Barreiro Antigo está cada vez mais velho
O Barreiro tem poucas razões para celebrar na terça-feira o Dia Nacional dos Centros Históricos, a zona antiga da cidade, habitada maioritariamente por idosos, caiu no abandono: as ruas, de dia, estão desertas e as casas muito degradadas.
São escassos os imóveis recuperados pelos proprietários, como também são poucos os estabelecimentos comerciais alternativos às dezenas de bares e discotecas que se fixaram nas décadas de 1980 e 90.
A Rua Aguiar, que até aos anos 50 foi a mais concorrida da cidade em lojas, perdeu fregueses e habitantes.
Ali, como em outras ruas do centro histórico, só as casas de diversão nocturna é que trazem enchentes de jovens, ruidosos, ao local.
Um diagnóstico efectuado há cerca de quatro anos pela Direcção- Geral de Edifícios e Monumentos Nacionais (DGEMN) já alertava que o Barreiro Antigo, que ainda possui vestígios de arquitectura medieval, pombalina e republicana, tinha habitações degradadas, abandonadas ou descaracterizadas por alterações no revestimento exterior tradicional, na volumetria e na caixilharia de portas e janelas.
De acordo com o inventário da DGEMN sobre o património arquitectónico do núcleo histórico, a maioria dos edifícios (63 por cento) encontrava-se em mau estado de conservação.
Olga Costa Mano, 79 anos, moradora na zona desde que nasceu, assiste "com tristeza" à "degradação" do local que, diz, "se tem agravado de ano para ano".
"Os proprietários - pessoas idosas ou herdeiros de famílias muito antigas - não têm dinheiro para recuperar as casas", lamenta, ironizando que o centro histórico do Barreiro "está a transformar-se num lugar de casas emparedadas e bares".
"Durante o dia quase não se vê ninguém na rua. às sextas e sábados à noite anda a rapaziada nova dos bares", acrescenta, por seu turno, António Parente, 62 anos, que explora há 16 um minimercado onde se vende de tudo um pouco.
O comerciante conta que a maioria dos moradores são "pessoas de idade que pagam pouca renda" e que, quando vagam as habitações, os proprietários "fecham os edifícios" para evitar a entrada de inquilinos indesejados.
António Parente crê que, se houvesse mais comércio, este "traria mais gente" ao Barreiro Velho, que "a coisa mais bonita que tem é a frente de rio".
O comerciante é da opinião que a Câmara deveria ter dado mais atenção ao local.
Raul Malacão, presidente da Junta de Freguesia do Barreiro, reconhece que a autarquia, ao longo de sucessivos anos, poderia ter actuado com maior veemência.
"Mas não se caminhou para isso por falta de recursos financeiros", sustenta.
O autarca do PCP considera que "há uma certa impotência" do município para renovar o património imóvel do centro histórico, uma vez que, além da recorrente falta de verbas, é confrontado com o facto de a esmagadora maioria dos edifícios ser propriedade privada.
Beneficiando do estatuto de Área Crítica desde meados dos anos 90, o Barreiro Antigo tem sido alvo de poucas obras de vulto por parte de particulares e autarquia.
O ex-executivo camarário liderado pelo comunista Pedro Canário, que defendia que deviam ser os privados a recuperarem as casas, apenas no seu terceiro mandato (1998-2001) calcetou o Largo Casal e apoiou financeiramente a colectividade "Os Penicheiros" na pintura da fachada da sua sede, um edifício construído em 1926 sob influências do estilo "Arte Nova".
Na altura na oposição, o PS, que contestou a renúncia da autarquia em adquirir 14 imóveis a seu ver de interesse patrimonial, propôs a criação de uma empresa municipal para gerir a reabilitação dos edifícios com vista a readaptá-los a novos usos, como equipamentos sociais, museus ou residências universitárias.
Chegados à liderança do município, em 2002, os socialistas prometeram candidatar o centro histórico do Barreiro ao programa de financiamento de obras de reabilitação urbana PROHABITA, mas o actual executivo comunista, presidido desde Outubro por Carlos Humberto, tem alegado que nada foi feito nesse sentido.
Durante o mandato do socialista Emídio Xavier ainda foram construídos novos balneários públicos, mas uma das suas bandeiras eleitorais, a recuperação do emblemático Clube 22 de Novembro, caiu por terra quando as ruínas do edifício tiveram de ser demolidas por motivos de segurança.
Propriedade municipal, o edifício estilo Art Déco que acolhe a colectividade "O Praiense" continua a aguardar obras de fundo, apesar do seu avançado estado de degradação.
Em declarações à Lusa, o presidente da Câmara, Carlos Humberto, disse que, possivelmente este ano poderá iniciar-se "uma intervenção de consolidação" da sede da colectividade.
Questionado sobre as medidas e prazos previstos para a revitalização do centro histórico do Barreiro, o autarca referiu apenas que "estão a ser estudas outras hipóteses" de financiamento, além de uma "eventual" candidatura ao PROHABITA.
"A Câmara, por si só, não tem condições financeiras para recuperar o Barreiro Velho nem pode intervir na propriedade privada", invocou, manifestando o desejo de ali serem instalados equipamentos para jovens e oficinas de artesãos e artistas plásticos.