"Reds" - a revolução russa num filme norte-americano

por RTP
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"Reds" é um filme escrito, dirigido e protagonizado por Warren Beatty sobre a vida de John Reed, o jornalista norte-americano que foi enterrado junto à muralha do Kremlin, a curta distância do que viria a ser o mausoléu de Lenine.

John Reed (1887-1920) teve uma curta e fulgurante carreira de jornalista. Aos 26 anos foi correspondente de guerra no México, tendo privado com o líder revolucionário Pancho Villa. Daí resultou uma colectânea de reportagens sob o título "México insurrecto".

Depois foi correspondente de guerra na Europa, tendo sofrido a decepção da viragem belicista dos social-democratas europeus, e tendo entrevistado a figura de proa da minoria anti-guerra na Alemanha, Karl Liebknecht. Depois de ter apoiado nos EUA a candidatura de Woodrow Wilson, sentiu-se traído ao vê-lo quebrar a promessa de manter o país fora da guerra.

Partiu depois para a Rússia e aí viveu o momento decisivo da Revolução de Outubro. Relatou-o com uma prosa sugestiva e colorida, que foi imortalizada sob o título "Dez dias que abalaram o mundo". Os dirigentes da revolução tinham em grande conta essa reportagem que é muitas vezes considerada um dos pontos mais altos da história do jornalismo.

O filme de Warren Beatty relata estas peripécias e entretece-as com a acidentada relação amorosa entre John Reed e Louise Bryant, interrompida nos EUA, retomada na Rússia, em plena revolução.

Mas Reed não era apenas um jornalista perspicaz, observador e talentoso. Na Rússia, ele foi tocado pelo sopro entusiástico da revolução. Uma das cenas inesquecíveis do filme é aquela em que assiste à reunião de uma assembleia operária, é convidado a discursar, começa a fazê-lo com a intermediação de um tradutor e acaba a fazê-lo em inglês, saltando sobre a tradução, para uma assembleia que lhe parece adivinhar o sentido do que diz, e o aplaude entusiasticamente antes de acabar as frases.

Regressado ao seu país, Reed transforma essa adesão intuitiva numa militância quotidiana para construir o Partido Comunista dos EUA. Mas a realidade dessa militância é cinzenta e desgastante - o contraste por excelência com as imagens galvanizantes da revolução. É uma realidade cheia de documentos, parágrafos, estatutos, lutas intestinas, confrontos de seita, de encontros e desencontros. Louise olha essa realidade com um distanciamento que torna mais flagrante o envolvimento obsessivo de John Reed.

Depois, para fazer arbitrar pela Komintern uma desavença que tem com outro partido comunista dos EUA, o de Louis Fraina, Reed parte para a Rússia, no que supõe serem umas escassas semanas de ausência. Ficará por lá até ao fim da vida. A tentativa de regressar aos EUA falha, Reed cai prisioneiro dos finlandeses, beneficia enfim de uma troca de prisioneiros e consegue regressar à Rússia.

Entretanto, Louise empreendeu uma viagem aventurosa para tentar libertá-lo e procura-o na Finlândia quando ele, na Rússia, está a ser enviado a Baku, para o congresso dos povos do oriente. Neste contexto, duas outras personagens desempenham um importante papel no filme: a anarquista Emma Goldman, que foi libertada de uma prisão norte-americana, deportada, e acolhida no exíllio russo em plena guerra civil, mas entretanto entrou em rota de colisão com uma burocracia cada vez mais ubíqua; e Grigori Zinoviev, o chefe da Internacional, de estilo autoritário, que se permite introduzir alterações fundamentais no discurso de Reed em Baku, sem nada lhe dizer, a coberto da barreira linguística.

Ao chegar a Petrogrado, Reed vem já doente de tifo, encontra Louise à sua espera na estação ferroviária, é internado e morre em poucos dias.

O filme estreou em 1981, depois de uma rodagem acidentada e cara, que teve de fazer-se em cinco países, teve de esperar dias de sol em Espanha e dias de neve na Finlândia. Apesar de todas as dificuldades técnicas e do ambiente de guerra fria ainda vigente, o crítico do New York Times Vincent Canby não hesitou em considerá-lo "um filme extraordinário, um grande filme de aventuras romântico, o melhor desde 'Lawrence da Arábia'".

Na ficha técnica brilham nomes tão notáveis como o próprio Beatty, Diane Keaton no papel de sua mulher, Louise Bryant, e Jack Nicholson no papel de Eugene O'Neil, dramaturgo talentoso e cínico. Outras estrelas como Gene Hackman, Edward Herrman e Maureen Stapleton têm também desempenhos importantes, respectivamente nos papéis de Max Eastman e Emma Goldman.

O filme ganhou os Óscares da Academia para o melhor realizador e para a melhor actriz secundária (Maureen Stapleton), bem como várias nomeações. Teve junto do público um êxito assinalável, sendo um dos mais vistos em 1981, com receitas de bilheteira na ordem dos 50 milhões de dólares.
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