Médico recusa baixa e é agredido por utente a soco e pontapé

por RTP
Reuters

Um médico do Centro de Saúde de Moscavide revelou nas redes sociais que foi agredido a soco e pontapé por um utente ao ter detetado incoerências no processo e recusar renovar uma baixa. Este é o segundo caso de violência contra um médico em menos de uma semana e leva a Ordem dos Médicos e o sindicato a exigir ao Ministério da Saúde que crie condições de segurança para os profissionais.

As palavras são do médico de 66 anos no Facebook e relatam o que se passou no dia 31 de dezembro, à tarde, quando atendia um utente de 20 anos. "Pretendia que lhe desse uma vacina para a gripe (porque um primo tinha feito a vacina), e lhe passasse uma renovação da baixa, retroativa a 26/12/2019", contou.

O médico consultou o processo e diz que o jovem esteve dias antes noutra unidade de saúde sem ter aviado os medicamentos, tal como nunca terá aviado “nenhuma receita das que lhe foram passadas em todo o ano de 2018 e 2019”.

"Como não acedi ao que desejava, começou por pegar no teclado do computador e atirá-lo contra a secretária, partindo-o", o que aconteceu também com o telefone, relata o Jornal de Notícias, que hoje noticia o caso.

"Com a ajuda da namorada, que me segurava, agrediu-me com vários socos e pontapés, um dos socos no olho direito e um pontapé na grelha costal", contou o médico. Argumenta ter tido "muita dificuldade em conseguir sair para pedir auxílio" ao longo de "10 minutos".

A Administração Regional de Saúde de Lisboa e Vale do Tejo já veio confirmar oficialmente a ocorrência da agressão.

O secretário-geral do Sindicato Independente dos Médicos, Roque da Cunha, diz que o médico agredido está afetado psicologicamente e que já avançou com uma queixa na PSP.


Este é o segundo caso de violência contra um médico em menos de uma semana, quando uma médica da urgência do Hospital de S. Bernardo, em Setúbal, foi agredida por um utente.
Ordem culpa Ministério da Saúde e Ministério Público
“Infelizmente, há um número crescente de casos” de violência, admite Dalila Veiga, da seção regional da Ordem dos Médicos e responsável pelo gabinete nacional de apoio aos médicos vítimas da violência, criado pela Ordem. Casos que, muitas vezes, estão relacionados com o facto de os médicos não concordarem com a emissão do certificado de incapacidade temporária para o trabalho, o que resulta em situações de coação e mesmo de agressão.

Dalila Veiga não tem dúvidas de que a culpa recai sobre o Ministério da Saúde, mas também sobre o Ministério Publico. O Ministério da Saúde, por um lado, tem a obrigação de criar condições para proteger os seus funcionários e o Ministério Público, por outro, tem de criar mecanismos rápidos para punir este que é um crime público, não permitindo um “sentimento de impunidade geral”. “Não é admissível que se perpetue esta situação num Estado de Direito”.

Questionada na RTP sobre se há falta de segurança nas unidades de saúde, Dalila Veiga responde com rapidez com um “com certeza que sim”, para em seguida defender que sejam repensados os mecanismos de segurança, lembrando que, neste caso, o médico demorou algum tempo até conseguir sair do gabinete para pedir ajuda.

Perante um sentimento de impunidade, os médicos tendem a não apresentar queixa com medo de represálias, acrescenta Dalila Veiga. Idêntica análise tem o secretário-geral do Sindicato Independente dos Médicos.

"Tanto quanto é do nosso conhecimento nenhum dos agressores teve qualquer medida de coação, nem sequer foi presente a um juiz. Por isso, é preciso dizer basta e perguntar ao ministério o que pensa fazer em relação a esta matéria", disse.

Para Roque da Cunha, tem de se agilizar a queixa, que tem de ser consequente com a forma como as queixas tem resposta.

"Porque incomoda as idas à polícia, as declarações, a recolha de testemunhas. Para um crime público parece-me excessivo e fundamental que os poderes públicos ajam, não só o Ministério Público, mas também a Procuradoria-Geral da República", realçou.

O secretário-geral do SIM referiu que o sindicato tem conhecimento de que há dezenas de agressões verbais e às vezes físicas e, devido a burocracias, para evitar incómodos, e pela lentidão da justiça não vêm ao conhecimento público.

Em declarações esta quinta-feira à agência Lusa, o secretário-geral sublinhou que algo tem de ser feito para diminuir as agressões aos profissionais de saúde.

"A nossa pergunta é muito simples: O que é que a Senhora ministra da Saúde está a pensar fazer em relação a esta matéria? Não adiantam declarações vagas como a que teve a semana passada de solidariedade no geral (aquando da agressão a uma médica no Hospital de Setúbal na semana passada)", disse.

No entendimento de Roque da Cunha, é preciso saber especificamente o que vai fazer Marta Temido para diminuir este tipo de situação por um lado e, por outro, criar condições para dar mais segurança aos profissionais.

"Na segunda-feira passada entregámos à Senhora Procuradora-Geral da República um pedido para intervenção, dado tratar-se de um crime público e também para que a procuradoria possa ter alguma intervenção nesta matéria", reforça.

Em comunicado, a Administração Regional de Saúde de Lisboa e Vale do Tejo veio repudiar os atos de violência, garantindo “que a ARSLVT tem prestado e vai continuar a prestar todo o apoio e solidariedade necessários aos seus profissionais vítimas de agressão, pugnando sempre para que a violência nas unidades de saúde não aconteça”.

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