Portugal e São Tomé e Príncipe realizaram hoje a primeira consulta de gastroenterologia por telemedicina, exame que alargou a uma nova especialidade médica uma década de cooperação entre os dois países através desta solução tecnológica.
Uma endoscopia digestiva alta, com recolha de tecidos para biopsia, num paciente em São Tomé, feita por uma médica são-tomense - a primeira especialista em gastroenterologia daquele país, recentemente formada em Coimbra - foi acompanhada em tempo real em Lisboa por uma colega da especialidade, que ofereceu apoio técnico e aconselhamento terapêutico.
Com o ato médico -- presenciado pelo ministro são-tomense da Saúde, Edgar Neves, e pelo secretário de Estado Adjunto e da Saúde português, António Sales -- ficou oficialmente inaugurada a unidade de gastroenterologia do Hospital Dr. Ayres de Menezes, em São Tomé, e em funcionamento o serviço TeleGastro.
"É muito importante para o país o aprofundamento da cooperação com os países de expressão portuguesa, neste caso particular com São Tomé e Príncipe. Estamos muito empenhados nesta cooperação e [este] é um excelente exemplo paradigmático de como, através da técnica, conseguimos fazer o exame que acabámos de ver, uma endoscopia digestiva, com a devida monitorização acompanhada em Portugal", sublinhou António Sales.
Já Edgar Neves manifestou em nome do Governo de São Tomé "de forma muito clara o mais profundo agradecimento por este salto" na prestação de cuidados de saúde, sublinhando o caminho feito pela cooperação entre os dois países, sobretudo na área da imagiologia.
"É esta a cooperação que queremos aprofundar e melhorar. Já o temos feito noutras áreas, já existem consultas de cardiologia, pneumologia, dermatologia, e outras, esta será mais uma consulta", disse António Sales.
O governante escusou-se a concretizar a intenção manifestada de "aprofundar e melhorar" esta cooperação, explicando que "estamos numa fase pandémica e neste momento, o mais importante são, de facto, as vacinas [contra a covid-19], os testes, a cooperação na sequenciação na genotipagem", numa cooperação em curso "entre o Instituto Ricardo Jorge e os países de expressão portuguesa".
"Temos que acorrer a esta fase pandémica. Esta é de facto a nossa maior urgência", reiterou o secretário de Estado, que recordou o compromisso divulgado pelos Negócios Estrangeiros portugueses: "Cerca de 5% das nossas vacinas [irão] para os países de expressão portuguesa, algumas delas já foram para esses países".
A iniciativa enquadrada no Programa Saúde para Todos, implementado pelo Instituto Marquês de Valle Flor (IMVF), é financiada pela cooperação portuguesa, através do instituto Camões, e pela Direção-Geral da Saúde.
O TeleGastro permite a observação simultânea de pacientes por uma equipa são-tomense e por médicos especialistas da área de gastroenterologia da Fundação Champalimaud, em Lisboa.
A especialidade de gastroenterologia soma-se à plataforma de Telemedicina Mediagraf, criada em 2011, e que já integra as especialidades de cardiologia, imagiologia, oftalmologia e otorrinolaringologia.
"Ao longo destes 10 anos temos desenvolvido algumas soluções inovadoras para resolver problemas relacionados com a distância. No início a tecnologia estava dependente dos satélites, com a chegada do cabo submarino em 2014 passamos a poder resolver vários tipos de problemas", explicou o anfitrião do evento, Paulo Telles de Freitas, presidente do conselho de administração do IMVF.
"Passámos a ter todo o tipo de ecografias, quer pediátricas quer de adultos, a ter o TAC [uma máquina doada pela cooperação de Taiwan], ligado a Portugal, mamografias, um serviço de imagiologia totalmente digitalizado e cujos os exames são vistos por médicos portugueses", afirmou.
"E nas áreas da oftalmologia, otorrino e agora na gastroenterologia, em vez de termos um gastroenterologista em São Tomé quatro vezes por ano durante uma semana de cada vez, a solução foi termos um gastroenterologista em permanência, com o apoio de gastroenterologistas portugueses", acrescentou Telles de Freitas .
As soluções encontradas e integradas pelo IMVF no Programa Saúde para Todos em São Tomé, notou Telles de Freitas, podem ser replicadas na Guiné Bissau, desde logo pelos ganhos orçamentais que permite a ambos os países.
"A Guiné-Bissau é a próxima loucura. Acho que este programa pode ser reproduzido na Guiné-Bissau, por uma razão simples: porque é o país que mais doentes envia para Portugal", frisou.
Depende apenas, considerou o presidente do IMVF, "da vontade do Governo da Guiné, em primeiro lugar", mas também da vontade do Governo português e de ter "um conjunto de profissionais de saúde na Guiné-Bissau "que abracem esta causa".
Sobre a disponibilidade do Governo português para replicar na Guiné-Bissau o projeto que vem a ser desenvolvido há três décadas em São Tomé, António Sales deixou à saída do evento alguma esperança.
"Alargar à Guiné Bissau? Com certeza, estamos sempre disponíveis para isso. Uma das grandes aprendizagens que fizemos durante esta pandemia foi a da digitalização dos meios e os meios telemáticos. Temos que aproveitar essa aprendizagem e aprofundá-la, não só com São Tomé e Príncipe, mas com todos os outros países de expressão portuguesa, com quem temos relações muito boas. E, portanto, queremos fazê-lo o mais rapidamente possível, sim", afirmou o secretário de Estado.