Morreu Desmond Tutu. Figura histórica da luta contra o Apartheid

por RTP

Desmond Tutu, arcebispo emérito sul-africano e vencedor do Prémio Nobel da Paz de 1984 pelo seu ativismo contra o regime de segregação racista do Apartheid, morreu hoje aos 90 anos, anunciou o Presidente da África do Sul, Cyril Ramaphosa.

Desmond Tutu, que ganhou destaque como ativista dos direitos humanos, foi diagnosticado com cancro de próstata no final da década de 1990 e foi hospitalizado várias vezes nos últimos anos para tratar infecções associadas ao tratamento.

O presidente sul africano fala de um líder ímpar e de um novo capítulo de luto com a perda de mais um dos notáveis que teve uma contribuição decisiva para a libertação do país.

"A morte do arcebispo emérito Desmond Tutu é um novo capítulo de luto na despedida da nossa nação a uma geração de sul-africanos excecionais que nos legaram uma África do sul liberta", acrescentou o presidente.



Ramaphosa considerou Tutu "um homem de uma inteligência extraordinária, íntegro e invencível contra as forças do apartheid", mas que foi "também terno e vulnerável na sua compaixão por aqueles que sofreram a opressão, a injustiça e a violência" quer sob o apartheid quer sob opressores no mundo inteiro.

O arcebispo anglicano estava debilitado há vários meses, durante os quais não falou em público, mas ainda cumprimentava os jornalistas que acompanhavam cada uma das suas saídas recentes, como quando foi tomar a sua vacina contra a covid-19 num hospital ou quando celebrou os seus 90 anos em outubro.

Desmond Tutu ganhou notoriedade durante as piores horas do regime racista na África do Sul, quando organizava marchas pacíficas contra a segregação, enquanto sacerdote, pedindo sanções internacionais contra o regime branco em Pretória.

Com o advento da democracia, 10 anos depois, o homem que deu à África do Sul o nome de “nação arco-íris” presidiu à Comissão de Verdade e Reconciliação criada com o objetivo de virar a página sobre o ódio racial, mas as suas esperanças foram rapidamente frustradas. A maioria negra adquiriu o direito de voto, mas continua em grande parte pobre.

Depois do combate ao Apartheid, Tutu empenhou-se na reconciliação do seu país e na defesa dos direitos humanos.

Contra a hierarquia da igreja anglicana, defendeu os homossexuais e o direito ao aborto, tendo nos últimos anos aberto como nova frente de combate o direito ao suicídio assistido.

Tutu criticou também os excessos do Governo do seu partido, o Congresso Nacional Africano (ANC), nomeadamente os erros do ex-presidente Thabo Mbeki na luta contra a sida, e nem o seu amigo Nelson Mandela escapou às suas críticas.

Em 2013 prometeu não votar mais no partido que triunfou sobre o Apartheid novamente.

Desmond Tutu, nascido numa pequena cidade mineira a sudoeste de Joanesburgo, sofreu de poliomielite em criança, quis ser médico, mas desistiu por falta de meios e acabou por ser professor, tendo-se demitido para protestar contra a educação inferior reservada aos negros.

Acabou por entrar no seminário e foi ordenado sacerdote aos 30 anos.

Estudou e ensinou no Reino Unido e no Lesoto, estabelecendo-se em Joanesburgo em 1975, antes de ser nomeado arcebispo da Cidade do Cabo e chefe da comunidade anglicana no seu país.

Casou em 1955 com Leah, com quem teve quatro filhos.

Apesar do cancro da próstata diagnosticado em 1997 e de vários internamentos em hospitais, só muito gradualmente se retirou da vida pública, defendendo até ao fim o sonho de uma África do Sul multirracial e igualitária.

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