Nova autópsia tenta esclarecer como morreu Salvador Allende

por RTP
A nova autópsia ao corpo de Allende pretende apurar as circunstancias exactas em que morreu o ex-presidente chileno Ian salas, EPA

O corpo de Salvador Allende foi hoje exumado, a fim de ser submetido a uma nova autópsia. Quase quatro décadas após a morte, a Justiça chilena quer determinar se o ex-presidente do Chile se suicidou, como afirma a história oficial, ou se foi assassinado pelas tropas de Augusto Pinochet durante o assalto ao palácio presidencial no golpe militar de 1973.

A exumação foi ordenada pelo juiz Mário Carroza, na sequência de um pedido da senadora Isabel Allende, filha do antigo presidente chileno, em representação dos familiares.

Um painel de peritos forenses vai agora tentar determinar qual das teses que rodeia a morte do ex-líder socialista do Chile é a correta.

A versão oficial diz que durante o assalto ao palácio de La Moneda, Allende se suicidou, com uma espingarda AK-47 que lhe tinha sido oferecida pelo líder cubano Fidel Castro.

No entanto essa versão começou a ser posta em causa logo a seguir ao assalto e o regime militar sempre procurou esconder ou deturpar os pormenores que rodeavam a morte do Presidente socialista.

O próprio Fidel Castro defendeu a versão de que o líder chileno tinha morrido a combater e algumas versões alegam que foi executado a sangue frio pelos homens de Pinochet.

A versão do suicídio Apenas um homem diz ter testemunhado o suicídio. O Dr. Patricio Guijon, membro da equipa médica de Allende, voltou na terça-feira a reafirmar a sua versão dos acontecimentos à Associated Press, dizendo que “ainda se lembra vividamente” do momento em que viu Allende disparar contra a própria cabeça.

No essencial, este médico corrobora a versão da Junta Militar de que Allende se suicidou com a AK-47, e que mais nenhum tiro foi disparado depois de os soldados chegarem ao local e removerem o corpo.

Na altura, o bombardeamento do palácio já durava há horas e o ruído dos tiros de metralhadora e dos rockets disparados pela aviação era ensurdecedor. Guijon relata que agarrou a arma de Allende, que estava caída sobre o corpo, e a colocou numa cadeira próxima.

Preso e enviado para uma colónia penal durante três meses, Guijon voltaria à liberdade mas como um homem marcado. Os apoiantes da junta militar viam-no como um simpatizante de Allende e a esquerda, devido ao seu testemunho, suspeitava que ele fosse um apologista de Pinochet.

Para a esquerda, Allende tornou-se num mártir e muitos chilenos continuam a acreditar que foi morto pelos militares.

Entre os que sustentam a tese do assassínio está o Dr. Luis Ravenal, um especialista forense, que não esteve envolvido na autópsia original do corpo mas contesta o que diz serem aparentes irregularidades no processo.

Este especialista diz que a autópsia inicial foi feita à pressa, sem instrumentos adequados e sem que tenham sido feitas fotografias.

Os militares não permitiram à viúva ver os ferimentos do corpo que foi sepultado, à pressa, num caixão fechado, apenas identificado com as iniciais NN. Só em 1990, depois de restaurada a democracia no Chile, Allende voltaria a ser sepultado, desta vez com honras militares, no Cemitério Geral de Santiago.

Assassínio?Para o Dr. Luis Ravenal, alguns elementos do relatório de sete páginas que se seguiu à autópsia sugerem que Allende pode ter sido inicialmente ferido por um tiro de pistola, e que terá sido posteriormente assassinado com a AK-47.

Ravenal alega ainda que a arma que foi exibida a público pelos militares como sendo a do suicídio não era a mesma que tinha sido oferecida a Allende por Fidel Castro.

A própria família não está de acordo quanto às circunstâncias da morte. A filha do ex-presidente, a senadora Isabel Allende, declarou que a versão do suicídio é a correta, e acredita que a exumação confirmará essa tese. Mas a sobrinha, Isabel Allende Llona, acredita que seu tio foi assassinado.

O inquérito ordenado pelo juiz Carroza tem como objetivo apurar a verdade “com certeza jurídica” e ainda, reunir provas que possam apoiar acusações adicionais de crimes contra a humanidade contra os responsáveis da Junta Militar, na morte de centenas de pessoas que foram torturadas e desapareceram nos dias imediatos ao golpe militar.
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