Estudo médico aponta para necessidade de diagnóstico precoce e universal à surdez profunda

O antigo responsável pela Entidade Reguladora da Saúde (ERS), Rui Nunes, defendeu, no Porto, a realização de um teste auditivo neonatal universal, de forma a detectar bebés com surdez profunda.

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"Se esse teste for efectuado, tal como hoje se faz com o teste do pezinho, o diagnóstico precoce permitirá uma recuperação muito mais fácil e efectiva" disse Rui Nunes, em declarações à Lusa, à margem da apresentação, na Faculdade de Medicina da Universidade do Porto (FMUP), de um estudo sobre a reabilitação da criança surda.

"O processo não é dispendioso e permitiria ao Estado poupar os tratamentos mais onerosos e menos eficazes inerentes à detecção tardia da surdez profunda infantil e garantir uma melhor inserção social destas crianças", sustentou o responsável.

Efectuado pela FMUP, através do seu Serviço de Bioética (dirigido por Rui Nunes) e com o apoio do Serviço Nacional de Reabilitação, o estudo concluiu que as crianças surdas que frequentam a escola normal estão em desvantagem relativamente às que estudam em escolas especiais.

"Esta conclusão apontam para a necessidade de efectuar uma revisão a nível da política do Ministério da Saúde quanto aos exames neonatais e para a urgência de apostar no ensino especial, que se revela muito mais eficaz para o desenvolvimento das crianças surdas, que nos últimos anos tem estado em declínio", disse Rui Nunes.

O estudo, que abrangeu dois grupos de crianças surdas com idades compreendidas entre os seis e os 12 anos, um integrado no ensino normal e o segundo no ensino bilingue (que aprende a língua gestual a par da língua portuguesa escrita).

Os resultados demonstraram que as crianças que frequentam as escolas normais apresentam piores resultados ao nível da comunicação, integração social e capacidade associativa e cognitiva, quando comparadas com as crianças surdas integradas no ensino bilingue.

Concluiu também que a falta de uma língua impede estas crianças de compreenderem o que as rodeia, de comunicarem eficazmente e de socializar, o que compromete o seu desenvolvimento e as pode deixar frustradas e ansiosas.

Em contrapartida, as crianças que são inseridas em escolas bilingues e que dominam a língua gestual vivem mais calmas e mais seguras, estão mais aptas a explorar o meio e a estabelecer relações com os outros e, por isso, desenvolvem-se mais eficientemente.

Os resultados positivos obtidos pelas crianças com acesso ao ensino bilingue são ainda mais evidentes nas que iniciaram a aprendizagem da língua gestual com três anos de idade ou menos, o que sublinha a necessidade de a aprendizagem desta língua ocorrer o mais prematuramente possível.

O sistema educativo português integra as crianças surdas nas escolas convencionais, apesar destas não responderem às necessidades comunicativas dos alunos surdos.

Rui Nunes propõe que se criem escolas próprias, que integrem surdos e ouvintes, mas que possuam ensino bilingue, que garantem resultados muito melhores para o desenvolvimento de crianças com surdez.

A surdez profunda atinge um em cada mil nascimentos, devido a factores genéticos e a prematuridade, existindo em Portugal 35 mil surdos profundos num universo de 135 mil pessoas afectadas por deficiências auditivas.

"São pessoas com pouca capacidade de reivindicação, pelo que nos cabe a nós intervir junto das autoridades governamentais, chamando a atenção para estas questões", disse Rui Nunes, que apresentará as conclusões deste estudo aos ministérios da Saúde e da Educação.


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