Papa Francisco. Sínodo põe fiéis a debater a Igreja

por Lusa

O Papa Francisco, a par das reformas na cúria e na renovação do colégio cardinalício, vê o seu pontificado marcado por mudanças significativas, entre as quais a escuta aos fiéis sobre o rumo que a Igreja deve prosseguir.

Com o Sínodo sobre a Sinodalidade, que culminará no Vaticano em outubro de 2024, o objetivo é saber como é que a Igreja está a fazer o "caminho em conjunto" no anúncio do Evangelho, tendo chamado, numa primeira fase, "todos os batizados" a darem opinião.

"Uma Igreja sinodal, ao anunciar o Evangelho, `caminha em conjunto`. Como é que este `caminho em conjunto` está a acontecer hoje" na Igrejas locais, foi uma das principais perguntas colocadas aos cristãos.

Na missa inaugural do sínodo, em outubro de 2021, o Papa defendeu uma igreja "não assética", mas sim apegada à realidade e aos seus problemas.

"Deus não habita em lugares asséticos e tranquilos, afastados da realidade, mas caminha a nosso lado e alcança-nos onde quer que estejamos, pelos caminhos às vezes acidentados da vida", disse Francisco ao clero reunido na Basílica de S. Pedro.

Na igreja "como estamos com a escuta? Como vai o ouvido no nosso coração? Permitimos às pessoas que se expressem, que caminhem na fé mesmo quando têm percursos de vida difíceis, que contribuam para a vida da comunidade sem que se lhes ponham obstáculos, sem que sejam rejeitadas ou julgadas?", foram outras perguntas que o Papa deixou na missa de abertura do sínodo.

Este Sínodo dos Bispos tem por tema "Por uma igreja sinodal: comunhão, participação e missão" e insere-se num processo para dar voz às dioceses e aos fiéis.

Depois de ouvidos os católicos de cada país e feitas as sínteses das diferentes conferências episcopais, começaram as fases continentais do sínodo, tendo a europeia sido realizada em Praga no passado mês de fevereiro.

A dificuldade em acolher e "aceitar a diversidade", como casais em segunda união, pessoas com atração pelo mesmo sexo ou em uniões homossexuais, foi na ocasião reconhecida pela delegação da Igreja Católica Portuguesa na Assembleia Continental do Sínodo dos Bispos.

A síntese da equipa sinodal da Conferência Episcopal Portuguesa (CEP) sublinha que, "diante de modelos de pastoral gastos e distantes de um novo impulso evangelizador, o clericalismo obstaculiza a mudança, o legalismo arbitrário afasta os fiéis e o rosto burocrático de muitas comunidades são geradores de tensão e muitas vezes de abandono".

"Há alguma dificuldade em acolher todos de igual forma e em aceitar a diversidade no seio da Igreja (casais em segunda união, pessoas com atração pelo mesmo sexo ou em uniões homossexuais) em valorizar a fragilidade, nomeadamente das pessoas com deficiência, e em compreender o que se entende por `acolhimento`", adianta o documento.

Segundo as conclusões, "há, ainda, tensões diversas em temas ditos fraturantes, tais como: o acesso das mulheres ao sacramento da ordem; a ordenação de homens casados; a identidade sexual e de género; a educação para a afetividade e sexualidade; e o celibato dos padres".

"Devem ser consideradas, igualmente, outras questões: a forma como são geridas as situações de abusos sexuais; a comunicação hermética que dificulta, não só o diálogo interno, mas o diálogo com a sociedade em geral e, especialmente, com outras confissões cristãs e religiosas", aponta a síntese da equipa sinodal portuguesa.

Nesta segunda fase do processo sinodal, a Igreja portuguesa entende que este "é sinal de esperança que revela a importância de a Igreja dar voz e vez a todos, indo às periferias, manifestando a necessidade de acolher a todos independentemente das suas circunstâncias, incluindo os que moral e canonicamente possam estar numa situação irregular".

Como prioridades para discussão, nomeadamente, na primeira sessão da Assembleia sinodal, a realizar no Vaticano em outubro deste ano, o documento síntese da CEP refere a prioridade a dar aos jovens e à participação da mulher na Igreja e considerando "a possibilidade de ordenar presbíteros homens casados", bem como "ter uma atenção permanente aos pobres e dar centralidade às diferentes questões de cariz social, bem como às questões relacionadas com a ecologia face aos crescentes problemas ambientais".

"Dar resposta às novas realidades sociais e afetivas, fortalecendo os vínculos nas Igrejas domésticas com um acompanhamento personalizado das famílias, e acolhendo os novos modelos familiares (famílias monoparentais, famílias reconstruídas a partir de outras, divorciados recasados, famílias com pais/mães do mesmo sexo e com filhos biológicos ou adotados)" é outra das prioridades identificadas".

Matérias como o diálogo com "a cultura e com o pensamento contemporâneo, em temas como a inteligência artificial, a robótica ou as questões de identidade de género (LGBTQIA+)" ou a necessidade de revisão da "comunicação e linguagem da Igreja (para dentro e para fora) e a ocupação do espaço público como uma voz credível e de serviço" também constam das prioridades.

Outra iniciativa marcante desta década do pontificado de Francisco foi o Sínodo para a Amazónia, em 2019, no qual foi pedida a ordenação de homens casados como sacerdotes, para enfrentar a escassez de clérigos naquela região.

A maioria dos 180 bispos de nove países da Amazónia pediu também a reabertura do debate sobre a ordenação de mulheres como diáconos, sustentando ser "urgente que a Igreja promova e confira na Amazónia ministérios para homens e mulheres de maneira equitativa", segundo o documento final dos trabalhos do Sínodo.

A resposta do Papa não foi a esperada pelos bispos participantes no sínodo.

Em fevereiro de 2020 na publicação intitulada "Querida Amazónia", não se referiu às recomendações para considerar a ordenação de homens e mulheres diáconos casados, exortando os bispos a orarem por mais vocações sacerdotais e a enviarem missionários para a região, onde os fiéis que vivem em comunidades remotas podem passar meses ou até anos sem missa.

Mas não foi apenas esta questão a dominar o sínodo, com a Igreja a ser chamada "a responder a situações de injustiça na região, como o neocolonialismo das indústrias extrativas, projetos de infraestrutura com danos para a biodiversidade, e a imposição de modelos culturais e económicos aos povos locais", como apontava o documento preparatório dos trabalhos

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