Primeira mulher toma posse como presidente da República do Chile
A pediatra e socialista Michelle Bachelet, que foi presa, torturada e exilada ao tempo da ditadura militar no Chile, prestou juramento como Presidente da República, tornando-se a primeira mulher a assumir a chefia do Estado chileno.
Michelle Bachelet, 54 anos, prestou juramento, numa cerimónia sem discursos, perante o presidente do Senado, Eduardo Frei, no salão repleto do Congresso, em Valparaíso, uma cidade portuária a cerca de 120 quilómetros de Santiago.
Depois do juramento, o presidente cessante, Ricardo Lagos, retirou a faixa branca, vermelha e azul e entregou-a a Eduardo Frei que, por sua vez, a colocou em Michelle Bachelet.
Cerca de mil convidados de 120 países, entre eles o representante de Portugal, o presidente da Assembleia da República, Jaime Gama, estiveram presentes na cerimónia.
Chefes de Estado de trinta países, nomeadamente os presidentes do Brasil, da Argentina, Bolívia, Paraguai, Peru e Venezuela, fizeram questão de assistir à cerimónia.
Muitos países fizeram-se representar na cerimónia por mulheres. Foi o caso da secretária de estado norte-americana, Condoleezza Rice, da ministra francesa da Defesa, Michèle Alliot- Marie, e da primeira-ministra neo-zelandesa, Helen Clark.
A solenidade da cerimónia foi por vezes quebrada pelos simpatizantes da nova presidente que cantavam «Olé, Olé, Olé, Michelle, Michelle, Michelle!».
Presente estava também o novo Governo, formado por dez homens e dez mulheres. A nova presidente prometeu nomear um número igual de homens e mulheres para os cerca de 300 cargos-chave do país.
Michelle Bachelet faz parte de uma nova vaga de dirigentes de esquerda na região, como os presidentes da Argentina, Nestor Kirchner, do Brasil, Luiz Inacio Lula da Silva, e da Bolívia, Evo Morales.
Separada e mãe de três filhos, Michelle Bachelet é a primeira mulher directamente eleita na América Latina sem a ajuda de um marido poderoso, tendo prometido atrair para a política chilena mais mulheres.
É a sexta Presidente da República mulher em toda a América Latina.
A nova chefe de Estado planeia fazer legislação que exija aos partidos políticos incluir uma determinada percentagem de mulheres nas suas listas de candidatos às eleições autárquicas e para o Congresso.
Michelle Bachelet é irmã de um general da Força Aérea que foi torturado e morto na prisão por se opor ao golpe de Estado de Augusto Pinochet, em 1973.
Então com 22 anos e estudante de Medicina, Michelle Bachelet foi presa e torturada, juntamente com a mãe, antes de ser forçada a partir para o exílio.
Envergando um fato de saia e casaco branco e visivelmente emocionada, guardada por um dispositivo policial de três mil polícias e alvo das atenções de 1.200 jornalistas nacionais e estrangeiros, Bachelet iniciou hoje um mandato de quatro anos, depois de ter sido eleita, a 15 de Janeiro.
Obteve 53,5 por cento dos votos à frente de uma coligação de centro-esquerda que integrava os socialistas, democrata-cristãos e radicais.
O presidente da Rússia, Valdimir Putin, enviou à sua nova homóloga chilena uma mensagem de felicitações em que se congratula pela sua intenção de «continuar a ampliar a cooperação russo-chilena em todas as áreas».
«Cremos que a tarefa prioritária nesta fase é incrementar e diversificar o intercâmbio comercial, pôr em marcha projectos e programas conjuntos nos sectores de altas tecnologias, como a indústria aeroespacial, a energia atómica, hidrocarbonetos e telecomunicações», acrescenta Putin.
O chefe do Kremlin sublinha também que há «boas possibilidades» de cooperação técnico-militar entre a Rússia e o Chile.
Na mensagem, Putin defende ainda a necessidade de juntar esforços para «fortalecer a segurança, a nível global e regional, e para lutar contra o terrorismo internacional».
Ao chegar a Valparaíso, o presidente da Venezuela, Hugo Chávez, preferiu destacar a coragem da empossada.
«Estamos perante uma mulher extraordinária e que reflecte o novo tempo que se inicia no horizonte da América Latina», frisou o estadista venezuelano.
Chávez sublinhou as mudanças recentes na região, comentando que na Bolívia foi eleito um indígena, no Chile uma mulher socialista e na Venezuela um «soldado revolucionário».
Antes da cerimónia de posse, Michelle Bachelet reuniu-se com a secretária de estado norte-americana.
Num discurso de despedida na televisão, o presidente cessante afirmou deixar o cargo com a sensação de que «o Chile de hoje é outro:
um Chile melhor, maior e mais justo».
Ricardo Lagos, segundo as sondagens, parte com o apoio de mais de 70 por cento dos chilenos, que destacam os avanços nas questões sociais e a normalização das relações entre civis e militares.
Hoje, o presidente francês, Jacques Chirac, prestou-lhe homenagem, enviando-lhe uma mensagem em que lamenta «ver partir um interlocutor tão aberto, cordial e respeitado» e fazendo votos para que Lagos visite frequentemente a França, onde será sempre recebido como «um verdadeiro amigo, com calor e com o coração».
MF.
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