Morreu José Saramago

O escritor português e prémio Nobel da literatura, José Saramago, morreu hoje aos 87 anos.

RTP com Agência Lusa /
Saramago recebeu o Prémio Nobel da Literatura em 1998 Martinez de Cripan, EPA

José Saramago morreu hoje em sua casa, na ilha espanhola de Lanzarote, confirmou ao início desta tarde à RTP o seu editor, Zeferino Coelho.

José de Sousa Saramago, falecido hoje  aos 87 anos, nasceu na aldeia de Azinhaga, concelho da Golegã, a 16 de novembro  de 1922, embora esteja registado como tendo nascido a 18, mas antes de fazer  três anos mudou-se para Lisboa com os pais. 
 
Foi ao inscrever-se na escola primária, na capital, que se descobriu  que o funcionário do registo tinha acrescentado na sua certidão de nascimento  a alcunha da família, Saramago, como sendo apelido, o que tornou o escritor  no primeiro Saramago da família Meirinho Sousa. 
 
Após fazer os estudos secundários em Lisboa, que por dificuldades  financeiras não prosseguiu, José Saramago começou a trabalhar como serralheiro  mecânico e exerceu ainda as profissões de desenhador, funcionário da saúde  e da previdência social, editor e tradutor, tendo colaborado também como  crítico literário na revista Seara Nova e como comentador político no Diário  de Lisboa (1972-73) e sido director adjunto do Diário de Notícias (1975).
 
Membro da primeira direção da Associação Portuguesa de Escritores  e presidente da assembleia geral da Sociedade Portuguesa de Autores entre  1985-1994, José Saramago, viveu, a partir de 1976, exclusivamente do seu  trabalho literário, primeiro enquanto tradutor e depois enquanto autor.
 
O seu primeiro livro, o romance "Terra do Pecado", saiu em 1947,  tendo José Saramago estado depois sem publicar até 1966, quando regressou  com "Os Poemas Possíveis", a que se seguiram, já na década de 70, "Provavelmente  Alegria" (1970), "Deste Mundo e do Outro" (1971), "A Bagagem do Viajante"  (1973), "O Ano de 1993" (1975), "Manual de Pintura e Caligrafia" (1977),  "Objecto Quase" (1978) e "A Noite" (teatro, 1979), entre outros. 
 
Já nos anos 80 chegaram às livrarias "Levantado do Chão" (1980),  "Que farei com este Livro?" (teatro, 1980), "Viagem a Portugal" (1981),  "Memorial do Convento" (1982), "O Ano da Morte de Ricardo Reis" (1984),  "A Jangada de Pedra" (1986), "A Segunda Vida de Francisco de Assis" (1987)  e "História do Cerco de Lisboa" (1989). 
 
"O Evangelho Segundo Jesus Cristo", o romance mais polémico  do autor, saiu em 1991 e dois anos depois surgia a peça de teatro "In Nomine  Dei", após o que tinha início a publicação dos "Cadernos de Lanzarote" (1994,  diário I, e 1995, diário II), reflexo da mudança de Saramago para aquela  ilha do arquipélago das Canárias. 
 
O aplaudido "Ensaio sobre a Cegueira" foi dado à estampa em  1995, a ele se seguindo mais dois volumes dos "Cadernos de Lanzarote", em  1996 e 1997, e o novo romance "Todos os Nomes", editado também em 1997,  um ano antes do quinto volume dos "Cadernos de Lanzarote". 
 
Após a atribuição do Prémio Nobel da Literatura em 1998, a Fundação  Círculo de Leitores instituiu um galardão literário bienal com o nome de  José Saramago e a expetativa em torno de um novo trabalho do autor aumentou,  até que, no ano 2000, chegou às livrarias "A Caverna", a que se seguiu "O  Homem Duplicado" (2002). 
 
O "Ensaio Sobre a Lucidez", publicado em 2004, foi apresentado  pelo próprio escritor em entrevista à Lusa como "uma fábula, uma sátira  e uma tragédia" e causou controvérsia por preconizar o recurso ao voto em  branco como sinal de desagrado dos eleitores perante o Governo.  
 
Aquando do lançamento deste título, José Saramago criticou duramente  a democracia portuguesa por, na sua opinião, os governos serem "comissários  políticos do poder económico" e mostrou-se contra o monopólio dos média.
 
No ano seguinte, o escritor publicou a peça de teatro "Don Giovanni  ou O Dissoluto Absolvido", escrita como fundamento dramático para o libreto  de uma ópera de Azio Corghi, compositor italiano que no final da década  de 1980 criara a ópera "Blimunda", inspirada na personagem homónima do romance  "O Memorial do Convento", voltando a recorrer aos textos do Nobel da Literatura  para outras óperas e para cantatas ao longo dos anos 1990. 
 
Em 2005, o escritor - que dizia não ser pessimista, "o mundo  é que é péssimo" - lançou também um novo romance, "As Intermitências da  Morte", que apresentou como "uma reflexão filosófica sobre a vida" e onde  coloca questões como: "Quais as implicações de uma vida mais longa? Quanto  tempo passaria a durar a velhice? Em que se tornaria o corpo humano?", "Como  se pagariam então as reformas, problema que já agora se coloca?". 
 
A vasta obra do escritor português encontra-se editada em mais  de trinta países, entre os quais Dinamarca, Suécia, Finlândia, Hungria,  Rússia, Turquia, Albânia, Eslovénia, Sérvia, Roménia, Macedónia, Síria,  Israel, Tailândia, Emirados Árabes Unidos, México, Colômbia, Argentina e  EUA. 
 
As ficções de José Saramago valeram-lhe o Prémio da Associação  de Críticos Portugueses (para "A Noite", em 1979), Prémio Cidade de Lisboa  (por "Levantado do Chão", de 1980), Prémio Literário Município de Lisboa  ("Memorial do Convento", 1982) e o PEN Clube para "Memorial do Convento"  (1982) e "O Ano da Morte de Ricardo Reis" (1984). 
 
Este último livro valeu-lhe ainda o Prémio da Crítica da Associação  Portuguesa de Críticos (1985), o Prémio Dom Diniz (1986), o galardão italiano  Grinzane-Cavour (1987) e o Prémio de Ficção Estrangeira do jornal The Independent  (1993). 
 
"O Evangelho Segundo Jesus Cristo" recebeu o Grande Prémio de  Romance e Novela da Associação Portuguesa de Escritores em 1992, no mesmo  ano em que "Levantado do Chão" foi galardoado em Itália com o Prémio Internacional  Ennio Flaiano, enquanto "In Nomine Dei" venceu, em 1993, o Grande Prémio  de Teatro da Associação Portuguesa de Escritores. 
 
Pelo conjunto da sua obra, Saramago foi ainda distinguido com  o Prémio Internacional Literário Mondello e o Prémio Literário Brancatti  (ambos em 1992), Prémio Vida Literária da Associação Portuguesa de Escritores  (1993), Prémio Consagração de Carreira da Sociedade Portuguesa de Autores  e Prémio Camões (os dois em 1995) e Prémio Nacional de Narrativa Città di  Penne, Prémio Europeu de Comunicação Jordi Xifra Heras e Prémio Nobel da  Literatura (os três em 1998). 
 
José Saramago acumulou ainda doutoramentos Honoris Causa pelas  universidades de Évora (Portugal), Turim (Itália), Sevilha e Castilla-La-Macha  (Espanha), Brasília (Brasil) e Manchester (Inglaterra), foi membro Honoris  Causa do Conselho do Instituto de Filosofia do Direito e de Estudos Histórico-Políticos  da Universidade de Pisa (Itália), membro da Academia Universal das Culturas  (Paris) e do Parlamento Internacional de Escritores (Estrasburgo) e membro  correspondente da Academia Argentina das Letras, além de Comendador da Ordem  Militar de Sant'Iago de Espada e Cavaleiro da Ordem das Artes e das Letras  Francesas. 
 
Criador de um universo muito próprio, por vezes alojado entre  o real e o fantástico, Saramago acreditava, à semelhança de Laurence Sterne,  que talvez intercetasse pensamentos que os céus destinavam a outros homens.
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