Em Amesterdão, o gigante Rijksmuseum apresenta a primeira exposição apresentada na Europa que reúne uma coleção de mais de 200 fotografias norte-americanas. Com o título de "American Photography", a mostra transmite a complexidade da sociedade dos EUA pela lente de fotógrafos do próprio país. A curadoria é, todavia, neerlandesa.
A nova exposição do grande museu de Amesterdão, Rijksmuseum, recebeu o título de American Photography e traça um percurso de como os fotógrafos refletiram as mudanças e eventos no seu país.
A coleção retrata o sonho americano mas visto através de um filtro europeu explica Taco Dibbits, diretor do Rijksmuseum, museu nacional dos Países Baixos.
“O sonho americano, em grande parte, é moldado pela fotografia. Nos Estados Unidos, a fotografia é emancipada, não apenas para uso como uma forma de arte, mas especialmente para uso na vida diária" sustenta. Já a Europa tende para uma cultura visual contrária. “Foi sempre baseada nas belas artes, como pintura e gravuras”, acrescenta.
A coleção explora “a tensão entre - como os Estados Unidos gostariam de se ver e como eles realmente são”, argumentam os dois co-curadores neerlandezes, Mattie Boom e Hans Rooseboom.
O ponto de partida da exposição foi mostrar os EUA através das diferentes perspetivas dos seus fotógrafos. Os norte-americanos "usaram esse meio como nós [os holandeses] usámos a pintura no século XVII", diz Boom, citada na BBC. "A América e a fotografia correm paralelas. A imagem relaciona-se muito com o país", acentua.
"Os americanos gostam de se ver"
O Rijksmuseum começou a colecionar fotografias americanas há 17 anos e o seu acervo atual inclui 7.500 fotografias individuais e 1.500 álbuns de fotos.
Para a exposição os curadores também recorreram a empréstimos. Também parte da coleção do nova-iorquino Peter J. Cohen, que reune imagens adquiridas entre feiras da ladra, vendas de garagem e eBay, engrossou o acervo da mostra.
“De todos os temas da exposição, o sonho americano é o mais fácil de retratar em fotografia”, disse Cohen. Isto “porque muitas vezes é uma expressão de liberdade, alegria ou celebração”, alegou.
“Todo o americano adora tirar fotos no carro novo”, acrescentou.
Seguindo esta abordagem, os curadores não tiveram dúvidas em encorporar a primeira "selfie" do mundo.
Em 1840, Henry Fitz Jr. produziu um dos primeiros autoretratos em suporte de fotografia. Usou uma placa de cobre feita por ele próprio e para lá de registrar a sua aparência. Porém, Henry também documentou os primeiros ensaios de uma arte que iria contar a história dos EUA.
Auto-retrato de Henry Fitz Jnr, em 1840 | Foto: Museu Nacional Smithsoniano de História Americana, Washington (DC)
Combinada com a multifacetada história do país segue também a novos olhares no registo fotográfico.
A exposição conta com um postal de 1913 onde a imagem resgista 12 mil funcionários da Ford Motor Company, em Detroit. Houve quem dissesse na época que teria sido a "foto mais cara já tirada", já que a fábrica teve que fechar durante duas horas para reunir os trabalhadores. A imagem ilustra um ponto de viragem onde a indústria reconheceu o valor em investir bastante dinheito numa fotografia promocional.
A fotografia retrata ainda o momento em que a produção em série moldaria o país.
Ford Motor Company em 1913. Ano em que a Ford introduziu a primeira linha de montagem móvel no país e os EUA se tornaram a maior economia do mundo | Foto: Rijksmuseum, Amesterdão
As migrações também marcaram o percurso fotográfico norte-americano.
James Augustus Van Der Zee foi um fotógrafo americano mais conhecido pelos seus retratos de negros nova-iorquinos, revelando-se uma figura importante no Renascimento do Harlem.
Foi então escolhida uma imagem que regista um período em que migrantes negros fugiam do Sul segregacionista e procuravam uma nova vida no Norte urbano. Pela primeira vez, afro-americanos e outros grupos minoritários puderam ser fotografados por alguém dentro da sua comunidade e representados de uma forma que os destacasse.
O "Retrato de um Homem Desconhecido" de 1938, de Van Der Zee, é cuidadosamente fotografado para sugerir confiança. Trajando roupa elegante o homem projeta "uma imagem que reflete as aspirações e a mobilidade ascendente do povo afro-americano e o orgulho que Van Der Zee tinha na sua cultura", sublinham os curadores.
Retrato de um Homem Desconhecido (1938) por James Van Der Zee | Foto: The James Van Der Zee Archive/ The Metropolitan Museum of Art
A exposição "American Photography", ao documentar a história da fotografia nos EUA, para além das grandes reviravoltas histórica também privilegia imagens de momentos íntimos do quotidiano. É possível observar como "a fotografia gradualmente se tornou uma companheira constante da vida diária", reportam os curadores.
As fotos retratam tanto o “otimismo quanto o naufrágio do sonho americano”, realça Boom.
“Homegirls, San Francisco” (2008) de Amanda López | Foto: Amanda López/ Museu Nacional Smithsoniano de História Americana
Fragilidade norte-americana numa bandeira feita de fósforos
Fragilidade norte-americana numa bandeira feita de fósforos
Stars and Stripes Forever?, a Bandeira dos Estados Unidos, foi uma imagem criada pelo fotógrafo publicitário de Nova Iorque, Bill Stettner, em 1970.
É considerada uma das imagens mais poderosas da exposição. Stettner defendia a fotografia comercial para publicidade, como “uma arte". Apresenta uma bandeira dos EUA feita de fósforos que acabaram de pegar fogo, “sugerindo, talvez, a fragilidade dos EUA e os princípios que a fundaram”.
"A fotografia comercial é muitas vezes esquecida e não colecionada por museus, mas é um campo fascinante pictoricamente", argumentou Rooseboom.
Esta primeira mostra que procura ser, para além de visualmente atraente, acaba também por revelar uma metáfora transversal ao tempo, "convidando os EUA a refletir sobre a sua história", rematam os curadores.
A exposição Fotografia Americana está de portas abertas até 9 de junho de 2025.
Tópicos