Protestos cada vez mais violentos. O que se está a passar no Senegal?

por Joana Raposo Santos - RTP
O líder senegalês da oposição, Ousmane Sonko, foi condenado a dois anos de prisão por "corrupção de menores". Zohra Bensemra - Reuters

Pelo menos nove pessoas morreram na quinta-feira em violentos protestos no Senegal e o Governo está a impor restrições ao uso de redes sociais no país. Em causa está a condenação do líder da oposição a dois anos de cadeia. Em resposta, há a registar vítimas mortais, feridos, veículos em chamas e pilhagens. Mas por que razão está a população tão indignada com a sentença de Ousmane Sonko?

"Notamos com pesar a violência que levou à destruição de bens públicos e privados e infelizmente à morte de nove pessoas em Dacar e Ziguinchor", disse na manhã desta sexta-feira o ministro senegalês do Interior, Antoine Felix Abdoulaye Diome, reconhecendo ainda a imposição de restrições no acesso às redes sociais.

Grande parte dos manifestantes são jovens apoiantes do líder da oposição, que saíram à rua em várias cidades depois do veredito.

Ousmane Sonko está detido em casa desde domingo passado, rodeado de forças policiais, uma restrição das liberdades que a organização Amnistia Internacional descreveu como ilegal, uma vez que o líder da oposição não tinha sido notificado de "qualquer ato".
De que é acusado o líder da oposição?
Ousmane Sonko foi condenado a dois anos de prisão por “corrupção de menores”, sendo acusado de ter tido relações sexuais com pessoas com menos de 21 anos.

Foi também acusado de "violações repetidas" de uma jovem massagista, Adji Sarr, e de fazer ameaças de morte contra esta e contra o seu filho.

A condenação a pena de prisão foi anunciada num julgamento no qual Sonko não participou, pelo que a sua defesa não pode recorrer.

O veredito surge depois de o líder da oposição ter sido condenado, a 8 de maio, a seis meses de prisão suspensa por difamação e calúnia pública de um ministro senegalês, que acusou de corrupção.

Conhecido pelo seu discurso "antissistema", Ousmane Sonko critica a má governação, a corrupção e o neocolonialismo francês e tem muitos seguidores entre a juventude senegalesa.
Por que está a população revoltada?
Esta condenação torna o candidato da oposição inelegível para as eleições presidenciais previstas para fevereiro de 2024
, de acordo com o Código Eleitoral senegalês.

Os seus apoiantes, que o querem ver no poder, acreditam que a sentença é parte de um esquema do atual Governo para impedir a sua candidatura às presidenciais de fevereiro de 2024.

Tanto o Governo como o sistema judicial já negaram estas acusações.

O líder da oposição e o seu partido, o PASTEF, também já denunciaram a "instrumentalização" da justiça por parte de Macky Sall, presidente do país desde 2012 e reeleito em 2019.

O PASTEF pediu em comunicado que os cidadãos “parem todas as atividades e saiam às ruas”.
Foto: Zohra Bensemra - Reuters

Os apoiantes de Ousmane Sonko são os mesmos que têm vindo a condenar o atual presidente por falhar em criar empregos e por suspeitarem que este pretende contornar as regras e voltar a concorrer às eleições no próximo ano, ultrapassando assim o limite definido para permanecer no poder.

Sonko ficou em terceiro lugar nas presidenciais de 2019 e é considerado o principal rival de Sall, a quem o opositor já pediu que confirmasse publicamente que não pretende recandidatar-se a um terceiro mandato.
O que está a acontecer nas ruas?
Desde que foi anunciada a sentença, os manifestantes ergueram barricadas com pneus e veículos em chamas, atiraram pedras às forças policiais e saquearam lojas e edifícios públicos.

Em resposta, as forças de segurança utilizaram gás lacrimogéneo para controlar a situação. Para além das nove mortes registadas, há dezenas de feridos na sequência dos protestos.

Os protestos ocorreram em diferentes bairros de Dacar, a capital, mas também em algumas cidades como Ziguinchor, Bignona (sul do país), Saint-Louis, Louga (norte), Kaolack (centro-oeste) e Mbour (oeste).

Em resposta à agitação, o executivo senegalês restringiu na quinta-feira o acesso às redes sociais e plataformas de troca de mensagens. A medida “deverá afetar significativamente a capacidade do público de comunicar”, alertou o observatório NetNlocks.
Quais estão a ser as reações internacionais?
O secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres, já veio condenar a violência no Senegal e apelar à contenção de todas as partes.

Segundo o seu vice-porta-voz, o líder da ONU está a acompanhar de perto a situação no país africano e apresentou as suas condolências às famílias dos que perderam a vida.

Guterres "condena veementemente o uso da violência, pede calma e pede a todos os atores que exerçam moderação", disse o porta-voz Farhan Haq.

Também esta sexta-feira, a Amnistia Internacional condenou a violência, mas foi mais firme ao atribuí-la sobretudo à polícia senegalesa.

A ONG apelou a "investigações credíveis e independentes sobre as mortes ocorridas durante as manifestações".

c/ agências
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