluindo os que constituem o Supremo Tribunal, dando maior poder e influência ao Governo nessas mesmas nomeações.

Segundo a lei atual, o comité inclui três juízes do Supremo Tribunal, dois representantes da Ordem dos Advogados, dois ministros do Governo e dois membros do Parlamento, sendo pelo menos um da oposição.

Para a eleição de juízes do Supremo Tribunal, são necessários pelo menos sete dos nove votos possíveis. A nova proposta do Governo de Netanyahu prevê um maior peso dos representantes do Governo, dando ao executivo a possibilidade de escolher os juízes.

Por fim, os ministros em funções teriam autoridade sobre a nomeação e supervisão dos seus assessores jurídicos, atualmente sob a autoridade do procurador-geral. Esta medida enfraqueceria o poder do procurador-geral do país, que é independente do Governo.

Netanyahu pretendia levar as alterações a votação parlamentar durante esta semana, sendo que está impedido de lidar diretamente com a aprovação da lei judicial pelo procurador-geral do país, que assinala a possibilidade de “conflito de interesses”, uma vez que o primeiro-ministro israelita está a ser julgado num processo de corrupção.

O ministro da Justiça, Yariv Levin, tem sido até ao momento o responsável pela aprovação desta reforma, mas na semana passada, Benjamin Netanyahu considerou que estava livre para assumir a pasta, isto depois de o Parlamento ter aprovado uma lei que torna mais difícil a destituição de um primeiro-ministro em exercício.

A reforma judicial tem sido uma das bandeiras do mais recente Governo de Benjamin Netanyahu. O primeiro-ministro israelita considera que a aprovação da mesma irá permitir um reequilíbrio de poderes, ao retirar privilégios ao Supremo Tribunal.

No entanto, os críticos desta reforma consideram que as mudanças vão colocar em causa os princípios democráticos do país e temem que seja um primeiro passo numa deriva autoritária do país.

c/ agências
Tópicos
pub