Netanyahu diz que afinal foi Hitler o responsável do Holocausto

por RTP
Debbie Hill, Reuters

O primeiro-ministro israelita declarou hoje que, afinal, a decisão da Alemanha nazi, de passar de uma política de expulsão dos judeus para uma de extermínio puro e simples, "não dependeu de influência externa".

Segundo citação do diário israelita Yedioth Aaronot, Benjamin Netanyahu rectificou o seu discurso da semana passada, em que atribuíra ao grande mufti de Jerusalém, Haj Amin al-Husseini, uma sugestão feita a Hitler e que teria sido determinante da decisão nazi no sentido de exterminar os judeus.O acto de contrição de Netanyahu
Em declaração postada na sua página de facebook, Netanyahu afirma: "Quero clarificar as minhas observações sobre a ligação entre o mufti Haj Amin al-Husseini e os nazis". E explica: "De modo algum eu quis dizer absolver Hitler da sua responsabilidade no Holocausto. Hitler e a cúpula nazi são responsáveis pelo assassínio de seis milhões de judeus".

Netanyahu prossegue, depois: "A decisão de passar da política de deportar os judeus para a Solução Final foi tomada pelo nazis e não dependeu de influência externa. Os nazis viam no mufti um colaboracionista, mas não precisavam dele para decidir a destruição sistemática do judaísmo europeu, que começou em Junho de 1941".

Para melhor se justificar, Netanyahu afirma: "Os meus comentários destinavam-se a ilustrar a atitude criminosa do mufti para com osw judeus nos seus prolongados contactos com a direcção nazi. Ao contrário da impressão que foi transmitida, eu não quis afirmar que na sua conversa com Hitler em Novembro de 1941 o mufti o tenha convencido a adoptar a Solução Final. Os nazis decidiram por si próprios".

A autoria moral do Holocausto foi, portanto, dos nazis, e não de um palestiniano.O que realmente se passou na reunião
Como se refere na declaração hoje postada por Netanyahu, a inspiração do judeocídio pelo mufti era uma impossibilidade material, em que só por anacronismo se poderia acreditar: a campanha de extermínio dos judeus começa com o ataque à URSS em Junho de 1941 e a reunião de Hitler com o mufti apenas ocorrerá em Dezembro.

Mas existe além disso suficiente conhecimento sobre o teor da reunião para se poder afirmar que Hitler e Husseini nem sequer falaram sobre a campanha de extermínio entretanto iniciada. O jornalista israelita Ofer Aderet estudou meticulosamente a acta da reunião entre o chefe nazi e o mufti e não encontrou nada sobre o diálogo que Netanyahu citou na semana passada.

Segundo Aderet, em artigo publicado no diário Haaretz, Hitler e o mufti reuniram-se durante cerca de uma hora e um quarto, entre as 4h30 e as 5h45 da tarde, no dia 28 de Novembro de 1941.

Toda a reunião foi estenografada, mas os seus pontos principais foram resumidos pelo diplomata alemão Fritz Grobba, um especialista no Médio Oriente, que aí tinha ocupado diferentes postos, nomeadamente o de embaixador em Bagdad.

O mufti era um convicto direitista, que em 1936 se opusera à revolta dos camponeses palestinianos contra a ocupação britânica. Mas virara depois contra as autoridades britânicas, e tivera de fugir para o estrangeiro. Procurou, na altura, refúgio na Alemanha nazi.

Na reunião, começou por agradecer a Hitler a "honra" que lhe dava ao recebê-lo e tentou lisongeá-lo, dizendo-lhe da admiração que por ele teria todo o mundo árabe. Disse-lhe além disso que os árabes lhe tinham total confiança e que ambos, árabes e alemães, partilhavam três inimigos comuns: os ingleses, os judeus e os bolcheviques.

Por isso mesmo, acrescentou, os árabes desejavam a vitória alemã e estavam dispostos a lutar ao lado da Alemanha. Com este objectivo em vista, reclamavam independência das velhas potências coloniais e pretendiam estabelecer um Estado unificado correspondente aos actuais Iraque, Síria, Líbano, Palestina e Jordânia.

Husseini avisou Hitler de que o Reino Unido também estava a preparar a sua própria versão da independência árabe, pelo que recomendava uma jogada de antecipação por parte da Alemanha nazi, nomeadamente através da publicação de uma declaração conjunta com a Itália.

Hitler respondeu-lhe confirmando a sua hostilidade aos judeus e a sua determinação em impedir o estabelecimento de um Estado judeu, que teria um efeito destrutivo para todo o mundo. Ele, Hitler, pelo seu lado teria, ainda segundo Aderet, o objectivo de exterminar os judeus.

Com a sua característica paranóia, Hitler afirmou que os outros dois inimigos comuns - Reino Unido e URSS -, embora tivessem ambições diferentes, eram países, ambos, dirigidos por judeus, os quais tinham o mesmo objectivo. Por isso, a luta da Alemanha nazi contra os judeus era uma luta de vida ou de morte, proveitosa também para os povos árabes.

O líder nazi afirmou também que, no decurso da sua luta contra o judeo-bolchevismo, as tropas alemãs em breve atingiriam o Cáucaso, podendo então começar a ocupar-se da libertação dos povos árabes e pondo fim ao Império britânico. Prometeu também que nessa altura o mufti se tornaria o porta-voz do mundo árabe.

Hitler prometeu apoio material à luta pela independência de uma pátria árabe, sublinhando que já tinha tentado fazê-lo no Iraque. Mas recusou-se a publicar uma declaração conjunta sobre estes temas.
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