Viúva de Piergiorgio Welby justifica morte assistida do marido
A viúva de Piergiorgio Welby, Mina, justificou hoje em Roma a morte provocada do seu marido, um doente incurável e imobilizado no leito cujo respirador foi desligado por um médico, originando uma viva polémica em Itália.
"No fim, Piergiorgio já não podia mais. Dizia-me `basta!, basta!`", declarou Mina Welby, 69 anos, com os olhos em lágrimas, durante uma conferência de imprensa organizada pelo Partido Radical (libertário e laico), membro da coligação de centro-esquerda no poder.
"Ele tinha medo de morrer asfixiado, tinha medo de já não poder engolir. Tinha que lhe preparar os alimentos cada vez mais líquidos", acrescentou, descrevendo os "últimos tempos terríveis" do marido, que completaria 61 anos a 26 de Dezembro.
Mantido vivo por um respirador artificial desde 1997 devido a uma distrofia muscular diagnosticada pelos médicos quando tinha 18 anos, Welby viu o seu estado de saúde degradar-se este Verão e não conseguia "sequer ficar sentado mais de uma hora por dia", adiantou a viúva.
Ajudado pelo Partido Radical, que defende uma despenalização da eutanásia, Piergiorgio Welby comoveu o país ao reclamar o direito a morrer numa carta aberta ao presidente da República, Giorgio Napolitano.
A sua morte, provocada quarta-feira à noite por um médico que desligou o respirador artificial, desencadeou uma violenta polémica política num país onde a eutanásia é punida com seis a 15 anos de prisão.
Numerosos responsáveis de direitos, mas também da ala católica do centro-esquerda, acusaram o Partido Radical de ter instrumentalizado o "caso Welby". Um deputado da União Democrata- Cristã (UDC, centro-direita), Luca Volontè, exigiu que "os culpados deste homicídio sejam presos".
"Nenhuma lei poderá jamais legitimar um acto de eutanásia, e foi disso que se tratou, não se pode escondê-lo", disse por seu turno a ministra da Família, Rosy Bindi, membro da Margarida (centro- esquerda, próxima dos católicos).
"Os que nos acusam de instrumentalização sempre consideraram as nossas batalhas instrumentais", retorquiu Marco Pannella, líder dos Radicais, um pequeno movimento conhecido em Itália pode ter travado os combates pelo direito ao aborto e ao divórcio nos anos 1970-1980.
Os Radicais e os seus advogados repetiram hoje que o acto de desligar o respirador de Welby, colocando-o sob o efeito de sedativos para que não sofresse, tinha "todas as características da legalidade".
O Ministério Público de Roma abriu um processo para apurar as "causas da morte de Welby" e deverá ser hoje praticada uma autópsia do corpo.
Entretanto, a paróquia de Roma, onde residia Welby, anunciou hoje a sua recusa de celebrar o funeral, devido ao eco mediático suscitado pelo caso.
"O padre da paróquia disse a Mina Welby ter recebido instruções do vicariato para suspender os preparativos para o funeral, devido ao eco mediático deste caso", declarou Rocco Berardo, secretário adjunto da associação Luca Coscioni, de que Piergiorgio Welby era vice-presidente.
Um dos combates desta associação é o direito à eutanásia.
"A paróquia de São João Bosco propôs antes a celebração de uma missa em memória de Piergiorgio", prosseguiu Berardo.
Mina e Carla, irmã de Welby, estão "convencidas" de que esta recusa foi provocada pelo desejo de Piergiorgio Welby de fazer respeitar o seu direito a morrer, contrariamente aos ensinamentos da igreja católica, segundo a cadeia de televisão Sky TG24.
De acordo com o diário Libero (direita), o corpo de Welby foi abençoado hoje de manhã por um sacerdote da paróquia.