Teorias e mitos sobre a origem do novo coronavírus

por Inês Moreira Santos - RTP
Reuters

A verdadeira origem do novo coronavírus ainda não é conhecida. Não há como provar como surgiu, o que tem alimentado a crescente desinformação e algumas teorias mais dúbias.

Há quem diga que foi feito em laboratório na China e que, acidentalmente, escapou das mãos dos cientistas e se começou a espalhar na cidade de Wuhan. Também há a teoria de que é uma arma biológica produzida pelos chineses. Há ainda quem acuse os Estados Unidos de, através das suas forças militares, terem levado o vírus, de propósito, para a cidade onde começou o surto.

Para quem não acredita na culpa do ser humano, o vírus terá criado raízes no mercado de Wuhan, ou surgido dos animais expostos para venda e/ou alimentação - os cientistas consideram que pode ter tido origem nos morcegos ou nos pangolins.

A teoria mais recente é que as tecnologias de comunicação, nomeadamente a rede 5G, são as responsáveis, ou pelo menos estão associadas, à proliferação em massa do novo coronavírus - teoria que o governo britânico, depois de terem sido vandalizadas antenas de 5G considera falsa e "um absurdo".

A verdade é que os cientistas, a nível mundial, ainda não têm conclusões sobre qual a verdadeira origem do novo coronavírus, nem "quem" terá sido o "paciente-zero" da Covid-19. A única certeza, até agora, é que este vírus se propaga rapidamente e, à medida que se foi espalhando pelo mundo fora, a desinformação, as teorias e os mitos cresceram à mesma velocidade.
Morcegos - a teoria mais provável
Internacionalmente, os cientistas têm trabalhado em conjunto para condenar e pôr fim às teorias de conspiração nacionalistas.

No entanto, até os investigadores estão divididos relativamente ao que antes era amplamente considerado o culpado mais provável: o mercado em Wuhan, onde os animais selvagens são mantidos em gaiolas e vendidos como animais de estimação ou comida.

Num elemento concordam: não há evidências de que os governos chinês ou norte-americano tenham criado o vírus e exposto a população mundial, de propósito, a esta doença. Para já, a explicação mais provável e defendida pela maioria continua a ser a origem nos morcegos.

"É a explicação mais simples, óbvia e provável", disse à CNN Simon Anthony, professor da faculdade de Saúde Pública da Columbia University e membro-chave do PREDICT, um programa global financiado pelo governo federal que investiga vírus em hospedeiros de animais com potencial pandémico.

Contudo, nem todos os especialista concordam com esta teoria de que o novo coronavírus surgiu num mercado onde animais selvagens estão expostos para venda, na cidade chinesa de Wuhan.

Os proponentes acreditam que a natureza destes mercados lotados de pessoas e animais selvagens destinados ao abate, os torna os culpados mais prováveis. Já os que duvidam frisam que, segundo um estudo, muitos dos primeiros pacientes conhecidos não tinham tido exposição direta aos mercados.

De acordo com esse estudo, divulgado na Science Direct, apenas 27 dos 41 casos em estudo num hospital em Wuhan tinham estado no mercado da cidade chinesa.

Mas "não foi identificada nenhuma ligação epidemiológica entre o primeiro paciente e os casos posteriores", lê-se no relatório.

Há ainda uma outra teoria, apresentada por dois cientistas chineses no início de fevereiro, que afirma que o vírus teve origem num acidente num dos dois laboratórios perto do mercado de Wuhan onde trabalham com morcegos.

No entanto, como esta não tinha muitas evidências em que se pudesse basear, o artigo acabou por ser retirado e a teoria caiu por terra.
Coronavírus escapou de laboratório

Richard Ebright, professor de biologia química e especialista em armas biológicas da Universidade Rutgers, nos EUA, sugeriu já por diversas vezes que a teoria de um acidente em laboratório tem credibilidade.

"A possibilidade de o vírus contaminar humanos através de um acidente de laboratório não pode nem deve ser descartada", disse à CNN.

A verdade é que a teoria de que o novo coronavírus pode ter sido produzido laboratorialmente tem ganho terreno e dividido mais os cientistas.

Mas um estudo recente ao SARS-CoV-2, divulgado na Nature Medicine, pode colocar essa ideia de lado.

Um grupo de investigadores comparou o genoma desse novo coronavírus com o de outros seis coronavírus conhecidos por infetar seres humanos, como o SARS e o MERS, por exemplo.

Kristian Andersen, professor associado de imunologia e microbiologia da Scripps Research, juntamente com a equipa de investigação, analisou o modelo genético das proteínas "spike" que se projetam da superfície do vírus. O coronavírus usa esses "picos" para agarrar as paredes externas das células do hospedeiro e depois entrar nessas células.

Esta investigação concluiu que a ligação às células humanas é tão eficaz que, para os estes investigadores, as proteínas "spike" foram resultado da seleção natural e não da engenharia genética.

Os investigadores explicam que nas simulações realizadas virtualmente, em computador, as mutações no SARS-CoV-2 parecem não funcionar tão bem para ajudar o vírus a ligar-se às células humanas. Por isso, se o vírus tivesse sido deliberadamente manipulado, os cientistas não teriam escolhido mutações que os modelos de computador sugerem que não funcionam.

Além disso, a estrutura molecular geral do novo coronavírus é distinta dos coronavírus já conhecidos e assemelha-se mais aos vírus encontrados em morcegos e pangolins foram estudados por se suspeitar de estarem na origem do surto.

"Se alguém estivesse a tentar projetar um novo coronavírus como patógeno, tê-lo-ia construído a partir da espinha dorsal de um vírus conhecido por causar doença", esclareceram os investigadores num comunicado.

Numa coisa os defensores da teoria de que os morcegos é que transmitiram, inicialmente, o vírus estão de acordo: a culpa não é dos morcegos, ou de qualquer animal que venha a ser identificado como causador, é da ação humana.

Alguns especialistas ouvidos pela CNN explicam que foram as mudanças no comportamento humano – como a destruição dos habitats naturais acompanhada de um grande fluxo de pessoas que existe no mundo – que permitiram que chegassem aos humanos doenças que antes se ficavam pela natureza e que atingiam apenas animais.

Para a generalidade dos cientistas uma coisa é óbvia: a probabilidade de haver novos surtos de Covid-19 é menor se for comprovado que não há transmissão de animais e que o vírus não circula na população animal, uma vez que será mais fácil controlar a propagação do vírus nas populações humanas.
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