Incêndios, dia 5. Pedrógão Grande dominado e o espectro da “mão criminosa”

por Christopher Marques - RTP
Em Góis, centenas de bombeiros continuam a combater as chamas. Rafael Marchante - Reuters

O pesadelo parece aproximar-se do fim. A Proteção Civil deu como dominado o fogo de Pedrógão Grande, onde 64 pessoas morreram no último fim de semana. O combate às chamas prossegue no terreno. Mais complicada é a situação em Góis. O quinto dia fica ainda marcado pelas declarações de Jaime Marta Soares. O presidente da Liga dos Bombeiros Portugueses está convicto que o fogo teve como origem “mão criminosa”. A Polícia Judiciária vai investigar.

Ao quinto dia, o incêndio de Pedrógão Grande foi dado como dominado. O anúncio foi feito a meio da tarde pelo comandante operacional Vítor Vaz Pinto que fez questão de explicar o significado desta primeira vitória.

O incêndio continua ativo mas os bombeiros asseguraram que não aumentaria o seu perímetro, ficando limitado à área estabelecida.

O comandante deixou claro que as autoridades ainda enfrentariam situações “bastante complicadas” mas que tinham “a certeza que o incêndio não vai progredir mais do que isso”. No terreno continuam ao início da noite mais de mil bombeiros.

Ao início da noite permanece por dominar o incêndio de Góis, que tem motivado as situações mais complicadas ao longo das últimas 24 horas.

O fogo alastrou aos concelhos de Arganil e Pampilhosa da Serra, tendo sido mobilizados os meios aéreos para estas duas frentes. A Proteção Civil explicou a meio da tarde que 35 pessoas foram assistidas, entre bombeiros e desalojados e que dois feridos ligeiros foram transportados para o hospital.

Ao início da noite, o fogo continua com duas frentes ativas, apesar de o combate estar a evoluir favoravelmente. O fogo tinha motivado na terça-feira a evacuação de 27 aldeias do concelho de Góis. Os habitantes de pelo menos cinco destas povoações já regressaram às suas casas.
"Mão criminosa"

À medida que os dias passam surgem novas respostas, explicações mas também mais dúvidas. Apesar de a Polícia Judiciária ter afirmado que o incêndio de Pedrógão Grande teve início numa trovoada seca, Jaime Marta Soares tem dúvidas.

Ainda durante a manhã, o presidente da Liga dos Bombeiros Portugueses afirmou à TSF estar convicto que o incêndio foi provocado por “mão criminosa”. À tarde, o presidente da Liga dos Bombeiros disse depois manter a convicção de que o incêndio de Pedrógão Grande teve origem criminosa, garantindo que essa suspeita advém de um conjunto de conhecimentos que chegaram à sua posse.

A Polícia Judiciária vai investigar e quer ouvir Jaime Marta Soares. O presidente da Liga dos Bombeiros Portugueses saudou a investigação e não avançou mais informações à comunicação social. Reserva-se para os inspetores da Polícia Judiciária.IPMA e GNR respondem a Costa

O primeiro-ministro recebeu já as respostas a dois dos esclarecimentos exigidos. Sobre a estrada da morte, a GNR sustenta que o incêndio deflagrou de forma "inesperada e assustadoramente repentina, surpreendendo todos".

Sobre o desvio de trânsito do IC8, a GNR confirma o fecho da estrada, sendo que o desvio permitia aos automobilistas três alternativas: "retroceder pelo mesmo IC em direção a oeste; tomar a EN 236-1 em direção a Figueiró dos Vinhos; ou a EN 236-1 em direção a Castanheira de Pera".

A Guarda Nacional Republicana sublinha que não havia "qualquer indicador ou informação que apontasse para a existência de risco potencial ou efetivo em seguir" pela EN236-1 e faz ainda referências às "dificuldades operacionais" para cortar aquela que viria a ser a "estrada da morte".

"O acesso à EN236-1 faz-se a partir de múltiplos locais, muitos deles provenientes de pequenas localidades e propriedades existentes e não apenas a partir do IC8", explica a GNR.

Já o Instituto Português do Mar e da Atmosfera explica que houve condições excecionais para a propagação das chamas. O IPMA advoga que "foram o resultado da conjugação da dinâmica do próprio incêndio e dos efeitos da instabilidade atmosférica, gerando downburst, ou seja, vento de grande intensidade que se move verticalmente em direção ao solo, que após atingir o solo sopra de forma radial em todas as direções".

"Este fenómeno é por vezes confundido com um tornado, e tem um grande impacto em caso de incêndio florestal por espalhar fragmentos em direções muito diversas", salienta o presidente do IPMA na resposta a António Costa.

O instituto sustenta ainda que as previsões meteorológicas para a tarde de sábado estiveram dentro da margem de erros e garante que os avisos feitos às populações seguiram as regras fixadas na relação com os serviços de proteção civil.
De momento faltam ainda as respostas da Proteção Civil quanto à interrupção do funcionamento da rede SIRESP. A rede de emergência e segurança falhou nas primeiras horas do incêndio.

Quatro torres que asseguram as comunicações do SIRESP arderam e só uma unidade móvel estava disponível para avançar para o local. Demorou nove horas a estar operacional.

Segundo o Expresso, o Ministério da Administração Interna mandou avançar as duas unidades móveis pesadas às 23h00. Mas só a da PSP estava operacional. A da GNR está avariada desde a vinda do Papa há um mês e uma semana a Fátima. Só às 8h00 de domingo é que a rede estava operacional.

O problema detetado no incêndio de Pedrogão é o de sempre. A saturação da rede que põe em causa a sua eficácia: ou seja o contacto entre todas as polícias, INEM, bombeiros e Proteção Civil no terreno. Um problema que já tinha sido diagnosticado em agosto de 2016 no grande incêndio do Sardoal.

Fica ainda por esclarecer porque é que só no domingo a Proteção Civil aumentou o nível de alerta no combate aos incêndios. No dia 17, todo o país, incluindo o distrito de Leiria onde teve início o grande incêndio, estava sob aviso amarelo. Só no domingo, dia 18 de junho às 18h00, é que o alerta subiu para laranja.

Contactada pela RTP, a Autoridade Nacional de Proteção Civil não quis esclarecer o porquê de o nível de alerta só ter sido aumentado depois do fogo ter feito dezenas de vítimas.

Para já, a tragédia de Pedrógão Grande parece apressar o trabalho do Parlamento. Os partidos puseram-se de acordo para aprovar, até julho, a reforma da floresta, que está na Assembleia da República desde abril.
Silêncio e homenagem

Para além do combate às chamas, o dia foi de homenagem. Às 13h00 cumpriu-se um minuto de silêncio em memória das vítimas. O Presidente da República, os ministros da Administração Interna e das Infraestruturas prestaram a homenagem junto à Câmara Municipal de Pedrógão.

Em Lisboa, o primeiro-ministro, o presidente da Assembleia da República e os deputados cumpriram um minuto de silêncio junto ao Parlamento. À tarde, o Parlamento reuniu-se em sessão plenária para “prestar solidariedade às famílias das vítimas” e manifestar apoios a quem combate os incêndios.

Os partidos aprovaram um voto de pesar pela tragédia onde expressam ainda gratidão pelo trabalho dos bombeiros e pela solidariedade dos partidos. As forças partidárias garantem também que vão exigir apurar todas as respostas sobre estes incêndios.

Os líderes partidários marcaram depois presença em Castanheira de Pera para a última homenagem ao bombeiro que morreu no combate às chamas. Também Marcelo Rebelo de Sousa esteve no funeral de Gonçalo Correia.

Os funerais e as homenagens vão continuar ao longo dos próximos dias. A ministra da Justiça revelou esta quarta-feira que estão concluídas as autópsias, apesar de nem todos os corpos terem sido identificados.
pub