Novo protesto em massa contra complexo químico no sudeste da Tunísia

Milhares de pessoas voltaram a concentrar-se hoje em Gabès, na Tunísia, para exigir o encerramento de um complexo químico responsabilizado por centenas de casos de intoxicação desde o início de setembro.

Lusa /

"O povo quer o desmantelamento destas unidades poluentes", gritaram os manifestantes enquanto marchavam em direção ao complexo do Grupo Químico Tunisino (GCT), transportando cartazes com as palavras "merecem respirar" ou com imagens de uma árvore riscada e uma máscara de gás.

Vídeos de jovens a serem levados para ambulâncias ou carregados nos braços de familiares depois de desmaiarem e sufocarem já tinham levado dezenas de milhares de moradores às ruas de Gabès (sudeste) em 21 de outubro, uma mobilização sem precedentes, segundo ativistas.

No entanto, "ninguém no poder está a responder às nossas reivindicações. Pior ainda, o fumo está a piorar de dia para dia", denunciou Abderrazak Ounis, um residente local.

Hassani Essouai, outro morador, não quer "nem reparações nem reabilitação", mas sim "o desmantelamento total" da infraestrutura.

"O povo decidiu (...) que estas unidades devem ser desmanteladas o mais rapidamente possível", frisou Khayreddine Debaya, coordenador da Stop Pollution, uma organização não-governamental (ONG) que lidera a luta em Gabès há uma década.

Fumo cinzento ou preto, olhos e nariz irritados e odores acre. O complexo da GCT, inaugurado em 1972 na costa, é alvo de críticas há anos por parte dos habitantes locais e da Stop Pollution.

O grupo estatal, que fabrica fertilizantes à base de fosfato, despeja os seus resíduos sólidos (fosfogesso contendo metais pesados) no mar aberto e na praia.

A produção emite também dióxido de enxofre, azoto e flúor, de acordo com uma auditoria realizada em julho de 2025 para o Banco Africano de Desenvolvimento, que denunciou "grandes não conformidades" em termos de poluição do ar e marinha.

Diversos estudos têm destacado o desaparecimento de mais de 90% da biodiversidade marinha no golfo de Gabès devido ao fosfogesso.

Os médicos e os residentes locais relatam uma maior incidência de doenças respiratórias e cancro do que noutras partes da Tunísia.

Para alguns especialistas, o recente ressurgimento das emissões tóxicas deve-se ao aumento da produção com equipamentos obsoletos.

O Presidente tunisino, Kais Saied, afirmou recentemente que "partilha a dor e as aspirações" dos residentes da cidade, prometendo que "as soluções estão a caminho" e que "todo o tunisino respirará em breve ar limpo, livre de todas as formas de poluição".

As autoridades encontram-se numa posição delicada em relação a esta questão, pois as minas de fosfato --- o principal recurso natural do país --- são "um pilar fundamental" da economia, segundo Saied.

O governo pretende mesmo quintuplicar a produção de fertilizantes até 2030, para 14 milhões de toneladas por ano.

O Ministro do Equipamento, Salah Zouari, anunciou recentemente a implementação de "medidas urgentes" num prazo de "três a seis meses", após a seleção de empresas chinesas "para lidar com as emissões de gases".

De acordo com vários especialistas, a reabilitação das instalações poluentes, planeada há mais de 15 anos, continua a ser possível, mas muito dispendiosa num país cuja dívida corresponde a cerca de 80% do seu PIB.

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