Presidente do parlamento cabo-verdiano pede proteção à democracia, no regresso aos debates

O ano parlamentar cabo-verdiano arranca na quarta-feira e, com eleições legislativas à vista, na primeira metade de 2026, o presidente da Assembleia Nacional pede que o calor dos debates não prejudique a democracia.

Lusa /
Foto: ONU Cabo Verde

"Não deixem o calor dos debates pôr em causa a estabilidade política cabo-verdiana, a seriedade e a transparência do processo eleitoral", é o apelo que Austelino Correia faz às forças políticas, numa entrevista à Lusa em que antecipa o regresso ao hemiciclo.

O líder do parlamento, segunda figura do Estado, antevê um parlamento acalorado, mas espera que a troca de argumentos políticos -- que, por vezes, em Cabo Verde, se torna ríspida e pessoal, sobretudo nas redes sociais -- não prejudique as instituições.

"Temos a Comissão Nacional de Eleições (CNE), que funciona muito bem, assim como outros órgãos. É preciso que os políticos, dentro do calor do debate, saibam proteger estes ganhos", ao cabo de 50 anos de independência, referiu.

"Temos de nos focar na democracia, que está em risco a nível global: hoje temos mais autocracias e é preciso preservar a democracia eleitoral cabo-verdiana, que tem dado bons frutos", acrescentou o líder do parlamento, escolhido para o lugar, em maio de 2021, a partir da bancada do Movimento para a Democracia (MpD), cuja maioria sustenta o Governo.

Austelino Correia promete "imparcialidade e diálogo político, com todos", esperando que não haja distrações face à função legislativa.

A agenda inclui como "prato forte" o Orçamento de Estado para 2026, um item habitual nesta altura do ano, com expetativa acrescida por causa do calendário eleitoral.

Outros pontos da agenda são o debate sobre a situação da justiça e a Conta Geral do Estado de 2024.

Depois, depende "da dinâmica dos grupos parlamentares" o agendamento de outros temas, como a reforma do parlamento - com uma comissão eventual criada há dois anos e cujas funções já terminaram, havendo instrumentos concluídos para debate.

A eleição dos titulares de alguns órgãos externos também depende de entendimentos entre deputados -- estão em causa os prazos já ultrapassados das lideranças da Autoridade Reguladora da Comunicação Social (ARC), da Comissão Nacional de Proteção de Dados (CNPD), Comissão Nacional de Eleições (CNE), Provedor de Justiça e juízes do Tribunal Constitucional (TC).

"Tenho feito uma magistratura de influência para ultrapassar as situações", reconhecendo que podem "pôr em causa o bom funcionamento do país", disse, acerca de um tema que tem merecido destaque no debate político nacional.

Austelino Correia recorda que já houve entendimentos para escolher elementos de outros órgãos e instituições: "Não há falta de consenso no parlamento de Cabo Verde. Quando oiço determinados titulares de órgãos de soberania falar de falta de diálogo, fico estupefacto. Se há órgão onde impera o diálogo e o consenso é o parlamento cabo-verdiano", disse.

Nesta legislatura, já foram aprovadas por unanimidade "aproximadamente 80 propostas de lei do Governo" e ainda "37 tratados e acordos", disse.

Os cargos que estão por eleger são processos que se arrastam, porque "é matéria que exige dois terços [de votação] e tem a ver com nomes de pessoas. Quando consensualizámos o pacote de justiça, não havia nomes em causa", exemplificou.

"Quando há nomes é sempre mais difícil", uma dificuldade que associa a "jogos partidários, que falam mais alto". 

"Esses órgãos têm número ímpar. Normalmente, o partido que em determinado momento está no poder, tem maioria. Temos órgãos que vieram de outros tempos e podemos nos questionar: será que o partido que esteve no poder, nessa altura em que foram eleitos os titulares, está disponível para perder a maioria nesse órgão?", perguntou.

Austelino Correia pede "bom senso" e foco "no funcionamento pleno e correto" dos órgãos.

A caminho das eleições legislativas, o presidente da Assembleia Nacional de Cabo Verde pretende melhorar as condições de desempenho dos deputados, promover um ambiente sereno e "terminar o mandato com essa marca de imparcialidade e cumprimento do regimento e da Constituição".

Sobre o futuro, Austelino Correia diz que continuará "a servir Cabo Verde, onde puder servir", seja no seu bairro, município ou ao nível do país, "onde quer que seja, o que eu quero é sempre servir bem Cabo Verde".

Não faz prognósticos sobre onde estará, por exemplo, daqui a um ano, quando começar outro ano parlamentar, deixando "as portas do parlamento abertas" bem como "as portas da vida, abertas", para servir o país.

O Movimento para a Democracia (MpD) tem maioria com 38 deputados no hemiciclo, face a 30 do Partido Africano para a Independência de Cabo Verde (PAICV) e quatro da União Cabo-Verdiana Independente e Democrática (UCID).

 

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