Um ano sem liberdade para 219 jovens raptadas na Nigéria

Marchas, orações e vigílias são a forma de a Nigéria e o mundo lembrarem o rapto das jovens de Chibok, no nordeste da Nigéria, há exatamente um ano. Doze meses de agonia para as famílias. Um ano de campanha internacional sem resultados assinaláveis.

Ana Sofia Rodrigues, RTP /
Rachel Daniel segura a fotografia da filha raptada pelo Boko Haram, Rose Daniel, de 17 anos - maio de 2014 Joe Penney, Reuters

Na capital da Nigéria, Abuja, uma procissão junta 219 raparigas. Cada uma representa uma das jovens raptadas há um ano de uma escola de Chibok. A 14 de abril de 2014, o grupo extremista islâmico Boko Haram raptou 276 raparigas. Cinquenta e sete conseguiram escapar; 219 continuam desaparecidas.


No Twitter, os responsáveis pela campanha pedem que se use uma peça de roupa vermelha, em homenagem às raptadas. Em Nova Iorque, o Empire State Building deverá também ter uma faixa vermelha, em solidariedade.

Um rapto que suscitou reações por todo o mundo. As Nações Unidas e organizações de defesa dos Direitos Humanos denunciaram a situação. A campanha Bring Back Our Girls não baixou os braços. Estados Unidos e China prometeram ajuda. O recém-eleito presidente nigeriano tornou o caso prioridade. A primeira-dama norte-americana, Michelle Obama, e a Prémio Nobel da Paz Malala Yousafzai deram a cara pela luta. Mas as meninas continuam desaparecidas.


O caso suscitou uma emoção sem precedentes. Está, porém, longe de ser o único crime do género perpetrado pelo Boko Haram. A Amnistia Internacional adianta que duas mil mulheres e meninas foram raptadas na Nigéria desde o início do ano passado.
Reportagem de 5 de maio de 2014

O Boko Haram anunciou primeiro que ia vender as meninas. O chefe do grupo extremista, Abubakar Shekau, garantia que as converteu ao Islão e que tinham sido forçadas a casar. O Exército nigeriano afirmou no passado que sabia onde estavam as estudantes, mas que uma operação de resgate seria muito arriscada.

Um novo relatório da Amnistia Internacional, citado pela France Presse, revela que as jovens raptadas estão distribuídas por vários campos do Boko Haram, na Nigéria e em países vizinhos, o Chade e os Camarões.
“Temos de fazer mais”
Numa carta aberta divulgada esta segunda-feira, a Nobel da Paz critica as autoridades nigerianas, sobretudo o anterior Presidente Goodluck Jonathan, e os líderes mundiais por não fazerem o suficiente para libertar as raptadas.

“Na minha opinião, os líderes nigerianos e a comunidade internacional não fizeram o suficiente para vos ajudar”, lê-se na carta endereçada às adolescentes. Malala, de 17 anos, é incisiva: “Eles têm de fazer mais para assegurar a vossa libertação. (…) Até lá, permaneçam fortes e não percam a esperança. Vocês são as minhas heroínas”.

O recém-eleito Presidente da Nigéria, Muhammadu Buhari, disse esta terça-feira que não pode prometer o resgate das 219 raparigas. “Não sabemos se as raparigas de Chibok podem ser resgatadas. O seu paradeiro permanece desconhecido. Gostaria muito de o fazer, mas não posso prometer que as vamos encontrar", afirmou o Chefe de Estado em comunicado.

"Mas eu digo a todos os pais, familiares e amigos das crianças que o meu Governo vai fazer tudo o que estiver ao seu alcance para as trazer de volta a casa", acrescentou.
Raparigas que fugiram “não foram abaladas”
Entre as 57 raparigas que conseguiram escapar ao cativeiro do Boko Haram, 21 estão agora a estudar na Universidade Americana da Nigéria (AUN), em Yola.
Malala Yousafzai estabeleceu entretanto um fundo que pretende assegurar que as raparigas de Chibok possam continuar a sua educação. Logo que sejam libertadas.


Deborah é uma dessas raparigas. Em mails trocados com a France Presse, confessou que o sonho é trabalhar nas Nações Unidas para “ajudar a (...) comunidade em Chibok, ajudar a Nigéria”.

Sarah, por sua vez, garante: “Não fomos abaladas pelo ataque. Vemo-nos como as pessoas que foram escolhidas para fazer mudanças positivas no futuro. Não apenas em Chibok. (…) Foi uma viagem horrível, mas acreditamos que estudar na AUN tem um objetivo”.Impacto devastador para as crianças
A propósito da data em que se recorda o rapto de Chhibok, a UNICEF divulgou ontem um relatório em que avança que 800 mil crianças são forçadas a fugir de casa devido ao conflito que envolve o Boko Haram, exército e milícias.

“Muitas raparigas e rapazes desapareceram na Nigéria - raptados, recrutados por grupos armados, atacados, usados como armas ou forçados a fugir à violência. Eles têm o direito de ter as suas infâncias de volta”, afirma Manuel Fontaine, o diretor regional da UNICEF para a África Ocidental e Central.

À ABC News, um investigador da Amnistia Internacional revela que centenas de raparigas que são raptadas são treinadas no uso de armas e explosivos para fazer parte de ataques às suas próprias aldeias. Daniel Eyre reforça que as crianças estão a ser usadas como uma das principais armas.
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