Plenário da Câmara suspende mandato do deputado que denunciou "mensalão"
O plenário da Câmara dos Deputados decidiu quarta-feira, por maioria, suspender o mandato do deputado Roberto Jefferson, ex-presidente do Partido Trabalhista Brasileiro (PTB) e principal autor das denúncias sobre o "mensalão".
Dos 487 votos válidos, 313 foram a favor da cassação e 156 contra, além de 13 abstenções e cinco votos em branco.
Para garantir o sucesso da proposta, eram necessários 257 votos favoráveis ao parecer do relator da Comissão de Ética da Câmara, que recomendava a suspensão do mandato do deputado.
Com a decisão do plenário, Roberto Jefferson fica impedido de se candidatar por oito anos a cargos públicos sujeitos a eleições.
Antes da votação, o parlamentar do PTB, que fazia parte da coligação que apoiou Lula da Silva na campanha presidencial de 2002, fez um duro discurso contra o governo e o presidente.
"Tirei a roupa do rei. Mostrei ao Brasil o que é o governo Lula", afirmou Roberto Jefferson, acrescentando que sai de "cabeça erguida" perante a decisão do plenário da Câmara.
Roberto Jefferson garantiu que "não retira uma vírgula" às denúncias que fez contra o Partido dos Trabalhadores (PT) sobre a "transferência constante de dinheiro para alugar os partidos da base aliada" no Congresso.
"Este é o governo mais corrupto que testemunhei nos meus 23 anos de mandato", assinalou o deputado.
O ex-presidente do PTB afirmou igualmente que o presidente Lula é "malandro e preguiçoso", acusando-o de praticar um "crime de omissão" no caso do "mensalão".
Segundo Jefferson, o actual governo tratou o Congresso Nacional "como se fosse um prostíbulo" e comparou o PT a um "rato magro" que "se lambuzou quando teve mel".
"O rei está a ficar sozinho no tabuleiro. (Ó) E o Parlamento não pode sair de joelhos disto. Temos que ir ao Palácio do Planalto para investigar", disse Jefferson, perante a Câmara dos Deputados.
O advogado de Roberto Jefferson, que também falou ao plenário, argumentou que houve uma contradição no pedido de cassação do mandato do seu cliente.
Segundo o advogado, o relatório do Conselho de Ética considerou que Roberto Jefferson não provou o "mensalão", mas ao mesmo tempo decidiu instaurar processos a outros 17 deputados por envolvimento com o mesmo esquema.
A primeira denúncia de corrupção no governo Lula da Silva surgiu a 14 de Maio, com a divulgação de uma gravação de vídeo em que um ex- funcionário dos Correios era visto a receber três mil reais (mil euros) para favorecer uma empresa privada.
Acusado de envolvimento nas irregularidades dos Correios, Roberto Jefferson denunciou, em reportagem publicada a 06 de Junho pela "Folha de São Paulo", o "mensalão", um esquema montado pelo Partido dos Trabalhadores para comprar o apoio de deputados ao governo.
As investigações de duas Comissões Parlamentares de Inquérito (CPIs), criadas para examinar as denúncias, acabaram por revelar a existência de um "saco azul" do PT, movimentado pelas agências de publicidade do empresário Marcos Valério de Souza, inclusivamente com transferências para o estrangeiro.
Os recursos terão sido utilizados para pagamento de dívidas de campanha e também para a compra de votos de deputados no Congresso.
O relatório conjunto das duas CPIs propôs a cassação dos mandatos de 18 políticos brasileiros envolvidos no escândalo do "mensalão".
De acordo com os relatores, não existem provas de que os deputados tenham recebido dinheiro do PT mensalmente, mas foi configurada a "quebra de decoro parlamentar por vantagens indevidas no exercício do cargo e abuso das prerrogativas constitucionais".
Uma das origens do dinheiro, segundo o relatório das CPIs, terá sido o desvio de recursos de órgãos públicos.
Roberto Jefferson é advogado e estava a cumprir o sexto mandato como deputado federal.
Em 1992, o parlamentar defendeu o então presidente Fernando Collor de Mello durante o processo de "impeachment".
A sessão que decidiu suspender o mandato de Jefferson foi presidida pelo vice-presidente da Câmara, José Thomaz Nono.
O presidente da Casa, Severino Cavalcanti, evitou expor-se depois do empresário Sebastião Buani ter apresentado quarta-feira um cheque que comprovaria o pagamento de uma "bonificação".
Os pagamentos a Severino Cavalcanti terão sido efectuados em 2002 e 2003, em troca da renovação do contrato do restaurante que o empresário Sebastião Buani explorava na Câmara dos Deputados.