Parlamento espanhol desafia Igreja Católica e aprova casamentos homossexuais

O Parlamento espanhol aprovou hoje a lei que permite aos homossexuais casarem e beneficiarem de todos os direitos associados, desafiando a forte oposição da Igreja Católica e completando a emblemática reforma social do Governo socialista.

Agência LUSA /

Com a votação de hoje, em que 187 deputados foram a favor da lei e 147 contra, a Espanha torna-se no terceiro país europeu e quarto no mundo a legalizar o casamento entre pessoas do mesmo sexo, depois da Holanda, Bélgica e Canadá.

Na tribuna reservada aos visitantes, dezenas de defensores dos direitos dos homossexuais levantaram-se para aplaudir, enquanto no exterior, centenas de pessoas saltavam, gritavam ou choravam de alegria com a aprovação da lei.

"Agora, só falta decidirmos qual de nós vai fazer o pedido", disse José Paz, um desenhador gráfico de 38 anos que acompanhou a histórica votação no exterior do Parlamento.

Além do direito a contrair matrimónio, a lei hoje aprovada concede aos homossexuais todos os direitos que decorrem desse acto, entre os quais o de adoptar crianças, receber pensões, administrar heranças, requerer empréstimos ou autorizar intervenções cirúrgicas.

Frontalmente contra estão a Igreja Católica e várias associações defensoras da família tradicional, que consideram esta lei um atentado contra a instituição do matrimónio e hoje reiteraram a intenção de pedirem ao Partido Popular (PP), que votou contra esta lei, que apresente um recurso por inconstitucionalidade.

Com o apoio do Vaticano, a hierarquia católica espanhola qualificou mesmo esta lei de "um retrocesso no caminho da civilização" e pediu aos funcionários das câmaras municipais e registos civis que invoquem objecção de consciência para não celebrar casamentos entre pessoas do mesmo sexo.

O Foro da Família, associação que há dez dias organizou em Madrid uma manifestação de dezenas de milhares de pessoas contra a lei, anunciou por seu lado que vai prosseguir com a mobilização da sociedade, para o que diz já ter reunido um milhão de assinaturas, e lutar pela realização de um referendo sobre a questão.

Segundo a sondagem mais recente do Centro de Investigações Sociológicas, mais de metade (56,9 por cento) dos espanhóis aprova os casamentos homossexuais mas, em relação à adopção de crianças por estes casais, a percentagem dos que aprovam desce para 42,4 por cento.

O primeiro-ministro espanhol, José Luís Rodríguez Zapatero, que com a aprovação desta lei viu concretizar-se uma das suas promessas eleitorais, disse perante os deputados que ela é "mais um passo no caminho da liberdade e da tolerância" que permitirá construir "um país mais decente, porque uma sociedade decente é aquela que não humilha os seus membros".

Com esta lei, Zapatero encerra um ciclo de reformas sociais que começou com a simbólica lei contra a violência doméstica, para lutar contra o que o primeiro-ministro classificou como "a pior vergonha" de Espanha, país que regista um dos níveis mais elevados da Europa de casos deste tipo.

Outra das leis já aprovadas neste âmbito destina-se a facilitar os processos de divórcio e a consagrar a guarda conjunta dos filhos.

O líder do PP, Mariano Rajoy, acusou o Governo socialista de dividir a sociedade espanhola e considerou que a legislação deveria ter sido concertada entre todos os partidos políticos antes de votada e referiu-se ao projecto apresentado pelo PP, que consagrava as uniões entre pessoas do mesmo sexo como uniões de facto, sem direito à adopção.

A lei hoje aprovada entrará em vigor depois de assinada pelo chefe de Estado, o rei Juan Carlos, e publicada pelo diário oficial, o que deverá acontecer ainda em Julho.

Se assim for, prevê-se que os primeiros casamentos se realizem já este Verão, dependendo apenas a marcação das datas dos registos civis e câmaras municipais.

Prevendo um número elevado de pedidos, a câmara de Barcelona já anunciou que vai alargar os dias e os horários previstos para os casamentos civis.

Os interessados devem reunir toda a documentação necessária e dirigir-se, com duas testemunhas, ao registo civil da localidade de residência. A única diferença em relação a um casamento entre heterossexuais é que, na certidão, as palavras "marido" e "mulher" são substituídas pela palavra "cônjuge".

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