Autarcas de Gondomar aplaudem decisão do tribunal de aprofundar análise às águas

por Lusa

Os autarcas de Gondomar e de São Pedro da Cova, freguesia onde foram depositados resíduos industriais, aplaudiram hoje a decisão do tribunal que ordenou a realização de análises às águas, num raio de 1,5 quilómetros em torno do depósito.

"Há muitos anos que a junta pede esta perícia alargada. Temos receios e dúvidas quanto à contaminação dos lençóis freáticos em São Pedro da Cova. Tememos pela saúde da população. Consideramos que as perícias e análises à perigosidade dos resíduos nunca foram feitas de forma profunda para se perceber se há contaminação ou para, em contraponto, esta deixar de ser uma preocupação", disse à agência Lusa o presidente da União de Freguesias Fânzeres/São Pedro da Cova, Pedro Vieira, eleito pela CDU.

Já o presidente da câmara, o socialista, Marco Martins, também em declarações à Lusa, disse "não ver mal nenhum" nesta decisão, pois, disse, "ajuda a população a tranquilizar-se e o processo fica cada vez mais transparente".

"Temos estado muito atentos a esta matéria e já desde 2014, em conjunto com a APA [Agência Portuguesa do Ambiente], acompanhamos análises no local que foram feitas através de piezómetros, numa profundidade de cerca de 200 metros. Felizmente todos esses resultados têm sido bons e não têm gerado preocupações, mas não vemos mal nenhum [na nova análise determinada pelo tribunal] que ajudará a população e as autoridades a sentirem-se mais seguras", referiu Marco Martins.

O Tribunal de São João Novo, no Porto, determinou a realização de análises às águas de São Pedro da Cova, Gondomar, estudo que inclui um raio de 1,5 quilómetros em torno do local onde foram depositados resíduos perigosos.

De acordo com um despacho datado de sexta-feira e ao qual a Lusa teve hoje acesso, o tribunal vai ao encontro das solicitações do Ministério Público (MP) e da junta de freguesia local que têm vindo a exigir uma nova perícia aos terrenos de forma a apurar se o depósito de resíduos industriais, numa situação que remonta a 2001/2002, pode provocar "dano na saúde e na vida das pessoas".

O mesmo despacho remete para outro documento, a "Proposta de Metodologia para a estimativa do risco resultante da exposição a águas subterrâneas em S. Pedro da Cova" elaborada pela Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto (FEUP) elaborada por solicitação do Tribunal Judicial da Comarca do Porto, sendo que a metodologia prevista nessa proposta aponta para "um raio de cerca de 1,5 quilómetros em torno do armazenamento dos resíduos".

"A metodologia a utilizar será a seguinte: fazer uma inventariação, total ou parcial, com o apoio da junta de freguesia, dos poços e/ou captações existentes na vizinhança, a cota inferior à do aterro, num semicírculo com um raio de cerca de 1,5 quilómetros em torno do armazenamento dos resíduos" - lê-se na proposta.

Várias fontes ligadas ao processo confirmaram hoje à agência Lusa que esta é a primeira vez que as análises às águas daquela freguesia de Gondomar, no distrito do Porto, são feitas com este raio de intervenção.

A metodologia descrita na proposta da FEUP também inclui identificar as coordenadas geográficas lidas com um GPS de precisão, identificar o local do poço através do endereço ou do proprietário do terreno e medir a profundidade a que se encontra a água;

"Efetuar as seguintes medidas `in-situ` quando possível: alcalinidade, pH, potencial redox, condutividade e oxigénio dissolvido", "obter amostras de água em condições de conservação e enviar para laboratório reconhecido", bem como "análise pelo laboratório acreditado dos parâmetros químicos anteriormente referidos" - são outros dos aspetos da metodologia.

Na proposta está ainda especificado que o prazo de execução deste estudo é o mês de março de 2021, sendo que hoje, Pedro Vieira contou à Lusa que acompanhou já peritos ao local, os quais lhe transmitiram que vão recolher amostras de água em setembro.

"Vieram sondar o local e conhecer o terreno e agora percebe-se porquê. Ainda bem. A Junta congratula-se com esta medida do tribunal. As análises foram sempre feitas pela superfície e pela rama. Agora, a decisão de se fazer um aprofundamento geográfico vem provar que é necessário mais rigor científico em todo este processo", disse o autarca da junta de São Pedro da Cova.

No dia 26 de maio, a Lusa noticiou que MP pediu que os peritos ouvidos sobre o depósito de resíduos industriais em São Pedro da Cova prestassem mais esclarecimentos para apurar se existe "dano na saúde e na vida das pessoas".

Essa exigência surgiu depois de, a 20 de maio, peritos ouvidos num tribunal do Porto terem respondido com interrogações a perguntas sobre os danos concretos que os resíduos industriais.

Os resíduos "representam sempre um perigo para a saúde, por causa do chumbo. Se efetivamente causaram dano, não sei", disse o perito António Fiúza, um professor da FEUP, em resposta a perguntas do MP junto do tribunal criminal de São João Novo, no Porto.

Seis pessoas foram absolvidas, em abril de 2019 da acusação do crime de poluição com perigo comum, alegadamente cometido nos anos de 2001 e 2002 com a deposição de resíduos perigosos em escombreiras de São Pedro da Cova, mas o Tribunal da Relação do Porto ordenou a reabertura do julgamento para "tomar esclarecimentos aos peritos".

Para esses esclarecimentos foram chamados a tribunal especialistas da Direção-Geral da Saúde e APA, além do perito da FEUP.

"Só através da nossa insistência e do recurso e do MP é que isto foi possível. A Junta, como assistente do processo, nunca desistiu. A reabertura do processo veio de encontro as nossas ambições e agora esta decisão também", acrescentou hoje Pedro Vieira.

Em causa está a deposição de resíduos provenientes da Siderurgia Nacional que começaram a ser removidos entre outubro de 2014 e maio de 2015, quando foram retiradas 105.600 toneladas, faltando ainda cerca de 125 mil toneladas.

No dia 22 de julho, a Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Norte, num esclarecimento enviado à Lusa, revelou que a segunda fase de remoção dos resíduos perigosos avança este mês e deverá demorar um ano, isto depois de na manhã desse dia a Câmara de Gondomar, liderada pelo socialista Marco Martins, ter tomado posse dos terrenos.

Questionados sobre se temem que as novas perícias possam atrasar o processo de remoção, cujo início está previsto para este mês, quer Pedro Viera, quer Marco Martins apontaram que não.

"Em princípio não afeta a remoção dos resíduos. Aliás as informações que se mantém a expectativa de que tido arranque este mês. Estão a preparar tudo no terreno já", contou o presidente da câmara de Gondomar.

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