clientes obrigados a fumar à chuva e ao frio ameaçam deixar de frequentar cafés
Viana do Castelo, 01 Jan (Lusa) - Manuel Alberto fuma dois maços de tabaco por dia e hoje não escondia a sua "desolação" por não poder acender o cigarro no café que frequenta há largos anos, por causa da nova lei do tabaco.
Num dia chuvoso e muito frio, Manuel Alberto, cliente do Café do Repouso, em Chafé, Viana do Castelo, viu-se obrigado a "matar o vício" no exterior do estabelecimento, apenas protegido da intempérie por um pequeno toldo.
"Costumava estar sempre aqui a jogar às cartas, mas não consigo jogar sem fumar. Por isso, olhe, a partir de agora venho cá, tomo o meu cafezinho e vou-me embora, porque nunca fui homem de estar sem fazer nada", explicou à Lusa Manuel Alberto.
O Café do Repouso cumpriu hoje uma tradição de Ano Novo, que existe desde 1981, disponibilizando comida e bebida de borla para todos quantos ali vão a partir do início da tarde, sejam ou não clientes da casa.
Uma tradição que, como disse o proprietário do café, Miguel Sampaio Lima, poderá estar ameaçada com a entrada em vigor da nova lei do tabaco, já que "se as coisas não mudarem, muita clientela vai fugir e isso poderá significar o fecho das portas" do estabelecimento.
"Tenho cerca de 100 clientes e todos eles são fumadores. Hoje já tive problemas com dois, que teimavam em querer fumar cá dentro e que eu tive que pôr fora da porta. Um deles até parece que ficou amuado. Mas eu não posso arriscar, porque as multas são pesadas", referiu Miguel Lima.
Quem puxar de um cigarro em espaços fechados e fora das zonas previstas para fumadores poderá pagar entre 50 e 750 euros, uma multa que sobe para entre 50 e mil euros para os proprietários de estabelecimentos privados e órgãos directivos dos serviços da Administração Pública.
A lei que hoje entrou em vigor admite, no caso dos estabelecimentos de restauração e cafetaria, a criação de locais próprios para fumadores, desde que a sua área seja superior a 100 metros quadrados e que esses locais não ocupem mais de 30 por cento da área total.
Mesmo assim, têm que ser separados fisicamente e ter extracção de ar própria.
"Como o meu estabelecimento tem 200 metros quadrados, vou ver se consigo criar uma sala de fumadores, mas antes preciso saber que tipo de extractores deve ser usado", disse Miguel Lima, sem poupar críticas à nova lei do tabaco, que considera "muito rígida".
José Filipe é igualmente cliente do Café do Repouso, também fuma dois maços de tabaco por dia e é outro dos que criticam fortemente a nova legislação.
"Em restaurantes, acho muito bem que se proíba o fumo. Agora, em cafés, discotecas e bares, acho uma estupidez. Trabalho em Espanha, em Madrid, e lá também há uma lei destas, mas o que se vê é que se fuma em todo o lado. E acredito que em Portugal vai acabar por acontecer o mesmo, mais dia menos dia", disse José Filipe.
"Tem algum jeito o que se está a passar aqui, por exemplo? Os clientes são todos fumadores, mas quem quiser fumar tem que vir cá para fora, apanhar frio e chuva. É uma perfeita estupidez", acrescentou.
Fumos à parte, a festa de ano novo no Café do Repouso prometia entrar pela noite dentro, tendo Miguel Lima colocado à discrição meia centena de litros de vinho, 30 quilos de carne de porco, 15 de camarão e um leitão, além de cabrito, caldo verde e as papas de sarrabulho.
"A porta está aberta a toda a gente. Ainda agora me apareceu aqui um casal, que eu não conhecia de lado nenhum, mas que disse que ouviu falar desta tradição e me perguntou se também podiam `tainar`. E eu disse que sim, claro", referiu.
Garantiu que a festa só acabaria "quando o último cliente for embora", estimando que pelo seu café passem, durante o dia, "nunca menos" de 200 pessoas.
"É um pequeno mimo que dou aos meus clientes, agradecendo-lhes por se manterem fiéis à casa e me ajudarem todo o ano. Só espero para o ano ainda estar aqui", rematou, numa alusão aos problemas que poderão surgir com a nova lei do tabaco.
VCP.