Sudão. Aliados do exército acusam RSF de executarem mais de 2.000 civis em Al-Fashir
Os aliados do exército sudanês acusaram hoje os paramilitares das Forças de Apoio Rápido (RSF, em inglês) de terem "executado mais de 2.000 civis desarmados" desde domingo na cidade de Al-Fashir.
A cidade, capital da região de Darfur do Norte, no oeste do Sudão, foi tomada pelas RSF no domingo, depois de um cerco que durou mais de um ano. Vários relatórios e imagens no terreno confirmaram que houve crimes de guerra.
Nos últimos meses, até à sua queda, Al-Fashir tinha-se tornado o principal campo de batalha na guerra do Sudão, que opõe, desde abril de 2023, as RSF ao exército sudanês, apoiado pela Forças Conjuntas.
As RSF "cometeram crimes atrozes contra civis inocentes na cidade de Al-Fashir, onde mais de 2.000 cidadãos desarmados foram executados e mortos a 26 e 27 de outubro, a maioria mulheres, crianças e idosos", afirmou a coligação de grupos armados do Darfur num comunicado publicado na página oficial da rede social Facebook.
O Alto-Comissário das Nações Unidas para os Direitos Humanos, Volker Turk, alertou na segunda-feira para "o risco crescente de atrocidades motivadas por considerações étnicas" - a região de Darfur foi palco de massacres cometidos no início do século pelas milícias Janjawid, das quais as RSF são herdeiras.
O gabinete de Volker Turk confirmou ter recebido informações sobre a execução de civis, de acordo com um comunicado que cita alertas de vários observadores independentes, avançou a agência de notícias France-Presse.
Um relatório do Humanitarian Research Lab (HRL) das Universidade de Yale, que é suportado por vídeos de fonte aberta e imagens de satélite, menciona "execuções em massa" após a tomada da cidade pelas RSF.
"Al-Fashir parece estar a passar por um processo sistemático e intencional de limpeza étnica das comunidades indígenas não árabes - Fur, Zaghawa e Barti -, com deslocações forçadas e execuções em massa", indicou o HRL, que documentou os 18 meses de cerco da cidade.
As imagens analisadas mostraram "objetos de tamanho humano" perto das posições das RSF, com "marcas avermelhadas" no solo. Observações semelhantes foram feitas nos arredores, com vídeos de execuções de civis em fuga, que têm sido partilhados desde domingo nas redes sociais.
Imagens de satélite também mostraram grandes movimentos de população civil a fugir para o sul, rumo ao campo de deslocados de Zamzam, parcialmente transformado numa base paramilitar em abril, depois de ataques das RSF.
"O mundo deve agir imediatamente para exercer a máxima pressão sobre as RSF e os seus aliados, nomeadamente os Emirados Árabes Unidos, para pôr fim aos massacres", declarou o HRL, acrescentando que as ações documentadas configuram crimes de guerra e crimes contra a humanidade.
De acordo com relatórios das Nações Unidas, as RSF receberam armas e drones dos Emirados Árabes Unidos, enquanto o exército sudanês foi apoiado pelo Egito, Arábia Saudita, Irão e Turquia, ainda que todos os países tenham negado estarem envolvidos.
O chefe do exército e líder do país desde o golpe de 2021, o general Abdel Fattah Al-Burhan, reconheceu na segunda-feira a derrota do exército em Al-Fashir, prometendo "vingança e vitória".
Segundo Al-Burhan, o exército retirou-se da cidade "para poupar os civis e evitar a destruição total", dizendo também que a derrota "é apenas uma etapa", que o exército consegue "inverter a situação" e que vão lutar "até purificar a terra das suas impurezas".
Mais de 26 mil pessoas fugiram dos combates desde domingo, fugindo sobretudo para os arredores de Al-Fashir e para a cidade de Tawila, a 70 quilómetros a oeste.
A guerra já causou dezenas de milhares de mortos, milhões de deslocados e mergulhou o país africano naquilo que a ONU descreve como "a pior crise humanitária do mundo".