O agravamento dos resultados dos alunos portugueses na prova de Leitura do PISA não surpreendeu os professores, que destacam também o desempenho dos que nunca chumbaram por estarem "ao nível dos melhores países do mundo".
Os resultados do Programa Internacional de Avaliação de Alunos (PISA), que em 2022 analisou os conhecimentos a Matemática, Leitura e Ciência de cerca de 690 mil alunos de 15 anos de 81 países e economias, revelou uma "quebra sem precedentes" nas capacidades dos alunos, em que Portugal não foi exceção.
Na prova de Leitura, os cerca de sete mil estudantes de escolas portuguesas obtiveram 477 pontos (numa escala de zero a mil), o que representa uma descida de 15,2 pontos em relação a 2018.
Em declarações à Lusa, o vice-presidente da Associação de Professores de Português (APP), João Pedro Aido, admitiu que esta descida "era, de alguma maneira, previsível", até porque acompanha a tendência registada na grande maioria dos países que participaram no PISA.
"Desde 2000 que os resultados dos países têm vindo, genericamente, sempre a baixar", recordou, sublinhando que Portugal esteve em contraciclo até 2015, com os alunos a superarem sempre os resultados obtidos anteriormente.
Em 2015, Portugal começou uma inversão da trajetória, passando a acompanhar a tendência internacional de agravamento das médias.
Além do impacto da pandemia de covid-19 nas aprendizagens, existem outros indicadores que a APP gostaria que fossem mais explorados e que poderão mostrar um caminho para um ensino de maior qualidade.
João Pedro Aido apontou os efeitos das retenções, as discrepâncias regionais e o estatuto socioeconómico das famílias.
Entre os portugueses que participaram no PISA, 20% eram repetentes e tiveram mais dificuldades nas provas: A média dos alunos com uma retenção foi 92 pontos abaixo da dos colegas que nunca chumbaram, salientou o professor.
Já "os estudantes sem retenções tiveram um desempenho em Leitura ao nível dos melhores países do mundo", sublinhou, lembrando que tiveram uma média superior a 500 pontos, ou seja, perto dos 543 pontos obtidos pelos melhores do mundo, os alunos de Singapura.
Perante esta diferença, o professor alertou para o perigo de se fazerem leituras simplistas: "A resposta não pode ser não haver retenção", defendeu, considerando que seria uma "desonestidade intelectual completa".
"As escolas não sabem muito bem o que fazer nem que estratégias aplicar com os estudantes que tem alguma retenção", lamentou.
Para João Pedro Aido é também preciso olhar para as "enormes discrepâncias regionais", porque "há escolas a trabalhar muito melhor do que outras".
Desde o norte até à zona de Lisboa, os alunos conseguiram, em media, ter um bom desempenho, já os estudantes das escolas alentejanas e algarvias tiveram mais dificuldades (a média foi -4 e -20 pontos do que a media nacional, respetivamente).
As escolas açorianas destacam-se pela negativa com 64 pontos abaixo da média nacional.
"Há aqui um trabalho que pode ser feito para perceber o que se passa, porque as escolas não reagem da mesma maneira", salientou.
Outra das condições que afetam o sucesso académico é a situação socioeconómica das famílias: Entre os alunos de famílias mais favorecidas, apenas 9% tiveram um desempenho fraco na prova, mas entre os mais desfavorecidos a percentagem disparou para 37%.
Entre os problemas já identificados, o professor lembra que mais de metade dos alunos portugueses vem de famílias que têm uma relação distante com a leitura, segundo um estudo da Fundação Calouste Gulbenkian, que revelou que apenas um em cada três adultos tinha lido um livro no ano anterior.
Além disso, há um "certo distanciamento dos alunos com as bibliotecas escolares" e um em cada três estudantes do 1.º ao 12.º "nunca ou raramente leram um livro".
João Pedro Aido reconhece que "trazer para a leitura um aluno que nunca lê é um desafio".
Baseado num outro estudo, lembra que existe uma "baixa exposição a atividades de leitura e escrita nas aulas de Português", mas que quando os alunos são expostos a essas atividades acabam por melhorar os seus resultados.
O vice-presidente da associação defendeu que "o mais importante é o trabalho que o professor faz na sala de aula com os seus alunos", mas é preciso dar as melhores ferramentas a quem quer ensinar.
Mais professores, mais estabilidade e mais qualidade dos professores são outras das condições necessárias para o sucesso.