Jovens imigrantes em áreas urbanas multiculturais na Alemanha criam própria maneira de falar alemão
** Simon Kamm, da Agência Lusa **
Lisboa, 21 Fev (Lusa) - Nas áreas urbanas multiculturais da Alemanha jovens imigrantes de várias origens desenvolveram os `etnolets`, novas maneiras de falar que misturam o alemão com outras línguas e cujas variantes têm o seu próprio ritmo e `gramática`.
Os `etnolets` são cada vez mais falados por crianças e jovens imigrantes de várias origens étnicas e já por alemães da mesma faixa etária, essencialmente em grandes áreas urbanas daquele país, como em Berlim ou Mannheim, onde existe uma grande diversidade cultural.
"Estas novas formas de falar baseiam-se no alemão corrente mas são fortemente influenciadas por uma língua de mistura, sobretudo o turco", a maior comunidade imigrante na Alemanha, explicou hoje à Agência Lusa Inken Keim, sociolinguista da Universidade alemã de Mannheim.
"Apareceram em zonas específicas e a maneira como são faladas depende das respectivas áreas e da origem étnica dos seus falantes", precisou a especialista.
Uma realidade semelhante, mas que especialistas contactados em Portugal minimizam, é um crioulo falado por jovens de origem africana em algumas zonas urbanas.
É uma maneira própria de falar, fortemente influenciada pela "cultura de rua" e que mescla elementos do português, inglês e palavras próprias que surgiram no contexto específico onde estes jovens moram.
Sobre os "etnolets" falados na Alemanha, a especialista explicou que apesar de não poderem ser consideradas "línguas mistas concretas", mas sim "dialectos ou `slangs`", os seus falantes dominam e respeitam, em grande parte, as regras do alemão padrão e do idioma de mistura.
"É uma linguagem dissociada. Os jovens mudam de um registo para o outro com grande facilidade e sabem tanto falar de uma maneira como da outra. É uma coisa muito própria e que acontece naturalmente", sublinhou Inken Keim.
De acordo com a especialista do Instituto de Língua Alemã, os `etnolets` caracterizam-se por "uma simplificação das frases, omissão de preposições e artigos, utilização errada do género e por uma certa `economia gramatical`.
"Isto leva a novas construções. Em vez de dizer `Ich gehe in die Schule` (Eu vou à escola, em alemão), os falantes do `etnolet` diriam `Isch geh Schule` (Eu vou escola)", elucidou Inken Keim.
"Muito típico é também um sotaque `estrangeirado` bastante perceptível e acentuado onde muitas letras são entoadas de maneira diferente e a utilização de palavras estrangeiras, sobretudo árabes ou turcas", acrescentou.
De acordo com Inken Keim, a utilização dos `etnolets` têm muito a ver "com o sentimento de pertença", e os jovens utilizam-nos "instintivamente" para "destacar que são uma mistura de ambas as culturas".
A especialista não acredita, no entanto, que estas novas maneiras de falar se enraizem na Alemanha ao ponto de ameaçar a língua alemã.
Inken Keim lembrou que o desenvolvimento de uma nova língua depende do prestígio que lhe é concedida e pelo ganho retórico que traz consigo, sublinhando que só ao ser "aceite e avaliada positivamente" por uma maioria é que estas novas formas de falar "se poderiam estabelecer".
"Dificilmente isto acontecerá com os `etnolets`, porque têm conotações negativas. Os seus falantes são ridicularizados pela cultura popular alemã e estes são vistos como um sinal típico de marginalização", expliocou à Lusa.
"Quem fala dessa maneira é logo estigmatizado e encarado como uma pessoa mal-educada e com baixa formação", acrescentou.
Porém, para a sociolinguista representam "um ganho" que permite que os jovens "alarguem o seu repertório linguístico e se consigam expressar de maneira diferente".
Inken Keim disse ainda que fenómenos semelhantes têm vindo a ser observados na Holanda, Áustria, França e Dinamarca e que esses "etnolets europeus" aparentam ter "semelhanças e elementos em comum, apesar de se desenvolverem em línguas diferentes".
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