Vaticano envia cardeal para Guam para investigar denúncias de abusos sexuais

por Lusa

Cidade do Vaticano, 16 fev (Lusa) -- O Vaticano enviou o cardeal norte-americano ultraconservador Raymond Burke para a ilha de Guam, no Pacífico, para investigar um importante caso de alegados abusos sexuais praticado por membros do clero.

A Congregação para a Doutrina da Fé nomeou, em outubro último, Raymond Burke como juiz presidente do julgamento do seu arcebispo de Guam Anthony Apuron, alvo de múltiplas denúncias de abuso sexual de jovens na década de 1970, indicou na quarta-feira o gabinete de imprensa do Vaticano.

Anthony Apuron negou as alegações e não foi criminalmente acusado.

Burke deve entrevistar durante o dia de hoje um antigo acólito em Guam que afirma que foi alvo de abusos sexuais por parte de Apuron, segundo o jornal Pacific Daily News.

Este tipo de missões não são incomuns para os cardeais, sendo as entrevistas com as testemunhas uma parte fundamental de qualquer julgamento canónico.

Sobreviventes de abusos perpetrados pelo clero têm, contudo, criticado o historial de Burke pela forma como lidou com casos de padres enquanto arcebispo nos Estados Unidos.

Burke afirmou que cada ato de abuso por parte do clero é um "mal grave", mas também culpou o clero homossexual pela crise de abusos sexuais que a Igreja enfrenta, afirmando que os sacerdotes "que eram efeminados" foram os que molestaram crianças.

"Burke não tem sido aberto relativamente ao abuso do clero no passado", defendeu Terence McKiernan, presidente da BishopAccountability.org, uma plataforma `online` com dados sobre abusos sexuais cometidos por padres.

McKiernan, citado pela agência Associated Press, afirmou que Burke falhou em divulgar as listas de padres acusados quando esteve à frente de duas dioceses norte-americanas, e publicou dados de uma que pareciam subestimar o problema, além de que se mostrou, na perspetiva do mesmo responsável, relutante em indemnizar as vítimas ou facultar-lhes apoio.

Burke é uma proeminente figura conservadora que tem sido franco nas críticas aos esforços de Francisco para reformar o ensino da Igreja sobre questões relacionadas com a família, casamento e divórcio.

O cardeal atuou como ligação do Vaticano com a Ordem de Malta, desde que foi marginalizado de papéis mais importantes pelo papa Francisco em 2014, mas o papa Francisco afastou-o recentemente dessa posição depois de ter estado envolvido na problemática saída de um membro da Ordem de Malta.

A crise foi desencadeada pela distribuição de preservativos, banidos pela Igreja Católica, como todos os contracetivos, pelos dispensários da Ordem de Malta no Sudão do Sul, Quénia e Birmânia (Myanmar).

Este caso levou ao afastamento, no início de dezembro, do "número três" e grão-chanceler da Ordem de Malta, o alemão Albrecht Freiherr von Boeselager.

Em dezembro, o papa Francisco nomeou uma equipa de cinco membros para examinar as circunstâncias em que o número três da Ordem foi forçado a demitir-se.

A Ordem, um corpo de caridade ligado à Igreja, descendente dos cavaleiros das cruzadas da Idade Média, recusou-se a cooperar, argumentando que a demissão, em dezembro, do grande chanceler Albrecht von Boeselager, foi um caso interno.

A demissão foi, contudo, vista como sendo o resultado de Von Boeselager ser demasiado liberal para o gosto de Raymond Burke.

O grão-mestre da Ordem Soberana e Militar de Malta, Frei Matthew Festing, pediu, no final de janeiro, a demissão a pedido do papa Francisco, acabando com meses de uma disputa entre a instituição e o Vaticano relacionada com o uso de preservativos, que se transformou num teste à autoridade do papa reformador sobre os conservadores da Igreja católica.

A disputa pública e sem precedentes entre o Vaticano e os Cavaleiros de Malta foi vista pelos observadores da Santa Sé como uma guerra entre os liberais e conservadores da Igreja.

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