TPI acredita que crimes contra a humanidade continuam a ser cometidos no Darfur

O Tribunal Penal Internacional (TPI) indicou hoje ter "motivos razoáveis para acreditar" que crimes de guerra e crimes contra a humanidade continuam a ser cometidos no Darfur, apontando para provas documentais, testemunhais e digitais.

Lusa /

Numa reunião do Conselho de Segurança da ONU sobre as atividades do TPI no Darfur, a procuradora-adjunta do tribunal, Nazhat Shameem Khan, esclareceu que essa conclusão baseia-se nas atividades intensivas que o seu gabinete tem vindo a realizar nos "últimos seis meses e em períodos anteriores".

Essas atividades incluíram, entre outras, repetidas missões em campos de refugiados no Chade, visando interagir com as vítimas e realizar entrevistas com testemunhas.

"Com base nas nossas investigações independentes, a posição do nosso gabinete é clara: temos motivos razoáveis para acreditar que crimes de guerra e crimes contra a humanidade foram e continuam a ser cometidos no Darfur", afirmou a procuradora.

Com base nestes esforços de campo, e aproveitando mais de 7.000 itens de provas recolhidos até à data, o gabinete do Procurador do TPI está agora focado em responder aos apelos por justiça feitos pelas vítimas e sobreviventes.

"Não seremos desencorajados até que uma justiça significativa seja feita de uma forma que sirva para reivindicar os direitos daqueles que estão a sofrer e que tenha impacto na conduta dos perpetradores", frisou.

Em dezembro passado, o TPI iniciou a etapa final do julgamento de Ali Muhamad Ali Abdel Rahman, conhecido como "Ali Kushaib", destacado comandante das milícias Janjaweed, acusado de crimes contra a Humanidade no Darfur entre 2003 e 2004.

Segundo o procurador principal do TPI, Karim Khan, o líder miliciano participou "voluntariamente e com entusiasmo" em crimes de guerra, marcados por violações, assassínios e torturas.

Referindo-se diretamente a esse julgamento, Nazhat Shameem Khan disse hoje que espera que decisão do TPI, prevista para o segundo semestre deste ano, sirva de exemplo e contrarie a sensação de "impunidade" que reina neste momento no Darfur.

A procuradora admitiu estar a trabalhar intensamente para garantir que o julgamento de Ali Kushaib seja "apenas o primeiro de muitos", mas invocou o "dever de confidencialidade" para não avançar com mais pormenores.

Nazhat Shameem Khan fez ainda um ponto da situação no terreno, sublinhando que a situação humanitária no Darfur atingiu um estado intolerável, com a fome a aumentar e a ajuda a não chegar aos mais necessitados.

Além disso, as violações e a violência sexual estão a ser usadas como armas, denunciou, alertando ainda: "não devemos ter ilusões, porque as coisas ainda podem piorar".

A procuradora explicou que existe um padrão evidente de ataques visando o género e a etnia, através da violação e da violência sexual, "que deve ser traduzido em provas para o tribunal e para o mundo ouvir", reforçando que as mulheres e crianças são as maiores vítimas.

"Estes alegados crimes estão a receber prioridade especial do nosso escritório à medida que prosseguimos com o foco no nosso trabalho de investigação", declarou.

Nazhat Shameem Khan aproveitou ainda para apelar à detenção de quatro indivíduos que foram alvo de mandados de detenção do TPI no Sudão: o ex-presidente Omar Hassan Ahmad Al Bashir, Ahmad Muhammad Harun, Abdel Raheem Muhammad Hussein e Abdallah Banda Abakaer Nourain. 

"No contexto atual das extensas alegações de violações do Estatuto de Roma no Darfur, tal ação [detenção dos quatro homens] enviaria um sinal forte e mostraria o empenho do Governo do Sudão em garantir a responsabilização", instou.

Apesar da reunião do Conselho de Segurança ser focada no Darfur, os Estados Unidos usaram da palavra para atacar o TPI, organismo que classificaram como "altamente politizado" e o qual condenaram por "dedicar os seus recursos e atenção a Israel, apesar das atrocidades no Sudão".

Em causa estão os mandados de captura emitidos pelo TPI, sediado em Haia, para o primeiro-ministro israelita, Benjamin Netanyahu, e o para o ex-ministro da Defesa Yoav Gallant, por crimes contra a humanidade e alegados crimes de guerra na Faixa de Gaza.

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