Ihor Homeniuk. Inspetores do SEF condenados por ofensa à integridade física grave qualificada

por RTP
O juiz pediu para extrair certidão para investigar os comportamentos de todos os vigilantes e inspetores do SEF envolvidos neste caso, incluindo chefias. Mário Cruz - Lusa

O coletivo de juízes decidiu esta segunda-feira que os inspetores do SEF envolvidos no caso de Ihor Homeniuk, o cidadão ucraniano que morreu no aeroporto de Lisboa em março de 2020, serão condenados por ofensa à integridade física grave qualificada agravada pelo resultado morte: nove anos para Duarte Laja e Luís Silva e sete anos para Bruno Sousa.

Segundo o juiz, “ficou provado que os arguidos bateram no cidadão ucraniano” e que “a conduta dos arguidos deu origem as lesões que mataram Ihor”.

Assim sendo, conclui-se que “os arguidos mataram Ihor Homeniuk” mas “não podem ser condenados por homicídio qualificado”.

Serão condenados por ofensa à integridade física grave qualificada, agravada pelo resultado morte, uma vez que praticaram uma ação que os arguidos sabiam que deixaria Ihor em sofrimento e nada fizeram.

Para os arguidos Duarte Laja e Luís Silva a pena será de nove anos, enquanto para Bruno Sousa será de sete anos. O tribunal não deu como provada a acusação de homicídio qualificado, tendo também deixado cair a acusação de posse de arma ilegal (bastão extensível) que pendia sobre os dois primeiros inspetores.

No entanto, na leitura do acórdão, o juiz Rui Coelho não deixou de considerar que "a morte de Ihor Homeniuk foi consequência direta da conduta dos arguidos e que tinham o dever de agir de forma diferente".

A RTP apurou que o juiz pediu para extrair certidão para investigar os comportamentos de todos os vigilantes e inspetores do SEF envolvidos neste caso, incluindo chefias.

"Todos aqueles que acharam por bem controlar Ihor amarrando-o como uma embalagem, todos aqueles com funções de chefia, por tudo isto adiante se extrai certidão do presente acórdão para investigação dos vigilantes do turno da noite, dos vigilantes do turno do dia, dos inspetores que nada fizeram para o assistir, dos inspetores do SEF com coordenação e chefia que deram ordem e que não cuidaram de saber", frisou.

Três dos arguidos vão aguardar trâmites processuais em prisão domiciliária.
As reações dos advogados
À saída do tribunal, o advogado da família de Ihor Homeniuk considerou a decisão de hoje “o final de mais uma etapa”. “Certamente que o julgamento não terminará aqui. [Os arguidos] tiveram uma pena que o juiz considerou que seria bastante pelo grau de culpabilidade que as suas ações tiveram”, afirmou José Gaspar Schwalback.

"Hoje terminou esta primeira fase e vamos agora aguardar, mas, pelo menos, justiça foi feita e as três condenações serviram de exemplo para todos os inspetores e para os membros da polícia que fazem o seu trabalho com dificuldade todos os dias, mas que não podem abusar do poder que têm", afirmou o advogado José Gaspar Schwalbach, acrescentando: "Quando alguém morre, qualquer pena a que sejam condenados nunca será suficiente".

"O que temos hoje é que, efetivamente, os três foram condenados pela morte de um cidadão ucraniano e foi extraída uma certidão para todos os intervenientes que estiveram no aeroporto no dia antes, no próprio dia e no dia seguinte. E esse é um bom passo para mostrar que o nosso país não se deixa prender e não permite que este tipo de situações possa ficar esquecido", observou.

Sobre a permanência dos arguidos em prisão domiciliária, José Gaspar Schwalbach admitiu poder entregar um requerimento a pedir que a medida de coação seja agravada para prisão preventiva, face à condenação proferida pelo tribunal.

Os advogados de defesa dos inspetores do SEF garantem, por sua vez, que irão continuar a pedir uma absolvição dos seus clientes e que vão recorrer da decisão do tribunal.
"Aos poucos vamos apurando a verdade"
“Mas este foi mais um passo na direção certa”, considerou, porém, a advogada do arguido Luís Silva, Maria Manuel Candal. “Aos poucos nós vamos apurando a verdade e vamos chegando lá. Neste momento, dois dos arguidos foram absolvidos da prática de um crime, do crime de detenção de arma proibida”, e “passámos de uma circunstância em que lhes era imputado um crime de homicídio qualificado para serem, neste momento, condenados por ofensas à integridade física graves qualificadas”.
Já o advogado do arguido Bruno Sousa, Ricardo Sá Fernandes, disse não haver dúvida de que “aquilo que aconteceu ao cidadão ucraniano foi o resultado da ação de muitas pessoas que não estavam aqui a ser julgadas”.

“Houve comportamentos anteriores e posteriores àqueles curtos minutos em que os arguidos estiveram com o cidadão ucraniano que devem merecer uma apreciação e, eventualmente, uma censura criminal”, considerou. “Este processo foi organizado esquecendo tudo isso”.

Também o advogado do inspetor Duarte Laja, Ricardo Serrano Vieira, avançou que irá recorrer para o Tribunal da Relação de Lisboa. “Estamos com algumas dificuldades de compreensão na medida em que são extraídas certidões porque se pressupõe uma atuação e, se essa atuação está sob suspeita, vem ao encontro daquilo que a defesa sempre tinha dito, de que podia haver outras causas que concorressem para o desfecho”, declarou aos jornalistas à saída do tribunal.

A morte de Ihor Homeniuk, em março de 2020, à guarda do SEF motivou uma crise política, a que se seguiu uma reestruturação deste serviço, que o ministro da Administração Interna justificou estar há muito prevista no programa do Governo, mas que não agrada aos sindicatos do setor.
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