Loendros dão espectáculo de cor no "santuário" de Cambarinho
Outrora indesejados pelos danos que provocavam no gado e actualmente admirados pela sua coloração arroxeada, os loendros têm o seu "santuário" em Cambarinho, no concelho de Vouzela, onde se situa a maior mancha da Europa daquela planta.
Todos os anos, entre meados de Abril e princípios de Junho, a Reserva Botânica de Cambarinho, nas encostas da Serra do Caramulo, é palco de um exuberante espectáculo de cor, com os loendros floridos a serpentearem ao longo dos seus 24 hectares, aproveitando a humidade das linhas de água.
"Loendro é o nome popular que nesta região se adoptou. O nome científico é Rhododendron Ponticum, subespécie Baeticum", explica Carlos Carvalho, funcionário do Instituto de Conservação da Natureza (ICN), àqueles que lhe pedem uma visita guiada pela reserva.
Trata-se de uma das raras espécies sobreviventes da flora do período geológico do Terciário (há mais de dois milhões de anos), desaparecida com as glaciações e que, por isso, foi protegida pelo decreto-lei nº 364/71, de 25 de Agosto, que criou a Reserva Botânica de Cambarinho.
Em Portugal, os loendros foram encontrados em 1799, na Serra da Fóia (Monchique). Anos depois, em 1884, o investigador Júlio Henriques, da Universidade de Coimbra, descobriu-os nas margens do Rio Alfusqueiro, durante uma expedição botânica à Serra do Caramulo.
Segundo o técnico, actualmente é em Cambarinho que se situa a maior concentração de loendros da subespécie Baeticum, havendo outras mais pequenas em Monchique (Algarve), Odemira (Alentejo) e Sierras del Algibe (Cadiz, Sul de Espanha).
No Sul de Portugal, o Rhododendron Ponticum foi, no entanto, "baptizado" pelo povo com outro nome: em vez de loendro ou loendreira, é conhecido por adelfa ou adelfeira.
"Também existem na zona do Mar Negro, Cáucaso e Ásia Menor, mas esses são um pouco diferentes, são da subespécie Ponticum, enquanto estes aqui são da subespécie Baeticum", explicou Carlos Carvalho a um grupo de curiosos estudantes da Escola Secundária de Vouzela que visitava a reserva no âmbito da disciplina de Ciências da Natureza.
"Porque não levam os loendros para outros países?", apressa-se a perguntar uma aluna, surpreendida por uma planta tão rara conseguir viver precisamente na sua terra.
O técnico explicou que se trata de uma espécie espontânea, que encontrou na Serra do Caramulo e nos afluentes do Rio Alfusqueiro características climáticas e um solo propícios ao seu desenvolvimento.
"Já tentámos fazer transplante para experiência, mas acabou por morrer. É uma espécie muito melindrosa", frisou.
Em jardins públicos e privados é frequente ver loendros, das mais variadas cores, desde o branco ao vermelho.
Esses são, no entanto, "primos muito afastados desta subespécie, fruto de vários cruzamentos", esclarece Carlos Carvalho.
O espectáculo dado pela sua cor arroxeada atrai anualmente milhares de visitantes. No ano passado cerca de dois mil pediram visitas guiadas, mas os muitos mais que passearam livremente pela Reserva Botânica fogem às contas do ICN.
Também a população local está, na opinião de Carlos Carvalho, sensibilizada para a importância do núcleo de loendros, ainda que noutros tempos estes fossem uma planta mal vista, por ser venenosa.
"As pessoas passavam com os seus animais junto aos loendros, estes ingeriam as suas folhas e muitos deles acabavam por morrer", contou à Lusa.
Ainda que a tarefa de mudar mentalidades seja demorada, o técnico do ICN considera que os moradores de Cambarinho estão dispostos a defender aquilo que mais visibilidade dá à sua terra, chegando mesmo a avisar os visitantes de que não podem cortar os loendros.
Ciente da importância da Reserva Botânica de Cambarinho para o concelho, a autarquia apresentou há um ano o projecto de um centro de interpretação que, além do estudo do loendro e das outras espécies da fauna e da flora suas companheiras, seria construído de forma ecológica.
"A autarquia fez a sua parte, que era o projecto. Cabe agora ao ICN aprová-lo e apresentá-lo para financiamento aos fundos comunitários", disse à Lusa o presidente da Câmara, Telmo Antunes.
Segundo Telmo Antunes, "a reserva tem um período de procura muito baixo, é visitada sobretudo durante a floração dos loendros", sendo que o centro de interpretação "poderia ser um factor de atracção" para o resto do ano.
Fonte do ICN avançou à Lusa que o projecto do centro de interpretação está por agora adiado, uma vez que "já não é possível enquadrá-lo no actual Quadro Comunitário de Apoio".
Certo é que, sem burocracias ou prazos estabelecidos, no próximo ano a natureza se encarregará de, mais uma vez, chamar os visitantes.