No Brasil grupos criminosos ocupam o espaço deixado pelo Estado, diz AI
Os grupos criminosos estão a ocupar os espaços deixados pela falta de actuação do Estado, nas principais cidades brasileiras, salienta um estudo da Amnistia Internacional (AI) hoje tornado público.
"As cidades do Rio de Janeiro e de São Paulo chegaram a um impasse trágico", refere a organização não governamental no estudo "Brasil: Entre o autocarro em chamas e o caveirão (carro policial blindado): em busca da segurança cidadã".
"As quadrilhas de criminosos apressaram-se a preencher o vazio deixado pelo Estado, promovendo uma espécie de `balcanização` nestas cidades, que estão repartidas em diversos feudos violentos", refere a AI.
O relatório salienta que a negligência do Estado brasileiro e a falta de uma política "coerente" são responsáveis pelo agravamento da crise no sector de segurança pública, nomeadamente nas regiões mais pobres.
O relatório foi divulgado para assinalar um ano do início dos ataques do crime organizado que aterrorizaram a maior cidade brasileira, quando mais de uma centena de pessoas morreu.
O Primeiro Comando da Capital (PCC), facção que comanda os presídios do Estado de São Paulo, comandou três ondas de ataques, nos meses de Maio, Julho e Agosto de 2006.
Nesses períodos, a facção criminosa atacou edifícios públicos, privados, agências bancárias, viaturas e esquadras policiais, postos de gasolina e autocarros.
Os ataques, segundo líderes do PCC, foram a forma encontrada para protestar contra as precárias condições de vida dos detidos nos superlotados presídios de São Paulo.
Nas três ondas de ataques, que atingiram várias cidades do Estado de São Paulo, pelo menos 196 pessoas morreram, entre polícias, suspeitos e civis, e dezenas de criminosos foram detidos.
"A violência de Maio expôs falhas profundas na forma como o Estado trata da segurança pública, que há muito vem sendo caracterizada por medidas reactivas e de improviso", sublinha o relatório.
"O carácter geral das medidas de segurança pública continua sendo violento e confrontador", refere a AI para quem a administração da população prisional tem sido um dos problemas centrais da violência.
"As autoridades recorreram à separação dos presos segundo a sua filiação em grupos criminosos, reforçando uma cultura de gangues", sublinha.
No Rio de Janeiro, os principais problemas são o "policiamento repressivo e violento" e uma escalada da "militarização" do combate ao crime, com o uso de soldados das formas armadas em acções policiais.
A organização cita o exemplo do caveirão, como "símbolo poderoso da militarização crescente do policiamento", além da corrupção dos guardas penitenciários e dos polícias.
O relatório sugere que o Governo brasileiro adopte uma plano de acção como forma de reduzir a violência policial e separar os "laços entre a violência e a exclusão social".
O plano deve incluir igualmente a reforma de todo o sistema prisional brasileiro e também medidas para evitar os homicídios cometidos por polícias.