Estudo. Só 33% dos portugueses consideram que saúde é prioridade do Governo

por Mariana Ribeiro Soares - RTP
A maioria (46 por cento) defende que é uma área indiferente para o executivo Benoit Tessier - Reuters

O estudo “Cancro: O que pensam os Portugueses”, apresentado esta quarta-feira pela Apifarma - Associação Portuguesa da Indústria Farmacêutica, conclui que 97 por cento dos portugueses afirmam que, a nível pessoal, a saúde tem uma importância extrema e 75 por cento elegem o cancro como a doença mais preocupante. Por sua vez, apenas 33 por cento dos inquiridos veem a saúde entre as prioridades do Governo.

O objetivo do estudo da Gfk Metris foi perceber a opinião da população portuguesa sobre o cancro, nomeadamente o nível de importância que conferem à doença e o conhecimento que dispõem da mesma, assim como avaliar a perceção que têm da resposta do Governo à área da saúde.

Do total dos 1001 inquiridos, 97 por cento responderam que a saúde tem uma importância extrema. No entanto, quando questionados sobre a importância da saúde para o Governo, apenas três em cada dez portugueses consideram tratar-se de uma prioridade.
A maioria (46 por cento) defende que é uma área indiferente e 20 por cento afirmam que a saúde é pouco prioritária para o Governo.

Quando se trata do acesso aos cuidados de saúde, a avaliação também não é positiva, principalmente nos centros de saúde, quando comparados com os hospitais do Serviço Nacional de Saúde (SNS).

De um modo geral, apenas dois em cada dez portugueses consideram fácil o acesso a cuidados de saúde no SNS. Em centros de saúde públicos, 32 por cento dos inquiridos responderam que o acesso é difícil, mais oito por cento do que em relação a hospitais públicos. A maioria (mais de 40 por cento) respondeu que o acesso ao SNS “não é fácil nem difícil”.
Cancro é a doença que mais preocupa
Quando questionados sobre a doença que mais os preocupa, excluindo a Covid-19, 75 por cento dos inquiridos – o que equivale a 6,208 milhões de portugueses com mais de 18 anos – referem o cancro como a patologia mais alarmante. As doenças cardiovasculares e acidentes vasculares cerebrais (AVC) são também uma preocupação expressa (24 e 17 por cento, respetivamente), mas muito distante do receio declarado face às doenças oncológicas.

Como principais razões para as preocupações, os portugueses apontam a “taxa de mortalidade elevada” (25 por cento), o facto de “terem ou terem tido familiares com doença oncológica” (25 por cento) e também o facto de esta ser uma doença que “qualquer um pode ter” (17 por cento).

O estudo procurou também perceber a opinião dos portugueses sobre até que ponto o cancro é uma prioridade para o Governo. Cada quatro em dez portugueses, ou seja 41 por cento, consideram que as doenças oncológicas têm uma maior atenção do Governo quando comparado com a saúde em geral. Entre os doentes oncológicos, esta perceção é mais positiva, com 56 por cento dos inquiridos a considerar que o cancro é, efetivamente, uma prioridade do Governo. Quando questionados sobre o nível de investimento do Estado na área do cancro, 68 por cento dos portugueses classificam-no de insuficiente. Apenas 11 por cento dos inquiridos classificam a verba destinada ao combate ao cancro como justa.

Em relação aos obstáculos no acesso a cuidados de saúde no SNS para cancro em específico, os doentes oncológicos parecem ter uma opinião mais positiva face à população em geral, principalmente relativamente aos hospitais. Dois em cada dez doentes oncológicos consideram fácil o acesso a cuidados nos centros de saúde, mais cinco por cento do que a opinião da população em geral.

Já em relação aos hospitais do SNS, apenas 15 por cento da generalidade da população considerou fácil o acesso, comparando com 19 por cento dos doentes oncológicos inquiridos. No entanto, prevalece a opinião de que o acesso a cuidados no SNS é difícil: 32 e 27 por cento dos doentes oncológicos consideraram difícil o acesso a cuidados de saúde em centros de saúde e hospitais públicos, respetivamente.

Os tempos de espera no acesso a cuidados de saúde para cancro são, claramente, o principal obstáculo, referenciado por quase metade dos portugueses com mais de 18 anos (44 por cento). Os inquiridos apontaram também a dificuldade em fazer diagnóstico rápido/precoce e a distância/deslocações para tratamentos.
Desigualdade no acesso ao tratamento
Outro dado preocupante diz respeito à equidade no acesso ao tratamento para doentes oncológicos. O estudo revela que mais de metade dos portugueses consideram que a qualidade e a disponibilidade dos cuidados de saúde variam de hospital para hospital. De acordo com 30 por cento dos portugueses, existem “grandes diferenças com elevado impacto” e 29 por cento referem que há “algumas diferenças com algum impacto”.

Apenas dez por cento dos inquiridos consideram que a disponibilidade e qualidade dos serviços de saúde que um doente oncológico recebe é igual em todos os hospitais. Por sua vez, seis em cada dez portugueses consideram, por isso, mais fácil para um doente oncológico aceder a cuidados de saúde no serviço privado do que no SNS.

Questionados sobre a qualidade global do serviço prestado a doentes com cancro em instituições públicas e privadas, o privado também fica à frente, embora por uma margem não muito expressiva na opinião da população em geral: 37 e 40 por cento consideram o serviço do SNS e do serviço privado de “boa qualidade”, respetivamente.

Porém, do ponto de vista de doentes oncológicos, a opinião sobre a qualidade global do tratamento nos dois serviços é contrária à da população em geral: 65 por cento destacam a boa qualidade do SNS, contrastando com os 28 por cento do serviço privado.

A principal crítica apontada ao SNS são os longos tempos de espera. Na comparação entre o serviço público e privado, 48 por cento dos inquiridos destacam, precisamente, que a principal vantagem do privado é a maior rapidez de atendimento, seguindo-se o melhor acompanhamento e qualidade de atendimento.
Investimento na área do cancro é insuficiente
Sobre tratamentos inovadores para o cancro, apenas 12 por cento dos portugueses consideram-nos de fácil acesso. Mais uma vez, a opinião dos doentes oncológicos é substancialmente mais positiva, com 27 por cento a considerarem estes tratamentos acessíveis. No entanto, 42 por cento dos inquiridos consideram mais fácil o acesso a tratamentos inovadores por parte de outros países da União Europeia.

A Apifarma destaca que estes dados estão em linha com o relatório Patients W.A.I.T. Indicator, de 2019, da Federação Europeia de Associações e Indústrias Farmacêuticas (EFPIA), que indica que em Portugal, a taxa de disponibilidade de medicamentos inovadores ronda os 50 por cento e o tempo necessário para aprovação de financiamento destes medicamentos pelo Estado demora, em média, 711 dias, ou seja, quase dois anos. No que diz respeito a medicamentos oncológicos, este período de espera aumenta para 836 dias.

No que concerne aos apoios financeiros, sociais e laborais a doentes oncológicos, o que se destaca é o desconhecimento sobre os mesmos (principalmente financeiros), tanto na população em geral, como dos doentes com cancro em particular. Nesta questão, a grande maioria dos inquiridos respondeu “não sei/não respondo”.

No entanto, a grande maioria dos portugueses (42 por cento) concorda que nos restantes países europeus a qualidade global dos apoios é melhor e 68 por cento defende que o investimento do Estado português na área do cancro é insuficiente.

Apesar de a grande maioria dos inquiridos considerar fácil o processo de obtenção de apoio ou pensão da Segurança Social, quase 90 por cento dos doentes oncológicos diz não ter recebido qualquer apoio.
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