Tsunami - A terra tremeu há um ano, levando o inferno aos paraísos de férias
A 26 de Dezembro de 2004 a terra tremeu às 7:58 na Indonésia ao largo da costa ocidental da ilha de Samatra do Norte, a 1.620 quilómetros a noroeste de Jacarta.
Nas horas seguintes, as ondas gigantes que se formaram devido ao sismo de magnitude 9,3 na escala de Richter varreram paraísos de férias que rapidamente se transformaram num inferno e local de morte para milhares de pessoas.
Doze meses passados ninguém consegue ainda determinar ao certo quantas foram as vítimas mortais. à medida que se conhecem mais pormenores do desastre, consolida-se a ideia de "quem se salvou foi por milagre".
Na Tailândia, local de veraneio para mais de duas centenas de turistas portugueses, perderam a vida cinco residentes de Macau de nacionalidade portuguesa mas as "paredes de água" que chegaram às praias do país provocaram 5.395 mortos, 2.817 desaparecidos e 8.457 feridos, segundo números oficiais divulgados em Agosto.
Um ano depois, o português Paulo Coutinho regressa à Tailândia para homenagear a mulher, uma das cerca de 280.000 pessoas que sucumbiram à força das águas.
"Vou para homenagear a Belinda e também porque sinto uma necessidade muito grande de estar com pessoas que passaram por tudo isto para falar e aprender a lidar com esta situação porque me preocupa muito o futuro dos meus filhos e as consequências deste processo", disse.
Os números, assustadores especialmente na Indonésia, na Tailândia e no Sri Lanka, traduzem a força das águas que destruíram tudo à sua passagem e provocaram a morte a cerca de 280.000 pessoas.
Em Khao Lak, província tailandesa de Phangnga, 70 quilómetros a norte de Phuket, uma hora e meia depois do sismo, a água do mar recuou cerca de 100 metros.
Três minutos depois, uma primeira onda com dois a três metros atingiu a praia. às 09:43, o primeiro tsunami atingiu a costa e tinha uma altura entre seis e sete metros, algo semelhante a um segundo andar.
A segunda e terceira ondas "tsunami" chegaram à praia às 10:03 e 10:20 e tinham uma altura de, respectivamente, dez metros e cinco metros. A terceira inundou a região por cerca de uma hora.
Só ao meio-dia, quase duas horas e meia depois da primeira onda ter atingido a praia, o mar voltou a um nível normal.
As primeiras informações sobre o sismo seguido de maremotos foram divulgadas muito rapidamente, mas a confusão estava instalada porque quem sobreviveu era agora aconselhado a procurar refúgio nas zonas altas devido aos alertas de novas ondas gigantes.
Rapidamente as comunicações que ainda funcionavam nos países afectados ficaram sobrecarregadas e frequentemente as chamadas iam parar a outro número qualquer.
A dificuldade das comunicações e o facto de haver poucos telemóveis na posse de quem sobreviveu eram barreiras para o contacto e para a obtenção de informações seguras. Por isso mesmo, as primeiras notícias não conseguiam transmitir a dimensão da tragédia que em poucas horas tinha transformado férias de sonho em tragédia.
Ao fim da tarde na Ásia (fim da manhã na Europa) as informações começavam a ganhar consistência, a lista de pessoas a contactar ia ficando mais reduzida e o número de portugueses desaparecidos ou incontactáveis não ultrapassava as duas dezenas.
Os relatos dos sobreviventes davam uma dimensão da tragédia muito maior do que a que as autoridades oficiais conseguiam apurar. A cada minuto as televisões de todo o mundo iam actualizando o número de vítimas mortais num processo que se prolongou pelas semanas seguintes.
Relatos de pessoas que tomavam o pequeno-almoço e que, de repente, se viram no meio do mar arrastada por uma onda que chegou sem aviso, ou que contemplavam uma paisagem nunca vista devido ao recuo do mar momentos antes das ondas atingirem a costa, foram feitos e divulgados um pouco por todo o mundo.
Ao longo da noite, quando as atenções dos portugueses residentes em Macau se concentravam na pequena Mafalda Carvalho, Paulo, Belinda, Zora e Gil Coutinho, José, Amélia e Mónica Ribeiro e em Leonel Rodrigues - estavam ainda mais três luso-descendentes desaparecidos e cuja morte viria a confirmar-se - aumentava a angústia de familiares e amigos que na manhã seguinte voaram para a Tailândia para procurar os seus familiares e conhecidos.
Paulo, Zora e Gil acabariam por conseguir avisar familiares e amigos de que estavam bem, embora internados num hospital de Khao Lak devido aos ferimentos que sofreram enquanto eram arrastados pelas ondas.
Depois da tragédia provocada pelo sismo e pelas ondas gigantes, o dia 26 de Dezembro de 2004 deu início a um outro processo não menos angustiante: procurar os familiares e amigos ainda não localizados.
As horas e os dias passavam e foram feitas críticas aos funcionários da embaixada de Portugal pelo alegadamente pouco apoio prestado a vítimas e seus familiares.
O embaixador, de férias em Lisboa, chegava ao local da tragédia cinco dias depois e justificava a ausência com reuniões importantes no Palácio das Necessidades e com as férias que estava a gozar junto da sua família.
Em contraponto, as autoridades de Macau responderam de imediato e sabendo da existência de residentes da Região Administrativa Especial em várias estâncias de férias em regiões afectadas criaram um gabinete de apoio em Banguecoque que se responsabilizava pela ajuda e acompanhamento dos locais, que viria a apurar-se serem maioritariamente portugueses.
Familiares e amigos das vítimas permaneceram por vários dias na Tailândia até que as buscas, infrutíferas, obrigaram a um regresso a casa. Os meses seguintes foram passados em contactos com as autoridades tailandesas e em viagens de pesquisa à Tailândia onde as cinzas dos cinco portugueses e três luso-descendentes acabariam por ser identificados e transladados para Macau e Portugal.
A paisagem atingida pelas águas estava completamente desfigurada com barcos de pesca e até embarcações militares a fazer parte do cenário de terra firme, enquanto noutras zonas, onde antes da chegada das ondas era possível vislumbrar uma paisagem verde e densa, apenas se podia reconhecer o castanho da terra e amontoados de destroços.
Na praia de Patong, na ilha de Phuket, quatro dias após a tragédia, a areia arrastada pelos maremotos era devolvida ao seu local de origem por pessoas que actuavam com cuidados redobrados devido à possibilidade de serem encontrados corpos, enquanto alguns empregados dos hotéis junto à costa ocupavam as poucas zonas livres nas entradas dos edifícios em movimentos descoordenados de quem não sabia muito bem por onde começar a limpar.
Os jardins e as piscinas dos hotéis estavam cheios de móveis partidos, malas, roupas, televisões e brinquedos que tornavam claro terem estado muitas crianças na região afectada pelos tsunamis.
Apanhado de surpresa, quem estava na praia e nas zonas costeiras teve poucas possibilidades de fuga mas os relatos dos acontecimentos daquelas horas deram também conta de uma pequena britânica que, ensinada pelo professor, deu o alerta e salvou centenas de pessoas.
Tilly, a pequena inglesa de 10 anos que acabaria baptizada como o "Anjo da praia" pelo jornal Sun, estava em Phuket quando viu o mar recuar rapidamente e, recordando-se de uma aula de geografia em se tinha falado de sismos no mar e da formação de tsunamis, alertou a mãe, que lançou o aviso e salvou vidas.
Sem o paraíso de férias para oferecer, os tailandeses mobilizaram-se e organizaram centros de apoio de acesso a bases de dados com informações das vítimas e prestaram todo o tipo de auxílio possível.
Um ano depois do sismo, as autoridades tailandesas vão realizar um conjunto de homenagens aos mortos nos maremotos em cerimónias onde vão estar presentes familiares e amigos das vítimas e pessoas que então se encontravam nos locais atingidos.
Com milhões de dólares de prejuízos, com uma economia baseada no turismo fortemente afectada, a reconstrução continua, embora na zona de Khao Lak, a mais seriamente atingida, os efeitos da ajuda internacional ainda não sejam muito visíveis.
Mesmo assim, centenas de pessoas, incluindo turistas portugueses residentes em Macau, regressaram este ano à Tailândia como forma de contribuírem para a revitalização do turismo no país.