Desde a rebelião do fim-de-semana, o futuro do grupo mercenário russo de Evgueny Prigozhin tem suscitado dúvidas, apesar de ser ter transferido para a Bielorrússia para evitar retaliações do Kremlin. Presente há anos no Médio Oriente e em África, servindo interesses políticos externos do Presidente russo, Vladimir Putin, a uma fração do custo do exército, o grupo poderá agora perder os contratos firmados sob a influência do senhor do Kremlin.
O Ministério dos Negócios Estrangeiros da Rússia lavou as mãos do que poderá suceder, referindo esta quarta-feira em comunicado que a decisão de manter o Grupo Wagner em vários países está dependente unicamente da decisão dos líderes daquelas nações.
Palavras que parecem contradizer o próprio responsável pela diplomacia russa, Sergei Lavrov, que há apenas dois dias garantiu que o grupo iria continuar a operar especificamente em África.
Sob anonimato, um alto responsável em Washington, lembrou que os líderes africanos temem rivais internos, admitindo que a marcha dos Wagner contra Moscovo poderá alimentar estes receios, levando-os a perguntar-se se os mercenários não poderão igualmente revoltar-se contra si.
Por outro lado, Moscovo ofereceu aos combatentes Wagner a alternativa de se alistarem no exército russo.
"Isto pode tornar-se um problema", referiu a mesma fonte, "se estas forças Wagner foram absorvidas nas fileiras russas do dia para a noite". "Quando assinaram contratos com as forças Wagner, estes países não subscreveram uma presença militar russa", acrescentou.
Mais recentemente, os wagneritas desempenharam um papel central na guerra na Ucrânia, conduzindo muitas das operações mais sangrentas contra o exército ucraniano.
Organização criminosa
Os operacionais do grupo são sistematicamente acusados de recorrer a violência excessiva e de violações dos direitos humanos nos países onde operam.
"São uma influência desestabilizadora", considerou o porta.voz do Pentágono, o general brigadeiro Patrick Ryder, "e certamente uma ameaça, sendo por isso que foram declarados uma organização criminosa transnacional".
A dispersão do grupo por vários países e as baixas registadas na frente ucraniana forçaram entretanto Evgueny Progozhin a acordar com Moscovo o alistamento no grupo de homens detidos nas prisões russas, para repor os contingentes.
Garantindo a liberdade ao fim de seis meses de combates, caso sobrevivessem, muitos destes ex-condenados são cegamente leais a Prigozhin, ele próprio um ex-condenado.
Mali garantido
Após a rebelião do fim-de-semana contra Moscovo, diversas vozes previram o fim do Grupo Wagner, mas Prigozhin não tem essa expectativa, tendo revelado segunda-feira que as suas ações se destinaram precisamente a garantir-lhe a "sobrevivência".
Esta não parece estar em causa para já, pelo menos no Mali, onde os mercenários têm sido cruciais no auxílio às forças malianas para conter e controlar rebeliões de cariz jihadista e desarmar grupos civis de auto-defesa resultantes da insegurança.
Uma das razões para a contratação dos Wagner por parte da junta militar que governa o Mali, após dois golpes de estado em 2020 e 2021, foi a aparente ineficácia da MINUSMA, a força de paz das Nações Unidas presente no país desde 2013 e cujo mandato termina dentro de dois dias e que não foi renovado.
O executivo maliano tinha pedido para a MINUSMA "alterar a sua postura estática, sair das bases e realizar ações ofensivas e patrulhas", protegendo as bases militares malianas, "em vez de se limitar a proteger-se a si própria".
Além de denunciar a ineficácia da MINUSMA, o Mali rejeita o que considera a influência de França, antiga potencia colonizadora do Mali, nesta força da ONU. "A MINUSMA parece ter-se tornado parte do problema, ao alimentar tensões comunitárias, exarcebadas por algumas alegações graves que são muito prejudiciais à paz, reconciliação e coesão nacional no Mali", afirmou o ministro dos Negócios Estrangeiros do Mali, Abdoulaye Diop.
Em causa um relatório das Nações Unidas publicado no mês passado, que acusou tropas malianas e pessoal militar estrangeiro, alegadamente Wagner, de cometerem atrocidades em março de 2022, incluindo execuções sumárias, violações e tortura, em Moura, uma cidade do centro sul do país.
O exército do Mali alega que "apenas combatentes terroristas" foram mortos em Moura. Testemunhas mencionadas no relatório na ONU afirmam contudo que as forças armadas malianas e "homens brancos armados" foram de casa em casa, juntando homens - mesmo aqueles que apenas mostravam medo - e executando-os a tiro.
As fileiras Wagner incluem, além de russos e de africanos, homens de origem síria e líbia, de acordo com a organização norte-americana sem fins lucrativos Sentry, referindo-se concretamente à CAR.
A perda do apoio de Moscovo poderá vir a criar dificuldades no acesso do grupo a equipamento militar pesado, até agora fornecido por ordem de Putin, a menos que o governo bielorrusso, que se propôs acolher os mercenários evitando uma crise grave na vizinha Rússia, se substitua como fornecedor.
Até agora, nem a RCA nem o Mali reportaram movimentos especiais de tropas ou alterações táticas das forças Wagner nos dias seguintes à rebelião. Os mercenários têm prosseguido as suas operações contra insurgentes locais ao lado das forças militares daqueles países.
Palavras que parecem contradizer o próprio responsável pela diplomacia russa, Sergei Lavrov, que há apenas dois dias garantiu que o grupo iria continuar a operar especificamente em África.
Os Wagner têm auxiliado desde 2018 o governo da República Centro Africana (RCA) a combater rebeldes armados, ao lado de militares russos enviados como "conselheiros".
Moscovo sublinhou que os militares russos irão continuar a trabalhar na RCA, mas referiu que o grupo paramilitar liderado por Evgueny Prigozhin foi contratado de forma autónoma.
O grupo opera ainda no Mali, onde a junta militar no poder depende dos mercenários para conter uma revolta jihadista, na Líbia e no Sudão.
Receio de novas rebeliões
Até agora financiado diretamento por fundos estatais russos, o Grupo Wagner caiu em desgraça após se ter rebelado contra as chefias militares moscovitas, de sexta-feira para sábado, lançando uma ofensiva na própria Rússia. O líder do grupo, Evgeny Prigozhin, acabou por ordenar o recuo sob promessa de amnistia e aceitando transferir as suas bases para a Bielorrússia.
Por outro lado, Moscovo ofereceu aos combatentes Wagner a alternativa de se alistarem no exército russo.
"Isto pode tornar-se um problema", referiu a mesma fonte, "se estas forças Wagner foram absorvidas nas fileiras russas do dia para a noite". "Quando assinaram contratos com as forças Wagner, estes países não subscreveram uma presença militar russa", acrescentou.
Os Wagner em África têm contudo preenchido um vácuo securitário e são difíceis de substituir sem serem criadas novas dependências externas aos Governos dos países onde operam.
Forças norte-americanas defrontaram diretamente homens Wagner na Síria, mas a milícia está ativa principalmente em África, onde terá estacionados 5.000 homens, e onde possui fortes laços com os respetivos governantes.
Mais recentemente, os wagneritas desempenharam um papel central na guerra na Ucrânia, conduzindo muitas das operações mais sangrentas contra o exército ucraniano.
Organização criminosa
Os operacionais do grupo são sistematicamente acusados de recorrer a violência excessiva e de violações dos direitos humanos nos países onde operam.
"São uma influência desestabilizadora", considerou o porta.voz do Pentágono, o general brigadeiro Patrick Ryder, "e certamente uma ameaça, sendo por isso que foram declarados uma organização criminosa transnacional".
O grupo é ainda acusado de explorar diretamente e de forma abusiva os recursos naturais dos países onde operam, nomeadamente em África, de forma a financiar-se.
Há também rumores de recrutamentos forçados entre as populações locais. Muitos destes combatentes terão sido transferidos para as unidades que combatiam na Ucrânia.
A dispersão do grupo por vários países e as baixas registadas na frente ucraniana forçaram entretanto Evgueny Progozhin a acordar com Moscovo o alistamento no grupo de homens detidos nas prisões russas, para repor os contingentes.
Garantindo a liberdade ao fim de seis meses de combates, caso sobrevivessem, muitos destes ex-condenados são cegamente leais a Prigozhin, ele próprio um ex-condenado.
Mali garantido
Após a rebelião do fim-de-semana contra Moscovo, diversas vozes previram o fim do Grupo Wagner, mas Prigozhin não tem essa expectativa, tendo revelado segunda-feira que as suas ações se destinaram precisamente a garantir-lhe a "sobrevivência".
Esta não parece estar em causa para já, pelo menos no Mali, onde os mercenários têm sido cruciais no auxílio às forças malianas para conter e controlar rebeliões de cariz jihadista e desarmar grupos civis de auto-defesa resultantes da insegurança.
Uma das razões para a contratação dos Wagner por parte da junta militar que governa o Mali, após dois golpes de estado em 2020 e 2021, foi a aparente ineficácia da MINUSMA, a força de paz das Nações Unidas presente no país desde 2013 e cujo mandato termina dentro de dois dias e que não foi renovado.
O executivo maliano tinha pedido para a MINUSMA "alterar a sua postura estática, sair das bases e realizar ações ofensivas e patrulhas", protegendo as bases militares malianas, "em vez de se limitar a proteger-se a si própria".
Mais de 300 soldados da paz da MINUSMA perderam a vida desde 2013, tornando-a a segunda operação de paz da ONU mais mortífera de sempre. As exigências da Junta do Mali foram rejeitadas e há duas semanas esta pediu às Nações Unidas para as tropas da MINUSMA abandonarem o país "sem tardar".
Decisão que irá tornar o país ainda mais dependente das Wagner.
Acusações de atrocidadesAlém de denunciar a ineficácia da MINUSMA, o Mali rejeita o que considera a influência de França, antiga potencia colonizadora do Mali, nesta força da ONU. "A MINUSMA parece ter-se tornado parte do problema, ao alimentar tensões comunitárias, exarcebadas por algumas alegações graves que são muito prejudiciais à paz, reconciliação e coesão nacional no Mali", afirmou o ministro dos Negócios Estrangeiros do Mali, Abdoulaye Diop.
Em causa um relatório das Nações Unidas publicado no mês passado, que acusou tropas malianas e pessoal militar estrangeiro, alegadamente Wagner, de cometerem atrocidades em março de 2022, incluindo execuções sumárias, violações e tortura, em Moura, uma cidade do centro sul do país.
O exército do Mali alega que "apenas combatentes terroristas" foram mortos em Moura. Testemunhas mencionadas no relatório na ONU afirmam contudo que as forças armadas malianas e "homens brancos armados" foram de casa em casa, juntando homens - mesmo aqueles que apenas mostravam medo - e executando-os a tiro.
As fileiras Wagner incluem, além de russos e de africanos, homens de origem síria e líbia, de acordo com a organização norte-americana sem fins lucrativos Sentry, referindo-se concretamente à CAR.
Na República Centro Africana, fontes militares afirmaram à Sentry que tropas Wagner têm estado envolvidas em atrocidades em massa, incluindo em minas de ouro e de diamantes de que se apropriaram.
A violência sexual será ainda utilizada pelo exército federal e o Grupo Wagner "como forma de guerra psicológoca para aterrorizar e submeter comunidades inteiras", refere ainda o relatório da Sentry.
Secar as fontes de financiamento
Alguns analistas antecipam um perigoso vácuo de segurança no Sahel, caso as forças Wagner sejam neutralizadas e nacionalizadas por Moscovo. Os mercenários poderão ainda tornar-se uma ameaça na região se escaparem ao controlo dos governos locais.
Ao contrário dos contingentes estacionados na Ucrânia, os mercenários do grupo no estrangeiros são motivados pela ganância e não vieram de prisões. A mística que rodeia o grupo, especialmente depois do avanço registado
em 24 horas na Rússia entre sexta e sábado passados, sem aparente
oposição, poderá também ter sido reforçada.
Em África, os combatentes são pagos por Prigozhin, cuja rede de empresas privadas comercializa minerais da RCA e ouro extraído do Sudão. Estimativas do Financial Times reportam negócios do império mineiro de Prigozhin avaliados em 250 milhões de dólares, entre 2018 e 2021.
Sanções impostas pelo Tesouro dos EUA esta terça-feira começaram já a visar empresas que escoam o ouro e os diamantes recolhidos pelos Wagner, de forma a secar as suas fontes de financiamento, prejudicando a sua ação e influência.
A perda do apoio de Moscovo poderá vir a criar dificuldades no acesso do grupo a equipamento militar pesado, até agora fornecido por ordem de Putin, a menos que o governo bielorrusso, que se propôs acolher os mercenários evitando uma crise grave na vizinha Rússia, se substitua como fornecedor.
Até agora, nem a RCA nem o Mali reportaram movimentos especiais de tropas ou alterações táticas das forças Wagner nos dias seguintes à rebelião. Os mercenários têm prosseguido as suas operações contra insurgentes locais ao lado das forças militares daqueles países.