Cardeal Patriarca destaca que ateus se estejam a organizar em comunidades como as dos crentes
Lisboa, 05 Jun (Lusa) - O cardeal Patriarca de Lisboa, D. José Policarpo, comentou hoje a criação da Associação Ateísta Portuguesa (AAP), considerando inédito que os ateus em Portugal se estejam a organizar numa comunidade parecida com as comunidades crentes.
"Para mim o que é novo é que o ateísmo, que se afirma como uma filosofia de vida de negação, se transforme em comunidade, ateia, mas parecida com as comunidades crentes", disse hoje aos jornalistas D. José Policarpo.
Considerando o ateísmo um direito, o Cardeal Patriarca admitiu não ter gostado da fundamentação apresentada pelos fundadores da AAP, adiantando que misturam "no mesmo saco" ateísmo e agnosticismo.
Lembrou que o ateísmo é uma atitude conhecida desde o Antigo Testamento e que não é homogénea.
"Os ateus não são todos iguais. Temos desde ateus `graças a Deus` até aos profundamente convictos e penso que - como talvez não haja dois crentes iguais - com os ateus ainda é mais dificil que haja dois iguais. Não é tão fácil como isso", disse.
Confrontado com a posição da Associação Ateísta Portuguesa, que em carta enviada terça-feira à conferência episcopal se insurgiu contra o facto de o Cardeal Patriarca ter considerado o ateísmo o maior drama da humanidade, D. José Policarpo considera que foi mal entendido.
"Se acredito que Deus é essencial na vida do homem, desconhecê-lo é o problema fundamental. Admito que não sintam isso. Se são verdadeiros ateus é normal que não sintam isso", explicou.
Por outro lado, mostrou-se aberto ao diálogo com a nova organização.
"Cá estaremos para dialogar e respeitar, esperando ser respeitados", concluiu.
Perto de uma centena de ateus, agnósticos e cépticos criaram na semana passada a primeira Associação Ateísta Portuguesa (AAP) para divulgar esta "filosofia" de vida e combater a "discriminação e os preconceitos pessoais e sociais" de que dizem ser alvo.
A criação da associação coincide com uma "generalizada ofensiva clerical a que Portugal não ficou imune, apesar de o ateísmo não se definir pela mera oposição à religião e ao dogmatismo, em nome da liberdade, da igualdade e da defesa dos direitos individuais", refere a AAP.
Em declarações à agência Lusa, o presidente da comissão instaladora da AAP, Carlos Esperança, disse que os ateus estão a ser "atacados publicamente, de forma violenta", nomeadamente pela religião católica.
"Foi o Papa Bento XVI e depois o Cardeal Patriarca, D. José Policarpo, que considerou o ateísmo o maior drama da humanidade", sublinhou Carlos Esperança.
Para os ateístas, "o grande drama da humanidade é a fome, a guerra, o analfabetismo e o terrorismo", justificou.
A AAP defende "os interesses comuns a todos os que escolhem viver sem religião, defendendo o direito a essa escolha e a laicidade do Estado, e combatendo a discriminação e os preconceitos pessoais e sociais que possam desencorajar quem quiser libertar-se da religião que a sua tradição lhe impôs", conforme refere o "Manifesto Ateísta" da associação.
CFF
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