ONU apela à compaixão da Ucrânia para com homens em fuga à guerra

por Carla Quirino - RTP
Fronteira polaca Bryan Woolston - Reuters

É imperioso que a Ucrânia adote uma abordagem "compassiva e humana" relativamente aos homens que tentam abandonar o país para fugir da guerra, afirma a ONU. De acordo com relatos de trabalhadores humanitários, a lei marcial aplicada pelas autoridades ucranianas está a impedir a saída de homens que não nasceram na Ucrânia.

Na fuga desencadeada pelo conflito, muitos homens que tentam abandonar a Ucrânia argumentam que não nasceram no território. Explicam que estavam no país por motivos de trabalho ou familiares quando a guerra começou, de acordo com funcionários de associações humanitárias.

"Eu não sou originalmente da Ucrânia e esta não é minha guerra", disse um homem, alegando que obteve a cidadania ucraniana apenas para trabalhar no país e que tinha nascido na Bielorrússia.

"Vivi na Alemanha e na Polónia e sou titular de um cartão de residência polaco, o que significa que posso viver na Polónia até dez anos. Mas como sou cidadão ucraniano, não posso sair. Estou desesperado. Não sou cobarde, mas não tenho nenhuma ligação de sangue com a Ucrânia. Consegui falar com as autoridades polacas que disseram que não podem fazer nada porque cabe às autoridades ucranianas. Tenho esposa e filho, mas ela não quer ir embora sem mim", relatou, a coberto do anonimato, à publicação britânica The Guardian.

Muitos homens tentam sair pelas fronteiras húngaras, polacas e romenas, mas as autoridades ucranianas verificam ao detalhe as documentações.

Homens entre os 18 e os 60 anos têm de permanecer em solo ucraniano, dita a lei marcial que entrou em vigor no momento em que a Rússia invadiu o país, embora não queira dizer que sejam obrigados a pegar em armas, segundo o ministro ucraniano da Defesa.
ONU exorta Ucrânia a ser "compassiva e humana"
"Reconhecemos que os Estados têm direito à autodefesa, tanto sob a Carta da ONU quanto sob o direito internacional consuetudinário, e que os Estados também podem exigir que seus cidadãos prestem serviço militar sob certos critérios e condições, de acordo com o direito internacional", sublinhou Matthew Saltmarsh, diretor de comunicação do ACNUR - Alto Comissariado da ONU para os Refugiados.

"Ao mesmo tempo que avaliamos estas circunstâncias como muito desafiadoras, pedimos uma abordagem compassiva e humana para aqueles que procuram fugir e precisam de segurança e proteção", observou Saltmarsh.

A lei ucraniana garante algumas exceções à proibição de os homens saírem do país. Podem abandonar o país cidadãos que tenham a cargo três ou mais crianças menores de 18 anos, sejam pais solteiros de crianças menores de 18 anos ou tenham crianças portadoras de deficiência no agregado familiar.

O homem que conversou com o Guardian acrescentou que tem medo de tentar cruzar a fronteira para a Polónia porque pode ser preso pelas autoridades ucranianas. E alerta para redes de tráfico de refugiados.

"Eu sei que muitos [homens] estão a tentar atravessar. Muitos deles estão a pagar a contrabandistas para atravessar. Ouvi dizer que algumas pessoas chegaram à Polónia, mas a maioria falhou. Eles foram barrados ou presos. E não sei o destino daqueles que foram presos".

Mais de um milhão de ucranianos fugiram para a Polónia desde o início da invasão russa. Só no passado domingo houve registo de 142.300 pessoas. Piotr Zakielarz, porta-voz do departamento fronteiriço polaco, diz que a proibição ucraniana não se aplica à Polónia, que receberá todos os cidadãos, independentemente do género.

"Para nós, todos são iguais na fronteira", afirmou Zakielarz, sublinhando não querer saber quantos eram homens.

A fronteira polaca tornou-se palco da crise de refugiados mais tensa da Europa desde o fim da II Guerra Mundial.
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