Vaticínio em livro desafia Pequim. Novo Dalai Lama "nascerá no mundo livre"

O Dalai Lama escreve, pela primeira vez, que o seu sucessor nascerá no "mundo livre", referindo um local fora da China. Aponta mesmo que poderá reencarnar fora do Tibete, possivelmente na Índia, onde vive no exílio. No livro "Voice for the Voiceless", lançado esta terça-feira, o 14.º Dalai Lama detalha as relações com líderes chineses ao longo de sete décadas.

Carla Quirino - RTP /
Reuters

O titulo completo é “Voz para quem não tem voz: mais de sete décadas de luta com a China para a minha terra e o meu povo” (Voice for the Voiceless: Over Seven Decades of Struggle with China for My Land and My People). É o mais recente livro do 14.º Dalai Lama, lançado esta terça-feira.

Sendo Dalai Lama o título de uma linhagem de líderes religiosos da escola Gelug do budismo tibetano, o atual chama-se Tenzin Gyatso.

Nesta obra, o autor oferece reflexões pessoais, espirituais e históricas. Trata-se da história completa da luta com a China para salvar o Tibete e o seu povo.Quase 75 anos após a invasão do Tibete pela China, o Dalai Lama lembra o mundo da luta não resolvida pela liberdade e as dificuldades que os tibetanos continuam a enfrentar.

Com 89 anos, Tenzin Gyatso escreve sobre a jornada de vida - descobrir o que significa perder a casa para um invasor repressivo e construir uma vida no exílio.

O líder espiritual do budismo tibetano aponta ainda a possibilidade de o sucessor ser escolhido fora da região, deixando antever um conflito com a China.
Sucessor reecarnará no "mundo livre"
A história da soberania do Tibete tem  alternado entre a independência e o controlo chinês, ao longo de séculos. Atualmente, a China considera a região como parte integrante do país e rotulou o atual Dalai Lama como um “separatista”, insistindo no direito de nomear o sucessor após a sua morte.

O 14.º líder espiritual do Tibete foi identificado como a reencarnação do seu antecessor aos dois anos de idade e, seguindo o preceito, o atual deverá indicar o 15.º.

No novo livro, Dalai Lama deixou claro que o sucessor nascerá fora da China.

“Uma vez que o propósito de uma reencarnação é continuar o trabalho do antecessor, o novo Dalai Lama nascerá no mundo livre para que a missão tradicional do Dalai Lama – isto é, seja a voz da compaixão universal, o líder espiritual do budismo tibetano e o símbolo do Tibete incorporando as aspirações do povo tibetano – continuará”, escreve o Dalai Lama, que fugiu do Tibete para a Índia em 1959.


"Voz para quem não tem voz: mais de sete décadas de luta com a China para a minha terra e o meu povo”, o novo livro de Dalai Lama | Reuters

Embora o líder tibetano tenha dito que esta linhagem poderia terminar com a sua morte, agora escreve que os tibetanos em todo o mundo querem que a instituição do Dalai Lama continue.

Acrescenta que recebeu inúmeras petições de pessoas dentro e fora do Tibete a pedir-lhe que garanta a escolha de um novo líder e diz que as aspirações do povo tibetano por liberdade não podem ser negadas indefinidamente.

“Uma lição clara que conhecemos da história é esta: se se mantiver as pessoas permanentemente infelizes, não pode haver uma sociedade estável”, sublinha.

O Dalai Lama deixou o cargo de líder político do Governo tibetano no exílio em 2011 para se concentrar no papel espiritual. O autor negou defender a independência tibetana e defendeu uma abordagem de “Meio Caminho”, o que concederia maior autonomia ao território principalmente budista.

O 14.º líder budista tinha 16 anos quando a China comunista invadiu o Tibete, em 1950, e com apenas 19 teve o primeiro encontro com o presidente Mao em Pequim. Aos 25 anos foi forçado a fugir para a Índia e acabou por se tornar um líder no exílio. Nas décadas seguintes, enfrentou os líderes comunistas da China – Mao Tsé-tung, Deng Xiaoping, Jiang Zemin, Hu Jintao e o atual presidente, Xi Jinping.
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