Forma e limites do Universo em debate na Gulbenkian

Lisboa, 11 Dez (Lusa) - A forma do universo e a dúvida se este é um espaço aberto ou fechado foram hoje objecto de uma intervenção do matemático brasileiro Marcelo Viana, que abriu mais um ciclo de conferências sobre Ciência na Fundação Calouste Gulbenkian (FCG), em Lisboa.

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"Na Fronteira da Ciência" é o nome do conjunto de oito palestras agendadas para a Fundação até Julho de 2008, ao ritmo de uma por mês, dando continuidade a ciclos anteriores promovidos pela instituição.

Na primeira sessão, Marcelo Viana escolheu a Conjectura de Poincaré - considerada um dos mais importantes problemas matemáticos - para dissertar sobre o Universo, na medida em que, segundo a conjectura, "todo o espaço tridimensional fechado `sem buracos` tem uma forma essencialmente esférica".

Como exemplificou o investigador convidado pela Gulbenkian, "se o Universo for fechado, uma pessoa que parta da Terra rumo ao espaço e seguir em linha recta, acabará por voltar ao ponto de partida", enquanto, "se o universo for aberto, a pessoa pode ter iniciado um percurso sem regresso".

Estas dúvidas têm, inclusivamente, dado origem a alguns episódios curiosos no meio científico, contou o matemático, revelando que "o físico alemão Albert Einstein criou equações que, depois de resolvidas, mostravam que o universo tendia a expandir-se".

"Como Einstein recusava essa hipótese, preferiu alterar as suas equações para obter outros resultados, o que viria a classificar como `um grande erro` quando o astrónomo Edwin Hubble descobriu galáxias que estavam a afastar-se, comprovando assim a expansão do Universo", acrescentou.

Para Marcelo Viana, os limites do Universo e a sua forma vão continuar a ser dúvidas da comunidade científica, pois a Física "ainda não está em condições de chegar a conclusões nesta área", cabendo aos matemáticos dar o seu contributo através de fórmulas.

Durante a sua intervenção, Marcelo Viana aproveitou para assinalar "o grande défice de comunicação da ciência face à sociedade e ao público não especializado" e afirmou - perante uma sala cheia e interventiva - que "cabe aos cientistas lutarem contra isso".

A conjectura criada por Henry Poincaré (França, 1854-1912), que foi um dos artífices da Teoria da Relatividade e é considerado o último dos grandes matemáticos universalistas, manteve-se em aberto durante cerca de um século, vindo a ser demonstrada pelo matemático russo Grigori Perelman em 2003.

Considerado um dos sete problemas do milénio pelo Instituto Clay de Matemática, a Conjectura de Poincaré tem sido igualmente um foco motivador de avanços na Geometria e na Topologia.

Marcelo Viana nasceu no Rio de Janeiro mas licenciou-se em Matemática pela Universidade do Porto em 1984, vindo a doutorar-se no Brasil em Sistemas Dinâmicos.

Investigador catedrático e director-adjunto do Instituto Nacional de Matemática Pura e Aplicada do Rio de Janeiro, é também coordenador científico da União Matemática da América Latina (UMALCA) e membro da Comissão Executiva da União Matemática Internacional.

É ainda editor de diversas revistas científicas de circulação internacional e membro titular da Academia Brasileira de Ciências (ABC) e da Academia de Ciências do Mundo em Desenvolvimento (TWAS), bem como membro correspondente da Academia de Ciências de Lisboa.

O ciclo de conferências "Na Fronteira da Ciência" vai abordar questões tão variadas como o aquecimento global ou o papel da nanotecnologia e das células estaminais na medicina regenerativa.

Em Janeiro, Ana Viana-Baptista, investigadora do Instituto Superior Técnico de Lisboa, explicará até que ponto é possível prever o acontecimento de um maremoto, em Fevereiro Tiago Fleming de Oliveira, do Instituto de Medicina Molecular da Universidade de Lisboa, falará sobre o estudo de novas doenças e, em Março, José Xavier, do Centro de Ciências do Mar da Universidade do Algarve, explicará a necessidade de um Ano Polar Internacional, que se assinala em 2007-2008.

O nascimento das células é explicado em Abril por Hélder Maiato, do Instituto Biomolecular e Celular da Universidade do Porto, enquanto o papel das nanotecnologias e das células estaminais na medicina será focado em Maio por Manuela Gomes, do Instituto de Biotecnologia e Bio-Engenharia da Universidade do Minho.

As implicações do aquecimento global estão na origem da conferência que Ricardo Aguiar, do Instituto Nacional de Engenharia, Tecnologia e Inovação, vai apresentar em Junho, cabendo a João Manuel Afonso, do Observatório Astronómico de Lisboa, encerrar o ciclo a 16 de Julho com a comunicação "Na Fronteira do Universo: Em Busca do fim da Idade das Trevas".

O objectivo das palestras é "apresentar às pessoas e a cientistas um conjunto de temas que preocupam outros cientistas, que são de grande actualidade e de grande interesse e para os quais é essencial a resposta da ciência", disse à agência Lusa o director do Serviço de Ciência da Fundação Calouste Gulbenkian.

"Queremos mostrar que há muitas pessoas em Portugal que podem falar de uma forma muito interessante da Ciência que fazem", realçou ainda João Caraça.

Hoje foi também apresentado o livro "Despertar para a Ciência", que resultou das conferências com o mesmo título organizadas pela Fundação, em 2004 e 2005.

HSF/RCS.


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