Ucrânia. Negociada a saída de cereais do país

por Mário Aleixo c/agências
Os cereais continuam a não poder sair da Ucrânia Valentyn Ogirenko-Reuters

A saída de cereais ucranianos do país está a ser negociada desde quinta-feira em Moscovo, por Martin Griffiths, responsável pela ajuda humanitária das Nações Unidas. O objetivo é a abertura de uma passagem marítima nos portos do mar negro.

A Ucrânia era antes da guerra um dos maiores exportadores mundiais de cereais e fertilizantes agrícolas e os seus bens eram cruciais para a segurança alimentar de áreas como o Médio Oriente e o norte de África.

A maioria dos bens alimentares ucranianos eram expedidos da antiga república soviética para o resto do mundo através dos portos do Mar Negro.

Na semana passada, o primeiro-ministro italiano, Mario Draghi, telefonou ao presidente russo, Vladimir Putin, para pedir o desbloqueio das exportações de cereais da Ucrânia, provenientes dos portos do Mar Negro e também do Mar de Azov, como Mariupol, agora invadido pelas tropas russas.

Também o ministro dos Negócios Estrangeiros russo, Serguei Lavrov, anunciou já que os presidentes russo e turco acordaram que a Turquia ajudará nas operações de desminagem dos portos da Ucrânia para permitir a exportação de cereais do país.

Reflexões pertinentes

A invasão russa da Ucrânia está a comprometer as exportações de um dos principais vendedores de cereais e complicar a vida a numerosos países importadores, alertou o dirigente de um clube de reflexão sobre agricultura.

O alerta foi feito, à AFP, durante uma mini-entrevista, por Sébastien Abis, diretor-geral do Demeter, investigador associado do Instituto de Relações Estratégicas e Internacionais (IRIS) e autor da obra “Géopolitique du blé” (Geopolítica do Trigo).

Questionado se a invasão russa pode comprometer a segurança alimentar mundial, Abis salientou que “os primeiros afetados são os ucranianos”, uma vez que “qualquer teatro de guerra tem consequências imediatas para a vida quotidiana”.

Depois, “importa lembrar que a Ucrânia é uma grande potência produtora de trigo, milho, girassol, também um pouco de soja, muita colza, cevada,… As suas produções alimentam o mercado mundial porque a Ucrânia tem necessidades internas limitadas, portanto tem volumes importantes para exportar”.

Por exemplo, “a Ucrânia é 12% das exportações mundiais de trigo, quase 20% de milho, 20% em colza. Em girassol é metade da exportação mundial! Portanto, tudo isto vai acrescentar nervosismo, mesmo muito nervosismo, nos mercados agrícolas”.

Esta crise acontece “quando os preços já estavam extremamente elevados, devido à volatilidade dos últimos meses” e antecipou que vai haver impactos sobre os preços médios, porque não há muitas alternativas em termos de origem, pelo que muitos países importadores vão ficar fragilizados”.

Abis admitiu que esta fragilidade signifique penúrias nos países importadores: “Será que os volumes ucranianos que estavam por exportar de milho e trigo vão poder sair? Em trigo trata-se de nove milhões de toneladas e em milho seis milhões a sete milhões”.

Ora, prosseguiu, “se os portos estão destruídos, se a circulação, o transporte logístico não está autorizado, pode haver quebras. Tudo isto vai evidentemente ter um impacto sobre a estabilidade dos aprovisionamentos agrícolas mundiais, os preços”.

Por outro lado, avisou, “não se podem esquecer os fertilizantes, porque a Rússia produz muito amoníaco e ureia, tal como a Ucrânia”. Ora, como os preços destes produtos “já estão muito elevados”, Abis antecipou a existência de “consequências não negligenciáveis nos custos destes fatores de produção indispensáveis à atividade agrícola”.

Por fim, sintetizou, trata-se de saber “até onde é que os países vão poder pagar muito cara uma alimentação que já é cara”.







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