Senador pergunta a John Kerry se os Estados Unidos andam a encobrir crimes israelitas

Um grupo de políticos enviou há meia dúzia de semanas uma carta ao secretário de Estado John Kerry interrogando-o sobre as execuções extrajudiciais de palestinianos que nos últimos tempos vêm sendo imputadas ao exército israelita. Entre os signatários está o senador democrata Patrick Leahy, o mais antigo senador norte-americano. Leahy e outros 10 congressistas querem que Washington investigue essas alegadas violações dos Direitos Humanos por Israel.

Paulo Alexandre Amaral - RTP /
Mussa Qawasma, Reuters

Nessa carta de 17 de Fevereiro, Leahy pergunta a John Kerry sobre o alegado envolvimento das forças armadas (IDF – sigla para Israel Defense Forces, o exército) e forças policiais israelitas na execução extrajudicial de terroristas palestinianos, tendo em conta a ajuda militar norte-americana a Telavive.

“Tem havido um número preocupante de relatos de possíveis situações de grave violação de direitos humanos por parte de forças de segurança em Israel e no Egipto. Incidentes que poderão ter envolvido agentes que receberam, ou potenciais destinatários, de ajuda militar norte-americana”, assinalam os membros do Congresso, para pedirem a Kerry que “verifique a credibilidade desses relatos”.

A carta foi enviada há mês e meio, mas ganha particular dimensão neste momento em que estão ainda quentes as imagens divulgadas por um palestiniano em Hebron, de um soldado israelita a executar com um tiro na cabeça um palestiniano ferido e caído por terra inconsciente. Um deputado do Meretz, Esawi Frej, classificou o soldado visível na gravação de Bet'selem como um "assassino que disparou a sangue frio na cabeça de um homem ferido e indefeso".

Trata-se de Abed al-Fatah al-Sharif, que, com outro palestiniano – igualmente abatido -, teria atacado com facas um militar das IDF. Al-Sharif já havia sido alvejado e estava imóvel no chão, observado por um grupo de soldados, enquanto o militar israelita que teria sido esfaqueado no ombro era metido numa ambulância.

O vídeo mostra a determinado momento um dos soldados a aproximar-se do palestiniano, apontar a arma e atirar à cabeça à queima-roupa.

É um episódio que tem incendiado as discussões no Knesset, mas que não acabou aí, no parlamento, e que não acabou sequer com a acusação contra o militar que disparou, mas cuja identidade não foi revelada. A cena foi filmada em Hebron, na Cisjordânia, por Imad Abu Shamsiyyeh, membro do grupo de defesa dos Direitos Humanos B’Tselem.

Por ter feito e divulgado o vídeo, Shamsiyyeh e a família tiveram que abandonar a sua casa devido a ameaças dos colonos israelitas que não perdoam a divulgação do vídeo e dizem que não descansam enquanto não lhes queimarem a casa.

A propósito da táctica intimidatória dos colonos israelitas de “queimarem a casa de palestinianos” - Ahmed Dawabcheh tem cinco anos e sobreviveu em 31 de Julho de 2015, em Duma, na Cisjordânia, a um atentado que resultou no incêndio da sua casa e na morte de seus pais e do irmão de 18 meses.

Ainda a respeito da execução filmada em Hebron, o deputado árabe-israelita Ahmed Tibi apontou já o dedo ao primeiro-ministro israelita, vendo em Benjamin Netanyahu uma “responsabilidade pessoal no assassínio”: “Os soldados do IDF abatem e executam palestinianos a sangue frio, devido ao incitamento de ministros e políticos israelitas. Esses políticos não são menos responsáveis por esta execução de hoje do que o soldado que disparou”.

A carta dos representantes norte-americanos ao secretário de Estado John Kerry foi enviada antes deste episódio em Hebron, invocando portanto outros exemplos retirados de relatórios de organizações humanitárias, como a amnistia Internacional.

São citados os nomes de palestinianos alegadamente envolvidos em esfaqueamentos ou tentativas de agressão com faca: Fadi Alloun, que feriu um rapaz judeu de 15 anos e seria morto a tiro durante a perseguição; Saad Al-Atrash, morto a tiro quando tentava esfaquear um soldado israelita nos territórios ocupados de Hebron; Hadeel Hashlamoum, morto a tiro ao chegar a um checkpoint de Hebron armado com uma faca; e Mutaz Ewisa.

A assinatura de Patrick Leahy na carta endereçada a Kerry não é um mero pormenor: sendo um dos senadores mais considerados do país, é também o autor da Lei Leahy (1997). Esta lei proíbe os Estados Unidos de equipar ou treinar forças militares suspeitas de violação dos Direitos Humanos ou de crimes de guerra.

No que respeita ao caso em concreto de Israel, o senador Leahy é o autor de uma proposta que há alguns anos procurava impor restrições na ajuda militar a Israel, com a justificação de que as suas acções criavam vítimas entre palestinianos inocentes. No mesmo pacote, foram enfiados os nomes de Egipto, Paquistão e Jordânia. A lei não passou.
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