PFAS. Poluentes químicos persistentes mapeados na Europa

A Bélgica acomoda o nível mais alto de poluição de produtos químicos sintéticos mais persistentes conhecidos por PFAS. Identificados como Forever Chemicals ou "produtos químicos eternos", estes poluentes não se decompõem no meio ambiente e foram encontrados em níveis elevados em milhares de locais, tanto no Reino Unido como na Europa. Dados agora apresentados num projeto de mapeamento.

Carla Quirino - RTP /
Pascal Rossignol - Reuters

Os PFAS são os produtos químicos sintéticos mais persistentes até hoje conhecidos. Dificilmente se degradam no ambiente natural e foram encontrados no sangue e no leite materno de pessoas e animais selvagens em todo o mundo.

As substâncias alquil per e polifluoradas, também conhecidas como Forever Chemicals – PFAS- são uma grande família química de mais de 4.700 substâncias altamente persistentes.

Os PFAS são usados numa vasta quantidade de usos do quotidiano como por exemplo em recipientes para viagem, caixas de pizza, panelas antiaderentes, roupas e equipamentos impermeáveis ao ar livre, cremes e protetores solares, ou até mesmo telemóveis, espumas de combate a incêndios, resíduos e processos industriais.

Em termos de impacto na saúde, a acumulação de PFAS no corpo humano pode interferir nos sistemas hormonal, reprodutivo ou imunológico e está associada a aos cancros renal e testicular.

Está comprovado cientificamente que os PFAS não se degradam facilmente no ambiente e são muito móveis na água. Desta forma, uma vez libertados no meio ambiente, podem ser transportados até longas distâncias.
Extensão da contaminação
Para avaliar a extensão da contaminação, “The Forever Pollution Project”  pode agora revelar que há muito mais contaminação em toda a Europa do que se sabe publicamente. Foi elaborado um mapa que representa a escala de poluição destas substâncias químicas.

Os cientistas organizaram o mapeamento por concentrações de PFAS consoante a quantidade poluente em cada nanograma por litro (ng/l).

O projeto mostra que existem 20 fábricas e mais de 2.100 locais na Europa que podem ser considerados pontos fortes de PFAS – locais onde a contaminação atinge níveis considerados perigosos para a saúde das pessoas expostas. "O problema: é extremamente caro livrar-se desses produtos químicos, uma vez que eles se encontram no meio ambiente", dizem os autores da avaliação.

As substâncias foram encontradas em cerca de 17 mil locais entre o Reino Unido e Europa. Destes sítios foram identificados 300 acima de 10.000 ng/l. Em cerca de outras 640 áreas foi encontrada uma concentração de 1.000 nanogramas por litro.


“Esse tipo de concentração preocupa-me”, afirma o professor Crispin Halsall, químico ambiental da Universidade de Lancaster, citado na edição online do jornal britânico The Guardian. “Corre-se o risco de o gado ter acesso a essas águas e [então o PFAS está] na cadeia alimentar humana”. Halsall alerta que também há riscos para as pessoas que procuram “a vida selvagem como fonte de alimento, como pesca e aves selvagens”.

O mapa mostra que a Bélgica é o país onde estão os mais altos níveis de poluição. Os PFAS foram encontrados em águas subterrâneas com concentrações que vão até 73 milhões de ng/l , especificamente em torno da fábrica de PFAS da 3M em Zwijndrecht, na região da Flandres.


Protesto da população na Flandres com ovos para solicitar o estabelecimento de um inquérito parlamentar sobre a poluição por PFAS. Fotografia: David Pintens | Twitter

As comunidades que moram a 15 quilómetros do local foram advertidas para não comer nenhum ovo proveniente de galinhas dos seus quintais e evitar vegetais cultivados nesses solos. Entretanto, 70 mil pessoas que vivem num raio de cinco quilómetros da fábrica receberam instruções para realizar análises de sangue para procurar a presença de PFAS.

A 3M responde que vai remediar o local e "assinou um acordo com a região flamenga, com um valor de investimento de 571 milhões de euros". Também anunciou planos para deixar o fabrico destas substâncias, “descontinuando o uso de PFAS no portfólio de produtos até o final de 2025”.

Halsall sublinha que “os PFAS na água subterrânea são um grande problema, porque se essa água subterrânea for captada para a agricultura ou, mais importante, para os humanos como fonte de água, então os PFAS estão presentes diretamente na água (alegadamente) potável e é muito difícil removê-los”.

Nos Países Baixos, depois de um fogo, o uso de espuma de combate a incêndio contaminou a terra em redor do aeroporto de Schiphol, em Amsterdão.
Foram encontrados níveis extremamente altos de PFAS nos solos. Este padrão repetiu-se noutros aeroportos e instalações militares na Alemanha.

No Reino Unido, a descarga de uma fábrica de produtos químicos no rio Wyre, acima de Blackpool contaminou os peixes do rio. As análises revelaram altos níveis de PFAS, por ex, a solha identificada com uma concentração até 11.000 ng/kg, de acordo com dados do Centro de Meio Ambiente, Pesca e Aquicultura da Defra, citados no Guardian.

O professor Ian Cousins, cientista ambiental da Universidade de Estocolmo, reitera que os locais com leituras acima de 1.000 ng/kg devem ser “avaliados com urgência” para que possam ser remediados.

“Em locais [altamente] contaminados, as autoridades locais devem considerar fazer testes para garantir que os níveis de PFAS sejam seguros nos produtos locais. Isso ajudaria a determinar se são necessários conselhos de saúde e campanhas publicitárias para desencorajar o consumo regular de peixes selvagens, mariscos, ovos”, acrescentou.

O químico e especialista em PFAS Roger Klein, acredita que a prática de misturar água para diluir os PFAS está errada. “É a saída preguiçosa e não remove os PFAS, que continuam a ser um problema, pois [eles são] altamente persistentes e bioacumulativos”.

Em Portugal, o mapa interativo revela alguns locais onde foram encontradas concentrações de PFAS. Em Elvas, por exemplo, resgistam-se sítios com dez até 750 ng/l. Em Muge, a concentração sobe para 3,200 ng/l.

Apesar do grande número de deteções reveladas no mapa, os investigadores acreditam que seja "a ponta do icebergue". A Agência Ambiental admitiu que o PFOS, um dos subgrupos dos PFAS – conhecido por ser tóxico para peixes e outras formas de vida aquática – é omnipresente no meio ambiente e que a presença nos rios significará que, até 2039, muitos não vão garantir os padrões de qualidade da água.
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