Ex-candidato do PSD à autarquia de Felgueiras faz distinção entre luta política e afirmações em tribunal
O ex-candidato do PSD à Câmara de Felgueiras Manuel Faria distinguiu, em Tribunal, "as declarações da luta política daquilo que se pode afirmar judicialmente", explicando assim o seu desconhecimento sobre boa parte da acusação contra Fátima Felgueiras.
Manuel Faria reconheceu em Tribunal ter sido o PSD a chamar a comunicação social em 1997, quando ocorreu a denúncia anónima sobre o alegado "saco azul" da Câmara Municipal, mas sublinhou que não pode "indicar factos concretos e nomes de pessoas, apenas com base naquilo que se dizia na praça pública".
O depoimento, como testemunha, do antigo "homem-forte" da oposição ao Executivo municipal socialista de Fátima Felgueiras - a qual, entretanto, saiu do PS - afirmou, quase sempre, não ter conhecimento concreto dos factos constantes da acusação, nomeadamente de alegadas irregularidades nos contratos para a construção de aterros sanitários celebrados entre a Câmara de Felgueiras, a Associação de Municípios do Vale do Sousa e a empresa Resin-Resíduos Sólidos, SA.
Manuel Faria sublinhou que, enquanto dirigente do principal partido da oposição, lhe competia divulgar todas as suspeitas sobre a actuação do Município, mas frisou que "não pode garantir em Tribunal que sejam verdadeiras".
A testemunha disse que a Câmara beneficiava o jornal "O Sovela" - propriedade do PS local - dando-lhe toda a publicidade municipal, prejudicando os outros dois jornais, o Semanário de Felgueiras e o Jornal da Lixa, mas não soube precisar se essa "discriminação" foi determinada pessoalmente por Fátima Felgueiras.
O Tribunal ouviu, ainda, Albino Pinto de Sousa, um antigo responsável pelos serviços administrativos da Associação de Municípios do Vale do Sousa, que se limitou a confirmar que em 1993/4 eram poucas as empresas que tinham experiência em matéria de resíduos sólidos, sendo a Resin - Resíduos Sólidos, SA uma das primeiras a operar no mercado.
Revelou ainda, respondendo a uma questão do advogado José Barros - defensor do técnico camarário Barbieri Cardoso - que um dos concursos para a construção de um aterro sanitário foi ganho pelo consórcio de empresas liderado pela empresa Suma e não a Resin.
O julgamento prossegue segunda-feira com a audição de novas testemunhas de acusação.
A acusação - mantida em Tribunal pelo Procurador Pinto Bronze - diz que a presidente da Câmara de Felgueiras, Fátima Felgueiras, terá lesado o Município em 788.750 euros em contratos alegadamente viciados com a empresa Resin e em viagens ao estrangeiro.
Em alguns destes montantes a responsabilidade cabe também ao ex-presidente da Câmara e ex-presidente da Assembleia Municipal, Júlio Faria, também do PS, que geriu o Município até 1995, tendo sido substituído pela autarca.
Aquela verba corresponde a montantes a mais alegadamente pagas pela Câmara à Resin - Resíduos Sólidos SA de Matosinhos ou a empresas por ela subcontratadas para a execução de obras ou prestação de serviços, que depois revertiam para a conta do "saco azul", que alegadamente financiaria actividades partidárias e despesas pessoais de Fátima Felgueiras e de Júlio Faria.
Fátima Felgueiras está acusada de 23 crimes, tendo o processo 15 outros arguidos.
O caso baseia-se no depoimento de 111 testemunhas e em prova documental reunida pelo inquérito da Inspecção Geral da Administração do Território (IGAT) ao Município, pelas análises feitas pela PJ de Braga às viagens particulares de avião feitas por Fátima Felgueiras, de uma factura da firma Norlabor, Sociedade de Prestação de Serviços, e pela análise feita pela IGAT aos processamentos de licenciamento camarários.
O despacho de pronúncia considera que Fátima Felgueiras e Júlio Faria actuaram de forma concertada para conseguir verbas que financiassem as suas actividades políticas, respectivamente nas campanhas eleitorais para o Parlamento - a que Júlio Faria se candidatou - e nas autárquicas de 1997.
Como conheciam os gestores da Resin Vítor Borges e Carlos Marinho, terão acordado com eles um "esquema" que permitisse angariar verbas para o Partido Socialista local.
Fátima Felgueiras terá usado da sua influência para favorecer a empresa em concursos públicos, quer da Câmara quer da Associação de Municípios, sendo uma parte das verbas "devolvidas" em certos casos com recurso a facturas falsas.
Como a firma Resin não possuía alvará de construção civil, terão sido envolvidas no "esquema" outras firmas subsidiárias ou subcontratadas.
Segundo a investigação da PJ/Braga, as verbas eram, na maioria dos casos, entregues a Fátima Felgueiras pelos dois ex-colaboradores a quem estava confiada a gestão do "saco azul" através de um conta no Banco BES e de uma outra paralela.