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Pandemia e conflitos armados mancham primeiro ano do novo mandato de Nyusi

por Lusa

Analistas moçambicanos consideram que o primeiro ano do segundo e último mandato presidencial de Filipe Nyusi foi negativamente marcado pela gestão da violência armada nas regiões centro e norte do país e pelo impacto da pandemia de covid-19.

Há um ano, Filipe Nyusi tomou posse para mais cinco anos na chefia do Estado moçambicano, na sequência da vitória nas eleições presidenciais de 15 de outubro de 2019 - que se realizaram em simultâneo com as legislativas e provinciais. 

Adriano Nuvunga, docente de Ciência Política na Universidade Eduardo Mondlane (UEM), a maior e mais antiga de Moçambique, considerou à Lusa que os primeiros 12 meses do segundo mandato de Filipe Nyusi foram manchados por uma "má gestão" da componente social de impacto da pandemia de covid-19 e das guerras nas regiões centro e norte de Moçambique. 

"Algumas semanas depois de Filipe Nyusi tomar posse, caiu-lhe em cima a covid-19, mas o que se viu do seu Governo foi o interesse em proteger as elites do impacto da pandemia e o abandono dos mais pobres", criticou Nuvunga. 

A falta de transparência em ajustes diretos na adjudicação de obras realizadas no âmbito das medidas de prevenção da covid-19 e a recusa em apoiar diretamente as famílias mais desfavorecidas, através de uma cesta básica, traduzem a "insensibilidade social" de Filipe Nyusi e do seu Governo, notou. 

"O caos no transporte público nas cidades moçambicanas, num contexto de uma pandemia viral, e a incapacidade de oferecer alternativas de sobrevivência aos mais pobres, para que fiquem em casa e não contribuam para a transmissão do vírus, é mais uma prova da impotência de Nyusi e do seu executivo em encontrar soluções em tempos de crise", observou Nuvunga. 

O académico, que é também diretor do Centro para a Democracia e Desenvolvimento (CDD), organização da sociedade civil, assinalou que o primeiro ano do novo mandato foi marcado ainda pelo agravamento da ação dos grupos armados na província de Cabo Delgado, norte de Moçambique, e pela falta de solução à contestação armada ao acordo de paz com a Resistência Nacional Moçambicana (Renamo), principal partido da oposição.

A contestação é feita por uma dissidência militar da Renamo. 

"No discurso de tomada de posse, Filipe Nyusi prometeu combater os grupos armados em Cabo Delgado, mas o que temos é o agravamento da guerra e no centro temos a Junta Militar da Renamo imparável nas suas ações de oposição ao acordo de paz", frisou. 

Por seu turno, Fernando Lima, jornalista e presidente do grupo de media privado Mediacoop, também apontou o impacto da pandemia de covid-19 e os conflitos armados no centro e norte como os principais constrangimentos enfrentados pelo atual chefe de Estado. 

"O Governo foi apanhado numa conjuntura muito complexa e muito difícil, provocada pela pandemia e ainda nem tinha recuperado da queda provocada pelo escândalo das `dívidas ocultas`", afirmou Fernando Lima. 

Ainda assim, considerou, Filipe Nyusi e o Governo "geriram mais ou menos bem a pandemia", o que resultou num "reduzidíssimo número de óbitos" em comparação com outros países. 

No campo militar e de segurança, Lima apontou o recrudescimento da ação dos grupos armados em Cabo Delgado como resultado das dificuldades do Governo em compreender a natureza e a dimensão do problema. 

O jornalista observou ainda que o primeiro ano do segundo mandato de Filipe Nyusi conheceu a deterioração dos direitos humanos e das liberdades fundamentais, nomeadamente, o ataque a jornalistas e um incremento de raptos. 

"Vejo que Filipe Nyusi, como garante do respeito da Constituição da República, tem sido permissivo aos grupos de interesses que apregoam a repressão dos direitos humanos e das liberdades fundamentais", destacou. 

Por seu turno, o economista Agostinho Machava apontou a queda da economia moçambicana, devido à covid-19, como um marco negativo neste primeiro ano, considerando que o Banco de Moçambique foi tímido nas medidas que implementou para a contenção dos efeitos económicos e financeiros do novo coronavírus. 

"O impacto da covid-19 na economia não é, claramente, imputável a Filipe Nyusi e ao seu Governo, mas o grau de amortecimento dos efeitos é uma questão de governação económica que tem como responsável o chefe do executivo", referiu Agostinho Machava. 

Machava entende que o banco central podia ter ido mais longe na flexibilização das taxas de juro, na proteção da moeda nacional e no apoio à economia face à pandemia. 

"As medidas anunciadas não foram suficientemente fortes para impedir a destruição de milhares de postos de trabalho e a demora na implementação de medidas no âmbito fiscal acabou anulando o efeito que se pretendia", frisou Agostinho Machava. 

A "governação económica" seguida pelo executivo de Filipe Nyusi durante a pandemia em 2019 não impediu o aumento das assimetrias sociais, que se traduziram num aumento da pobreza, concluiu.

Moçambique regista 211 mortes e 24.269 casos de covid-19.

A violência armada em Cabo Delgado começou há três anos e está a provocar uma crise humanitária com mais de duas mil mortes e 560 mil deslocados, sem habitação, nem alimentos.

Os ataques atribuídos à Junta Militar da Renamo já provocaram a morte de, pelo menos, 31 pessoas desde agosto de 2019.


 

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